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domingo, 16 de junho de 2024

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (106)

O primeiro navegador português a chegar ao Brasil foi Duarte Pacheco (1460-1533).

Depois de Pacheco e Cabral, aportou na costa baiana o lisboeta Diogo Álvares Correia (1475-1557). Isso em 1510. Esse Diogo logo foi apelidado de Caramuru. E é aí que começa a bagunça.

Caramuru juntou-se com várias indígenas da etnia Tupinambá e com elas teve muitos filhos.

Essa era uma prática comum entre os indígenas.

Entre os indígenas, eu disse.

Isso porém não quer dizer que todos os povos indígenas tivessem o mesmo comportamento. Nem todos eram canibais, por exemplo. Tinham regras a cumprir. No campo sexual, inclusive.

A poeta e psicóloga Geni Núñez, da etnia Guarani, aborda a questão no livro Descolonizando Afetos: Experimentações Sobre Outras Formas de Amar (Paidós). Começa dizendo da intromissão dos jesuítas na cultura nativa: “O esforço missionário direcionou-se ao processo de incutir, violentamente, a percepção de que determinados costumes e práticas deveriam ser alvo de remorso, culpa, vergonha e arrependimento. A listagem de condutas imorais era extensa”. 

Caramuru

Para reforçar o que diz, Núñez cita Ana Lúcia Sales de Lima e Sezinando Luiz Menezes: “Dos pecados mais condenáveis pelos padres, destacam-se a nudez, as relações de poligamia entre os membros das aldeias e a condução de suas vidas através dos ensinamentos do pajé (responsável tanto pelo conforto espiritual como por curas aos enfermos)”.

Giacomo Puccini

Lima e Menezes são autores de Que Proveja Isto com Temor, Pois Nós Outros Não Podemos por Amor: A Ação Catequética do Padre Manuel da Nóbrega nos Trópicos Entre 1549-1559.

No seu livro, Núñez define a monogamia e outras práticas sexuais com suas devidas diferenças:


Os prefixos de monogamia (mono-) e de poligamia (poli-) podem aludir, em um primeiro momento, a uma questão de quantidade, como se monogamia fosse pertinente a quem quer se relacionar com apenas uma pessoa e poligamia se referisse àquelas pessoas que desejam se relacionar com várias. Esse é um dos equívocos mais comuns, justamente porque nem “monogamia” é sobre um/único nem “não monogamia” corresponde necessariamente a vários. Na não monogamia, alguém que queira se relacionar com apenas uma pessoa tem o direito de fazê-lo, mas isso diz respeito apenas a si mesmo. Se a outra pessoa quiser também se relacionar com apenas um, sem problemas, mas, se sentir de outra forma, cabe apenas a ela essa escolha. Só quem pode dar consentimento nesse sentido é a própria pessoa, sobre si mesma.


Grosso modo, a história registra que a presença dos jesuítas nas novas terras fez mais mal do que bem.


Foto e reproduções de Flor Maria e Anna da Hora