Álvaro Alves de Faria é folha em branco sugerindo palavra para se preencher.
Não.
Álvaro Alves de Faria é palavra sugerindo folha em branco para se derramar.
Diferente de tantos, esse poeta lírico e cheio de dor do nada cria trilhas para seus versos deslizarem ora no céu de Deus ora no céu da boca dos filhos de Deus.
Ora de gume cortante, ora de pétala orvalhada, os versos alvarinos parem coisas belas e gentes como Júlia, “rainha invisível”, na descrição do próprio poeta, e que o leitor, por isso, pode crer ser dona de olhos pardos, de andar noturno e pele alva a passear em bamboleio pelas ruas de sol e mar da imaginação.
É impossível ficar indiferente ao talento de Álvaro Alves de Faria, paulistano da safra dos 40 que recria em ritmo rápido, com personalidade e emoção, a poesia que não se acha nas prateleiras do Brasil.
O livro Cartas de Abril para Júlia, não deixa dúvidas quando ao talento do seu autor.
Aliás, só mesmo um mestre caçador e domador de palavras, como ele, iniciaria um livro assim:
“No entanto, Júlia surgiu quando chovia”.
É como se desse prosseguimento a uma história já iniciada, mas não.
E direto, descreve:
“Havia um rio sob meus pés que molhava destinos antigos, águas últimas entre pedras”.
E num crescendo, como no famoso Bolero, ele segue na elegância do seu batucar:
“Apareceu com as mãos abertas, como uma ave ferida”.
É referência, claro, à chegada da personagem.
De chofre:
“Tinha cinco asas e no olhar os ciprestes nasciam como plantas amanhecidas”.
E no que poderia ser um parágrafo, revela:
“Júlia trazia uma bolsa de palavras esquecidas”.
A partir daí, o livro ganha lirismo extremo e uma densidade capaz de surpreender o mais exigente dos leitores.
O par de Júlia, que numa elaborada contradição diz que nunca a viu, é um artesão “fazedor de chaves”, mas as chaves que faz não são para “abrir portas”, são para ele se “trancar cada vez mais”.
Tudo não passa de um sonho.
Ela chegou numa chuva.
Ela partiu levando o ar que respirava seu par.
Cartas de Abril para Júlia é para ser lido num fôlego e recomendado aos quatro ventos.
Numa palavra: incrível.
E tenho dito!