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quarta-feira, 15 de maio de 2013

FOME NÃO É NOTÍCIA PRA JORNAL

A fome não alisa, dizia a minha sábia avó Alcina.
Na última segunda 13 discutiu-se à exaustão um tema premente e atual no teatro da Pontifícia Universidade Católica, PUC-SP: a fome e as desigualdades sociais no mundo.
Os debates foram iniciados com o sociólogo suíço Jean Ziegler dizendo que a fome está massacrando milhões e milhões de humanos a cada ano, sem que os governantes das grandes potências, como os Estados Unidos, movam uma palha sequer.
Nos próprios EUA, pesquisa de 2007 indicava que uma em cada grupo de seis crianças passava fome e vivia a terrível insegurança da falta de alimento na mesa, o que significava dizer que no país de Obama havia pelo menos 12 milhões de crianças à beira da fome e outras 3,5 milhões sem ter o que comer.
De lá para cá, a situação pouco mudou.
Dados de setembro de 2010 a agosto de 2011 divulgados em dezembro último davam conta de que 49,1 milhões de norte-americanos viviam na pobreza e que continuava crescente o número de sem-teto, sem falar que por lá continuava assustador o índice de desemprego disparado com a quebradeira de 2006.
Agora estudiosos do Departamento Florestal da ONU - Organização das Nações Unidas - vem a público recomendar que troquemos as proteínas e minerais das carnes bovina, caprina, suína, e também das aves e peixes do mar e dos rios pelos sabores exóticos de quase 2.000 espécies de insetos que se acham à disposição de qualquer um por aí.
...E pensar que o britânico Vincent Holt publicou em 1885 um livro a que deu o título Por que Não Comer Insetos?
Pois bem, por eso y otras cositas mas é bom que nos acostumemos logo com a ideia de Holt.
Ziegler falou da banalização da fome – um escândalo mundial - e da violência crescente em todos os quadrantes, do Brasil à Síria.
Depois foi a vez de o ensaísta e tradutor José Paulo Netto (acima, no destaque) expressar seus pontos de vista sobre o abismo que vive o mundo todo hoje. Ele citou o guerrilheiro argentino Chê Guevara, os pensadores alemães Marx e Engels e o poeta chileno Pablo Neruda.
Paulo Netto disse em fala inflamada, de mais de hora, que a fome aumenta na China e aqui, que somos o país mais poderoso e democrático da América Latina e do mundo e que o que se tem praticado contra o povo é uma coisa chamada "crime famélico". Após elogiar Jean Ziegler dizendo ser ele “o homem-chave no combate à fome”, Netto, cético, indagou: “Onde está a esperança?”. E concluiu com uma frase de Chê: “Os poderosos podem matar uma, duas, três flores, mas jamais deterão a primavera”.   
Foi muito aplaudido.
Muito aplaudido também no teatro da PUC foi o líder do MST e da Via Campesina, João Pedro Stédile, que começou dizendo ser a “fome não um fenômeno da seca, mas da cerca”.
Após enaltecer as qualidades de Josué de Castro, autor do clássico livro Geografia da Fome, “que morreu de saudade do Brasil no seu exílio em Paris”, o líder campesino atacou sem dó nem piedade o capitalismo mundial.
Ele lembrou que as lutas de classe são das classes “até que as massas, estando no inferno, resolvem dar uma tapa no diabo”. E disse mais, que “a luta do povo é contra o capital, cuja hegemonia se internacionalizou” e que “o povo quer, agora, pão, terra e liberdade”.
Após criticar a classe dominante pela “acumulação primitiva de bens”, Stédile findou prometendo que “logo, logo, as massas voltarão às ruas para mudar o mundo”.
No dia seguinte não li nenhuma linha nos jornais sobre o tema fome nos jornais, por que, hein?
Se a minha avó estivesse ainda viva, certamente teria aplaudido com entusiasmo os conferencistas que participaram da mesa onde se achava Stédile.

SUSTO
Para encerrar, uma historinha: em 2007 participei de uma palestra com Stédile, na PUC-BA. Ele falando dos malefícios provocados a nós humanos pelos agrotóxicos e eu sobre a importância de as pessoas permanecerem em suas terras, principalmente os agricultores, pois a cidade grande nada tem a lhes oferecer além de problemas. E lembrei as tantas músicas que falam disso. Foi legal. Antes, ainda em Salvador, almoçamos na casa do cantor, compositor e instrumentista Fábio Paes. Depois da palestra, tomamos uma cervejinha no aeroporto e embarcamos. Era noite. Ao se levantar para ir à toalete, Stédile desabou no corredor do avião e desmaiou. Foi um corre-corre danado. Imediatamente comuniquei às aeromoças de quem se tratava. Um passageiro médico o atendeu e logo tudo voltava à paz. Pegamos um táxi em Guarulhos e já recuperado Stédile me deixou em casa e seguiu.
Ufa!

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