Há
muitas formas de uma lâmpada se apagar. Quebrando-a, por exemplo. Mas a lâmpada
também apaga-se sozinha. Assim como as pessoas, por exemplo. O inventor do
avião, apagou-se pendurado numa corda. O escritor Ernest Hemingway (1899 –
1961) apagou-se com um tiro de winchester. O compositor Assis Valente,
apagou-se se enchendo de formicida num banco de praça, no Rio de Janeiro.
Sim,
há muitas formas de uma lâmpada se apagar.
Uma
lâmpada ilumina um quarto, uma casa, uma rua, um bairro, uma cidade, um mundo.
Os
faróis que orientam os navios são uma lâmpada.
Uma
estrela no céu é uma lâmpada.
Uma
lâmpada é uma ideia, uma lâmpada é vida, uma lâmpada é tudo. É o bater de um
coração, também.
Uma
lâmpada é alegria, é luz; o contrário é a escuridão, a tristeza, o caos, o fim
do mundo.
Solidão
também é o contrário de lâmpada.
Na
extensa discografia da música popular brasileira o tema solidão é uma
constante. Todos ou quase todos os grandes compositores abordaram e continuam a
abordar o tema.
Dolores
Duran (1930 - 1959), numa das madrugadas escuras da vida, sentada sozinha numa
mesa de bar, escreveu num guardanapo versos sem nenhuma alegria, mas definitivos
na sua procura por uma lâmpada, por uma luz, por um amigo, por uma companhia,
desde que fosse verdadeira:
[...] Eu quero
qualquer coisa verdadeira
Um amor, uma saudade,
Uma lágrima, um amigo.
Ai, a solidão vai acabar comigo.
Um amor, uma saudade,
Uma lágrima, um amigo.
Ai, a solidão vai acabar comigo.
Além da carioca Dolores, e muitos outros
poetas e letristas, o poeta pernambucano Carlos Pena Filho também escreveu uma pérola que
evoca o tema:
Na avenida Guararapes,
o Recife vai marchando.
O bairro de Santo Antonio,
tanto se foi transformando
que, agora, às cinco da tarde,
mais se assemelha a um festim,
nas mesas do Bar Savoy,
o refrão tem sido assim:
São trinta copos de chopp,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados. [...]
o Recife vai marchando.
O bairro de Santo Antonio,
tanto se foi transformando
que, agora, às cinco da tarde,
mais se assemelha a um festim,
nas mesas do Bar Savoy,
o refrão tem sido assim:
São trinta copos de chopp,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados. [...]
O
poeta paraibano Augusto dos Anjos (1884 - 1914), que gerou uma obra incrível
reunida no seu único livro, Eu,
publicado no início da segunda década do século passado de forma independente,
traz fantasticamente triste soneto N’augusta solidão, que é assim:
N'augusta solidão dos cemitérios,
Resvalando nas sombras dos ciprestes,
Passam meus sonhos sepultados nestes
Brancos sepulcros, pálidos, funéreos.
São minhas crenças divinais, ardentes
- Alvos fantasmas pelos merencórios
Túmulos tristes, soturnais, silentes,
Hoje rolando nos umbrais marmóreos,
Quando da vida, no eternal soluço,
Eu choro e gemo e triste me debruço
Na laje fria dos meus sonhos pulcros,
Desliza então a lúgubre coorte.
E rompe a orquestra sepulcral da morte,
Quebrando a paz suprema dos sepulcros.
Resvalando nas sombras dos ciprestes,
Passam meus sonhos sepultados nestes
Brancos sepulcros, pálidos, funéreos.
São minhas crenças divinais, ardentes
- Alvos fantasmas pelos merencórios
Túmulos tristes, soturnais, silentes,
Hoje rolando nos umbrais marmóreos,
Quando da vida, no eternal soluço,
Eu choro e gemo e triste me debruço
Na laje fria dos meus sonhos pulcros,
Desliza então a lúgubre coorte.
E rompe a orquestra sepulcral da morte,
Quebrando a paz suprema dos sepulcros.
E
para encerrar, a minha conclusão é a seguinte: a tristeza é filha da solidão,
que por sua vez é irmã gêmea, siamesa, da depressão.
A
depressão é uma lâmpada queimada.
Você
conhece As Mariposa, de Adoniran Barbosa?
Hahahaha!