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domingo, 16 de agosto de 2015

AS MÃOS TÊM OLHOS...


Texto do repórter Júlio Maria informa, hoje,  em matéria de capa do Caderno 2 do Estadão, que a vida me reservou o mistério da surpresa.
Sim, estou cego.
O descolamento de retina, depois de várias intervenções cirúrgicas no Hospital das Clínicas e em outros lugares, levou-me ao mundo da escuridão.
Sim estou cego, mas não vejo nisso nenhum problema. O problema é a adaptação nesse novo mundo ao qual ingresso com a ajuda de amigos queridos e da equipe da Associação Brasileira de Assistência a Pessoa com Deficiência Visual, mais conhecida como Laramara.
O pior, já passou.
Verdade que morri nove vezes e nove vezes ressuscitei; agora, como a Fênix, das cinzas estou ascendendo.
Vez ou outra, de João Pessoa, Vital Farias me telefona  para saber como estou.
Vez ou outra, de Teresópolis, Vandré  me telefona para saber como estou.
Quase sempre, esses telefonemas são de longa duração.
Pelo menos uma vez por semana, José Ramos Tinhorão e Célia e Celma me visitam para saber como estou. E entre uma cachacinha e outra, Tinhorão me diz um monte de coisas interessantes a respeito deste nosso  Brasil tão ruído e corroído  por  ratos de plantão. E conversamos e conversamos.
Célia e Celma são ótimas no fazer chá da tarde.
Também com alguma frequência tenho a alegria de receber Papete, Osvaldinho da Cuíca, Téo Azevedo, Luiz Wilson  e os rapazes do Tri Gato com Fome.
Com essas pessoas, eu me sinto em festa.
E como se não bastasse, ainda tem Luiz Guerrero que me leva, quase sempre atropelando as minhas falas, até a Laramara.
Na Laramara, tenho me sentido em casa.  
Até aqui aprendi que posso ver através das mãos, das pernas, dos pés, pelo pensar e pelo ouvir das vozes que até mim chegam.
Eu perdi a luz dos meus olhos, mas ganhei a nova vida que me levará aos caminhos do bem fazer e educar e aprender; aprender para ensinar; aprender para educar.
O resumo disso é Cidadania.
E pensar que a gente reclama de tanta coisa...Se chove, a gente reclama. Se faz sol, a gente reclama.Se faz frio, a gente reclama. Se faz calor, a gente reclama.

A gente reclama de tudo
Reclama sem precisão
Reclama por reclamar
Por reclamar sem razão
A vida é muito boa
Ora, chega de reclamação!