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sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

O AMOR E OUTRAS HISTÓRIAS EM CORDEL



Frank Sinatra amava Ava Gardner, que amava Frank Sinatra. Mas um dia a chama do amor esmoreceu e se apagou. Da parte dele, a chama insistiu em continuar acesa. Uma loucura. Lê-se isso num livro recente, publicado sobre ele, no Brasil, escrito por um repórter amigo, Bill Zehme.
O amor é assim mesmo, carregado de loucuras.
Sinatra corria atrás da Ava, como o rio corre para o mar. E, nesse caso, o mar parecia distanciar-se cada vez mais do rio.
Sinatra e Ava brigavam muito, o tempo todo, como cão e gato. Ela morreu anos antes dele e, com sua morte, ele morreu um pouco, antes de morrer por completo no ano de 1998.
Como todas as histórias de amor, a história de Frank e Ava não poderia ser diferente e poderia ter ocupado páginas de folhetos de cordel. Mas isso não aconteceu. A história dos dois, Frank e Ava, ganhou páginas de volumosos livros biográficos, como esse do repórter Zehme.
A história da literatura de cordel é antiga, muito antiga. Confunde-se com o trovadorismo português do Século 12.
Os primeiros folhetos, ou algo parecido, chegaram ao Brasil no século 16. E chegaram com autorização do rei D. João V (1689/1750). Sabe-se disso através de documentos encontráveis na Torre do Tombo, a mais importante biblioteca de Portugal. Estive lá.
O berço do que chamamos “literatura de cordel” é, mesmo, português. Já o repentismo, bom, essa é outra história.
As histórias contidas nos folhetos são, naturalmente, histórias que passam de boca em boca desde sempre. E aqui falamos de oralidade.
Os africanos tornados escravos trouxeram muitas histórias de antepassados, no Brasil passadas adiante por eles mesmos.
Silvino Pirauá e Leandro Gomes de Barros, paraibanos, foram os poetas pioneiros da literatura de cordel em nosso País, com um detalhe: Pirauá foi, também, poeta repentista que desenvolvia histórias ao som de instrumento de cordas ou pandeiro.
Pirauá deixou de herança poucos folhetos, ao contrário de Leandro. Leandro Gomes de Barros nasceu em 1865 e morreu em 1918.
Até hoje ninguém sabe ao certo quantos folhetos Leandro escreveu, mas seguramente passa de 400 o número de histórias em verso que escreveu, editou, publicou, e ele mesmo vendeu, pessoalmente ou em pontos de venda, na Paraíba e em Pernambuco.
Leandro escreveu sobre tudo: carestia, política, amor, crime...
Ele não deixou passar em branco a passagem do Cometa Halley que assustou o mundo todo, em 1910.
Elomar Figueira Mello, a exemplo de Leandro Gomes de Barros, também fez sua versão da história da donzela Teodora.
 

...E O MUNDO NÃO SE ACABOU.

O cometa é colorido

Feminino e alado

E voa muito alto

Num céu todo estrelado

E lá de cima ele vê

Um mundo muito agitado



Esse mundo é o nosso

Violento e complicado

Doido, infeliz e chato

Torto, desengonçado

Flutuando no espaço

Sem rumo, desgovernado



Esse mundo é o nosso

Sujo, desajeitado

Como um boi na canga

Ferido, encurralado

Ou como um trem sem trilhos

Sem uso, abandonado



Esse mundo é o nosso

Um mundo mal assombrado

Um mundo sem futuro

E presente degringolado

Esperando só a hora

Do apito finado



O cometa é colorido

Feminino e alado

E voa muito alto

Num céu todo estrelado

E lá de cima ainda vê

Um mundo muito agitado.

(O Poema do Fim do Mundo, Assis Ângelo)

No dia 19 de maio de 1910, o cearense Antonio Gonçalves da Silva, que viria a se tornar famoso pelo apelido de Patativa do Assaré, tinha um ano, dois meses e catorze dias. Naquele ano, dia e mes, o cometa Halley iluminava o céu e fazia chover chuva de estrelas, assustando o mundo todo.
O mineiro Carlos Drummond era meninote e contou o que viu, anos depois. Cientistas, frios que nem uma porta, explicaram tim tim por tim tim o fenômeno ocorrido, mas nem assim conseguiram acalmar os assustados habitantes do planeta todo.
Muita gente faturou a passagem do Halley pela terra.
Todo mundo, ou quase todo mundo, acreditava que o mundo chegara ao fim.
Feiticeiros, bruxas, bruxos, adivinhos e picaretas em geral, de tempos em tempos anunciam o fim do mundo. E essas "previsões" não dão em nada, a não ser comentários de todo tipo.
O tema fim do mundo se acha na literatura de cordel, na música popular, nos jornais, revistas...
Pelos cálculos de um maluco russo não era para eu estar aqui, pois segundo ele o mundo, esse mesmo em que vivemos, chegaria ao fim ontem, 16 de fevereiro deste ano de intranquilidade de 2017.
Eu já falei bastante sobre esse assunto, em textos aqui blogados.






 

O fim do mundo já foi "previsto" em todas as partes do mundo. Eu acredito no fim do mundo. Acredito até que ele tenha se acabado ontem. Acabou-se para muita gente, não é mesmo? Até porque a polícia do Rio de Janeiro não para de matar, inocentes inclusive. Nas cadeias deste Brasil surpreendente, há todos os dias um preso a menos, morto, por facções ou não facções. Porém, um detalhe: quanto mais o mundo se acaba prá muita gente, muita gente continua nascendo para viver o fim do mundo depois.



O cientista russo a que me referi disse que andou fazendo um monte de cálculos em torno de um asteróide do tamanho do fim do mundo. Ele disse que se o tal asteróide caísse no mar, o mundo se acabaria afogado. E se caísse em terra, o mundo, esse mesmo em que vivemos explodiria em bilhões e bilhões de pedaços de todos os tamanhos, quer dizer, não sobraria sequer uma alminha para contar a história a ETs e a mais sei lá quem.
O tema está na Bíblia, mais precisamente na parte referente ao Apocalipse, e na música popular brasileira.
Na literatura de cordel, o tema fim do mundo vem sendo desenvolvido desde sempre.
Até o italiano Frei Damião de Bozzano anunciou o fim apocalíptico deste nosso planetinha eternamente judiado por todo mundo.
Os cientistas dizem que o cometa Halley existe há milhões e milhões de anos, mas o medo veio com ele em 1910.
O Halley tem uns 15 km só de corpo, sem falar do rabo que tem centenas, talvez milhares de kms. Nada fica escuro quando o Halley dá o ar da sua graça. Quer dizer, ficar, fica. Os cegos não voltam a ver, por exemplo. Mas antes de eu ficar cego, eu o vi passar por aqui no ano de 1986. E não vou vê-lo mais, é claro. E sabem por que é claro? Porque sua passagem pela terra ocorre a acada 75 anos. Pelas contas, então, até lá o mundo se acabará... prá mim.
A minha sábia avó Alcina, que nem o próprio nome sabia assinar, jurava em contrição, que o mundo, esse mesmo em que vivemos irá se acabar em fogo.
Para a minha avó, o mundo se acabou no tempo em que eu ainda era menino.


Na verdade a terra inda não se acabou sabe-se lá por que! Somos apenas uma bolinha de gude, girando, zanzando no espaço.