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sábado, 27 de novembro de 2021

IMPRENSA NEGRA, RESISTENTE E HEROICA: PARTE VIII (FINAL)

O fundador do jornal O Homem de Cor, alfabetizado pela irmã Ana Angélica, foi pioneiro em várias frentes. Literárias, inclusive. É dele o primeiro conto publicado em letras de forma, no Brasil e a publicação de mais de 200 livros de autores como Machado, Casimiro de Abreu (1839-1860), Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879), Martins Pena (1815-1848), autor da peça O Juiz de Paz na Roça; Gonçalves Dias (1823-1864) e Gonçalves de Magalhães (1811-1882).
Magalhães foi o introdutor do romantismo no Brasil, poeticamente falando. É dele o livro Suspiros Poéticos e Saudades, lançado por Brito em 1836.
Um ano antes, o autor se achava em Paris. Foi lá que ele fez a introdução do livro citado.
Até aí nada demais, a não ser o pioneirismo do seu editor.
Problema viria quando ele, Magalhães, resolveu lançar o poema indianista intitulado Confederação dos Tamoios.
O autor era protegido por Pedro II.
Por causa desse poema, José de Alencar jogou todas as lanças contra o autor, ensinando-o publicamente a fazer um épico.
E o sol escureceu em pleno dia com os debates nos jornais, incluindo o imperador.
Do poeta Gonçalves Dias, que era do Maranhão e autor da famosa Canção do Exílio, Paula Brito publicou a primeira edição do livro Últimos Cantos.
Fora isso, Paula Brito também compôs músicas. Uma delas em parceria com o maestro Francisco Manuel da Silva: Lundu da Marrequinha.
Manuel da Silva é o autor da melodia do Hino Nacional Brasileiro.
É também de Paula Brito, em parceria com o mineiro José Joaquim Goiano, a canção Ponto Final.
Como editor Paula Brito também publicou folhetos e partituras musicais, dentre as quais A Noite de São João.
A Noite de São João, uma opereta em 2 atos, tinha como autor José de Alencar (1829-1877). A melodia dessa obra foi assinada pelo paulista de Itú Elias Lobo (1834-1901) e regida pelo compositor e maestro campineiro Antônio Carlos Gomes (1836-1896). Isso ocorreu na noite de 14 de dezembro de 1860. Local: Teatro São Pedro. Na plateia, a família Real.
Em 1870, na Itália, Gomes apresentar-se-ia para o mundo regendo a Ópera O Guarany, baseada em romance homônimo de Alencar.
A área dessa Ópera chegou a ser gravada pelo tenor Caruso (1873-1921).
“Carlos Gomes foi o mais importante compositor operístico das Américas”, diz o maestro paulistano Júlio Medaglia. Que acrescenta: “Carlos Gomes era negro. A cultura brasileira é negra e devemos aos negros a cultura brasileira”.
Medaglia lembra que além de Gomes, Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, foi de grandeza espontânea e gigantesca na formação cultural do nosso País: “Aleijadinho era negro, filho de português com escrava”.
Nessa mesma linha, o fotógrafo profissional Jorge Araújo, que desconhecia o termo “Imprensa Negra”, diz: “A informação no estado direito não tem raça. O Brasil no século passado, pós-abolição, era um canal subversivo de informação para a raça negra que chegaram nos porões dos navios e continuam nos porões de uma sociedade racista camuflada, ainda no século 21. A mesma informação, garimpada por jornalistas brancos ou negros, tem que conter a ética da informação”. Concluindo, Araújo diz não entender a divisão entre brancos e pretos na nossa sociedade.
Mais de 130 anos depois de a princesa Isabel assinar a Lei Áurea, que oficialmente livrou as pessoas do cativeiro, a discriminação e o preconceito continuam em vigor no Brasil de 2021.
Notícia do Sindicato Nacional dos Docentes das instituições de Ensino Superior, o ANDES, dá conta que:
De janeiro a setembro deste ano, 1.015 pessoas foram resgatadas em situação de trabalho análogo ao de escravo. Os dados estão disponíveis no site Radar SIT, da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), do Ministério do Trabalho e Previdência (...) Os números desse ano superam o total de 2020, com 936 pessoas resgatadas, e se aproxima do registrado em 2019, 1.131 casos.

Foto cedida pelo repórter fotógrafo Jorge Araújo

O Supremo Tribunal Federal, STF, decidiu em sessão do dia 28 de outubro transformar em lei o crime
Foto cedida pelo repórter fotógrafo
Jorge Araújo

de injúria racial:
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (28), por 8 votos a 1, que o crime de injúria racial pode ser equiparado ao de racismo e ser considerado imprescritível, ou seja, passível de punição a qualquer tempo. De acordo com o Código Penal, injúria racial é a ofensa à dignidade ou ao decoro em que se utiliza palavra depreciativa referente a raça e cor com a intenção de ofender a honra da vítima.
O caso é sério, sempre foi.
O Juiz Onaldo Queiroga, titular da 1ª Vara da Comarca de João Pessoa, PB, lembra da dívida histórica que temos com índios e negros: “A dívida que o Brasil tem com os índios e negros tem que ser paga. Demore o tempo que durar, mas tem que ser paga. Devemos muito a eles e a sociedade, junto com a Justiça, tem de tomar as rédeas desse processo histórico”.
O radialista baiano Carlos Silvio, diz: “O racismo é algo a ser combatido. Ao racista, punição e o desprezo. Não são poucos os negros com papel de destaque na história do Brasil. Muitos foram esquecidos ou, propositalmente, não são mais citados pelos movimentos e grande mídia”.
O historiador Darlan Zurc, contido nas suas apreciações, crer ser simplesmente legítima a iniciativa de os negros tomarem o seu rumo. “A escravidão humana é uma chaga na História, desde a Antiguidade. E o problema piorou quando ela, na Idade Moderna, se voltou contra os negros. Ou seja, a cor se transformou em moeda de troca”, conclui Zurc.
No campo da música, folheto de cordel e repentismo destacaram-se no Império e pós-Império grandes artistas negros: Domingos Caldas Barbosa (RJ) e José Maurício Nunes Garcia (RJ), o primeiro popular e o segundo erudito.

Nas fotos com Assis Angelo, Carlos Silvio (esq.) e Darlan Zurc (dir.)
Também se destacaram no campo da cultura popular, especialmente no campo do repentismo, Inácio da Catingueira (PB) e Fabião das Queimadas (RN).
Caldas Barbosa foi o criador do gênero musical modinha.
José Maurício Nunes Garcia destacou-se na Corte por tocar viola e escrever peças religiosas.
Inácio da Catingueira era um escravizado, como o Fabião das Queimadas. Ambos conseguiram comprar a própria alforria.
Inácio tocava pandeiro e Fabião, rabeca. Fabião morreu aos 68 anos de idade, em 1928.
O Repentismo teve uma rainha: Chica Barrosa, de batismo Francisca Maria da Conceição (1867-1916), filha de escravos. Foi esfaqueada por um pretendente de nome José Pedro da Silva.
O preconceito racial é uma praga antiga. E continua.
O preconceito também aparece nos folhetos de cordel, entre os quais Peleja do Cego Aderaldo e Zé Pretinho do Tucum e na Peleja Manuel do Riachão com o Diabo.
E, claro, não custa lembrar a importância da maestrina Francisca Edviges Neves Gonzaga (1847-1935), autora e criadora do gênero marchinha (Ó Abre Alas), Joaquim Antônio da Silva Callado Júnior (1848-1880) e Patápio Silva (1880-1907).
Callado e Patápio Silva foram de fundamental importância na construção do chorinho como gênero musical.
E Pixinguinha, hein?
E o samba, hein?
O samba começou a ganhar forma na música brasileira na casa da Tia Ciata.
Curiosidade 1: O nome Zumbi dos Palmares, líder guerreiro, só foi descoberto em 1970 e em 1983 a data da sua morte (20 de novembro) escolhida como o Dia da Consciência Negra.
Curiosidade 2: Castro Alves escreveu o seu mais famoso poema (O Navio Negreiro) em São Paulo, no ano de 1868, no tempo em que estudava Direito no Largo de São de Francisco. Uma parte desse poema foi especialmente musicado pelo compositor e maestro Jorge Ribbas, professor de música da Universidade Estadual da Paraíba. Uma pérola. Ouçam:

 

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Esse texto foi originalmente escrito para o Newsletter Jornalistas & Cia. Já os conhece? Confira: Jornalistas&Cia, especial Perfil Racial da Imprensa Brasileira

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