Acabo de ler do mais completo investigador da história da música brasileira, José Ramos Tinhorão, mais um belo livro a favor da clareza histórica, O Rasga: uma Dança Negro-Portuguesa, com a chancela da Editora 34.
Esse é o 26º volume de uma obra riquíssima e que cresce de importância desde 1966, ano que o autor lançou pela Civilização Brasileira A Província e o Naturalismo (esgotado) e pela Saga (ambas editoras cariocas), Música Popular: um Tema em Debate (disponível pela já citada 34).
Tinhorão é aquele cara que os acadêmicos lêem com reservas e apontam com discriminação, depois de o engolirem como caviar e o arrotarem como salsicha.
As investigações em torno do negro (foi em torno da figura do negro que surgiu o rasga) se iniciaram há duas décadas, na terra de Camões.
O primeiro resultado dessas investigações apareceu no livro Os Negros em Portugal: uma Presença Silenciosa (Editorial Caminho, Lisboa, 1988).
Antes disso ele trilhou os caminhos do fado desde o Brasil, provocando inadvertidamente um ataque de nervos na diva da canção portuguesa Amália Rodrigues, que morreu magoada com o investigador.
O rasga como dança (e música) deixou rastros a partir da segunda metade do século 19, entre os negros e mulatos de Lisboa e teve no paraense Cezar Nunes um de seus destacados intérpretes.
A prova disso está em Batuque de Pretos (Odeon Record, nº 108102) e na Imitação d´um Batuque Africano (Victor Record, nº 98702), faixas constantes dos referidos discos.
Mas para O Rasga: uma Dança Negro-Portuguesa se tornar realidade, era preciso achar a pedra que faltava como solução do quebra-cabeça que o próprio Tinhorão arrumou para si, que foi essa pesquisa.
A solução apareceu ocasionalmente quando lhe pus nas mãos um velho disco de 76 voltas (Odeon nº 43191) importado, com o ator-cantor português Franco d´Almeida Lisboa, cantando.
Nessa gravação, Lisboa é acompanhado por um piano e não por um ganzá, canza ou reco-reco, o que seria natural por causa da origem do ritmo, que já não existe.
E pensar que tudo isso começou com visitas a alfarrabistas...
O encontro de um exemplar do Almanak Processo do Rasga (Paródia ao Processo do Cancan) para 1880, que tinha como personagem um negro de nome Caetano Rasga Roupa, e a leitura discreta de folhetos de cordel fechou a investigação.
Para completar, O Rasga: uma Dança Negro-Portuguesa traz encartado um CD, como prova documental de suas incursões na poeira do tempo (www.editora34.com.br).
Querido Assis,
ResponderExcluirVocê sempre nos surpreendendo com matérias que apresentam questões que nos faz refletir sobre a história do nosso povo e cultura.
Parabéns!
Beijo,
Nireuda