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domingo, 27 de março de 2022

CAMÕES, SEMPRE CAMÕES (2, FINAL)

Retrato de Dom Sebastião
no livro Os Lusíadas
O feito do poeta Camões é insuperável. Em qualquer língua.
No Brasil houve tentativa de se compor algo parecido ao feito de Camões.
Em 1923 o poeta Augusto Meira (1873-1964) tomou para si essa tarefa. Ou seja, a de transportar com tinta verde/amarela a história do achamento das nossas terras até a Guerra do Paraguai (1864-1870). Essa tentativa, naturalmente frustrada, pode ser conferida pela leitura do livro Brasileis, a Epopeia Nacional (Instituto Lauro Sodré).
Eu não quis fazer o que Meira tentou. Resolvi fazer, simplesmente, uma readaptação d’Os Lusíadas. Usei os principais personagens, mas não trouxe a narrativa para o Brasil. No sentido histórico do termo. Acrescentei por acrescentar, dois poetas cantadores nordestinos contando a história de Vasco da Gama e a história de Vaz de Camões.
A essa adaptação, dei o título de A Fabulosa Viagem de Vasco da Gama no Mar (adaptação livre de Os Lusíadas para canto e cordel). Começo assim:

Aqui neste ambiente
Eu venho para contar
A história de um homem
De força espetacular
Que nunca fugiu à luta
Nem na terra nem no mar

Esse homem eu conheço
Dele já ouvi falar
É pessoa corajosa
Treinada para lutar
Esteve em todo canto
Navegando pelo mar

Eu e minha viola
Viemos pra espalhar
A coragem desse homem
Forte, justo, exemplar
Que nunca teve medo
Do terror que há no mar…


E sigo, no canto 2:

Um dia Júpiter chamou
Seus pares pra conversar
Queria deles saber
Que posição adotar
Sobre uma certa viagem
De certo homem do mar

Num piscar d’olhos chegaram
Os deuses para escutar
Queriam eles saber
O que Júpiter tinha a falar:
Seria sobre a viagem
Daquele homem do mar?

Ouviu-se um zum, zum, zum
Eram Deuses a murmurar:
Quem seria esse valente
Decidido a enfrentar
Os mau humores do tempo
E as estranhezas do mar?

Esse homem era forte
Fora feito pra lutar
Pensava o tempo todo
Num modo de viajar
Queria ir pra longe
Bem pra longe pelo mar…

E no canto 3, eu digo:

Sob céu de brigadeiro
Dia bom pra passear
Com ruas embandeiradas
Saltimbancos a brincar
Anunciando boas novas
Com salva de tiros no mar

Tudo está perfeito...
"É preciso navegar
Viver não é preciso"
Isso é certo vou contar
Três ou quatro navios
Seguiriam pelo mar…


E mais um pouco, sigo adiante:

Tinha 28 anos
Ao resolver aceitar
O enorme desafio
De fazer o mundo vibrar
Com a grande façanha
De ir à Índia pelo mar

Reuniu a marujada
Para tudo por a par
Lembrou de graves perigos
Que iriam encontrar
Agora principalmente
Na viagem pelo mar

Ele estava firme
Já pronto pra embarcar
Tinha mais do que certeza
De seu alvo alcançar
Realizando o sonho
De ganhar a terra pelo mar…


No 5º canto, eu trago a Ilha dos Amores criada pela deusa Vênus:

Há na Ilha dos Amores
Mitos e lendas no ar
E figuras encantadas
Dançando à luz do luar
Enquanto o vento canta
Antigas cantigas do mar

Desde sempre se sabe
Que na vida é bom sonhar
Na Ilha dos Amores
Não é pecado pecar
Pecado é não ouvir
Os cantos que vêm do mar

Cantos que sempre contam
De guerreiros a guerrear

De seres apaixonados
Que morrem só por amar
De segredos das estrelas
E de mistérios do mar…

A história é, de fato, fabulosa, incrível. E tudo começa quando Camões decide contar o heroísmo do seu povo, depois de ler Homero e Virgílio.
Homero contou cantando a história do seu povo. O mesmo o fez Virgílio.
É isso.
Outro dia falei a respeito desse épico ao repórter Ivan Finotti, da Folha de S.Paulo. Sem cuspir pra cima, sem querer isso, apenas lembro: eu perdi a visão dos olhos, mas não perdi a visão da memória. Fiquei invisível, é certo. Estou cego, dos olhos. Só. Poucos me veem, paciência… E digo a quem quiser ouvir, estou vivo.
Pois é, há 450 anos era lançado o clássico Os Lusíadas.

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