Numa conversa qualquer em que o tema seja música ou músicos brasileiros eruditos, o nome que logo vem à mente é o do compositor e maestro carioca Heitor Villa-Lobos, autor das Bachianas em que se acha O Trenzinho do Caipira. Numa forçação de barra, digamos assim, pode surgir outro nome: Antonio Carlos Gomes. E talvez também a soprano Bidu Sayão, até porque foi homenageada e desfilou em carro alegórico da Beija-Flor no carnaval de 1995. Morreria em 1999, com 97 anos de idade.
São muitos os artistas brasileiros atuantes no campo da música erudita, desde sempre. O primeiro deles foi o padre José Maurício Nunes Garcia que sabia tudo e mais um pouco a respeito do assunto.
Além de Villa-Lobos, Carlos Gomes e José Maurício, outros como Francisco Mignone, Guerra-Peixe, Alberto Nepomuceno, Francisco Braga, Alexandre Levy, Cláudio Santoro e Radamés Gnattali deixaram sua marca nesse campo. Mas a memória está sempre a negar fogo.
Carlos Gomes, um paulista da região de Campinas, muito cedo enveredou pelo fabuloso mundo da música. Ele ainda se achava nos primeiros anos da adolescência quando começou a tocar na bandinha marcial do pai Manoel José Gomes (1792-1868), popularmente chamado Maneco Músico. Com 13, 14 anos, já fazia música em pauta. Um dia, na bandinha do pai, foi visto pelo imperador Pedro II que na ocasião visitava sua cidade. Aquilo foi marcante e desde então o menino Tonico, como era chamado Carlos, começou a sonhar alto imaginando-se estudante de música no Rio de Janeiro, então capital do Império.
Antes de trocar Campinas pelo Rio, o jovem Carlos Gomes passou uma temporada na Capital paulista onde conheceu estudantes de Direito do Largo de São Francisco.
Corria o ano de 1859 e é dessa época o hino à Mocidade Acadêmica. É também dessa época a modinha Quem sabe?, com letra de seu amigo Bittencourt Sampaio. Essa modinha foi e continua sendo gravada por muita gente, inclusive Inezita Barroso (1925-2015). A letra é esta:
Tão longe, de mim distante
Onde irá, onde irá teu pensamento
Tão longe, de mim distante
Onde irá, onde irá teu pensamento
Quisera saber agora
Quisera saber agora
Se esqueceste, se esqueceste
Se esqueceste o juramento
Quem sabe? Se és constante
Se, ainda, é meu teu pensamento
Minh'alma toda devora
Da saudade agro tormento
Tão longe, de mim distante
Onde irá, onde irá teu pensamento
Quisera saber agora
Se esqueceste, se esqueceste o juramento
Quem sabe? Se és constante
Se, ainda, é meu teu pensamento
Minh'alma toda devora
Da saudade agro tormento
Vivendo de ti ausente
Ai meu Deus, ai meu Deus que amargo pranto
Vivendo de ti ausente
Ai meu Deus, ai meu Deus que amargo pranto
Suspiros, angustias, dores
Suspiros, angustias, dores
São as vozes, são as vozes
São as vozes do meu canto
Quem sabe? Pomba inocente
Se também te corre o pranto
Minh'alma cheia d'amores
Te entreguei já n'este canto
Vivendo de ti ausente
Ai meu Deus, ai meu Deus que amargo pranto
Suspiros, angustias, dores
São as vozes, São as vozes do meu canto
Quem sabe? Pomba inocente
Se também te corre o pranto
Minh'alma cheia d'amores
Te entreguei já n'este canto
O cartunista Fausto e eu estamos fazendo um livro com charges e textos, sobre encontros fictícios entre grandes artistas do Brasil. Inezita e Carlos Gomes são dois dos personagens que escolhemos para o livro, que se chamará Histórias de Esquina.
Já no Rio de Janeiro, estudando no Conservatório de Música, Carlos Gomes ganhava admiração de colegas e professores. Em 1861, compôs sua primeira ópera: A Noite do Castelo. Dois anos depois usufruía de uma bolsa de estudos concedida pelo Imperador, na Itália. E na Itália conheceu a fama com a ópera Il Guarany, que estreou na noite de 19 de março de 1870 no Teatro Alla Scala de Milão. O grande Giuseppe Verdi estava presente. Encantado com a atuação de Gomes, declarou a um repórter da Gazzeta Ferrarese: "Esse jovem começa por onde eu termino".
Carlos Gomes ganhou fama, mas não ganhou dinheiro com Il Guarany. Motivo: vendeu os direitos autorais ao primeiro editor musical que lhe apareceu à frente.
A ópera que mais dinheiro deu a Antonio Carlos Gomes foi Salvador Rosa, que estreou na noite de 21 de março de 1874, em Gênova. Essa ópera, desenvolvida em quatro atos, foi dedicada a André Rebouças.
Il Guarany é baseada no livro O Guarani do escritor cearense José de Alencar. É da linha indianista. Trata do romance entre a filha de um fidalgo português (Ceci) e de um indígena da tribo dos guaranis (Peri). Essa ópera estreou no Brasil no dia 2 de dezembro de 1870.