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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Cordel e Currículo Escolar

Em fevereiro de 1808, Dom João VI e sua família se achavam em terras brasileiras. Fugidos, em decorrência de ameaça de invasão a Portugal por Napoleão, o que se efetivou em dezembro daquele ano.
Dom João permaneceu por cá durante treze anos, voltando a sua terra após a morte de Napoleão, em 1821.
Neste 2016, faz exatamente duzentos anos que João VI foi coroado rei do Brasil.
Por que lembro isso?
Antes de mais nada,  porque fevereiro é quase sempre o mês do carnaval. Mas o carnaval no Brasil antecede a presença da família real na nossa terra.
Em pesquisa que desenvolvi na Biblioteca Pública do Porto, em Portugal, descobri que o Entrudo chegou ao Brasil nos começos do século XVIII. O Entrudo é a forma mais primitiva do que viria a se chamar carnaval.
Em 1808, Portugal era na sua decadência um país completamente dependente das riquezas do Brasil. Era muito lixo, lixo de todo tipo atirado nas ruas, nas calçadas. Daí, talvez, a “inspiração” ou origem do Entrudo por lá trazido pra cá. Os “foliões” praticantes do Entrudo atiravam sujeira, incluindo excrementos nas pessoas.
Em 1840, a coisa começa a mudar nas ruas do Rio de Janeiro, sede da corte. Grandes bailes eram feitos nos palácios e nos sítios ou fazendas da aristocracia. O primeiro baile de carnaval, por exemplo, data desse tempo. Os cordões e blocos vêm em seguida. O Entrudo permaneceria por mais algum tempo. Isso é história.
Por falar nisso, o governo está anunciando drásticas mudanças no currículo escolar. Drásticas mesmo. Os luminares da República estão excluindo desse currículo os autores portugueses, por exemplo. Estão excluindo a história clássica. Nada da Grécia, nada de Roma, nada de Portugal.
Se criminosamente for efetivado esse currículo, nossas futuras gerações deixarão de saber quem foram Eça de Queiroz, Camões, Pessoa, Antero de Quental, Branquinho da Fonseca, Camilo Castelo Branco, só para citar alguns. Ficarão também sem saber nada de nada sobre a Desgarrada, que aqui transformamos em poesia de repente, de improviso; e Literatura de Cordel...
Há alguns anos, eu disse em entrevista ao Jornal The Guardian, de Londres, da importância da Literatura de Cordel na Europa e no Brasil. Claro, citei Camões, os decassílabos de Camões, maravilhosos! Aqui mesmo no Brasil temos grandes cordelistas como os paraibanos Silvino Piraua e Leandro Gomes de Barros.
Essa história de mudar o currículo escolar é muito séria. Não se pode mudar um currículo desse porte de uma hora para outra. Parece que se faz isso tudo a calada da noite, propositalmente. Por que se faz isso? Não se pode por num currículo escolar a ideologia de um partido político, isso é crime.
No Brasil de hoje ainda há mais de 12% de analfabetos completos e algo em torno de 25% de analfabetos funcionais.
Para onde vamos?
Dom João VI veio para o Brasil e voltou para a sua terra, onde morreu.
A herança portuguesa no campo cultural é rica, muito rica.
O que será do brasileirinho que está chegando?
Ai, de nós!
Assim, em 2006 proferi palestra de encerramento de um seminário no Congresso Nacional. Na ocasião, propus que a música voltasse ao currículo escolar. A proposta foi aceita e virou lei, uns dois anos depois, mas essa lei até hoje não foi devidamente aprovada. Fui procurar saber e lá em Brasília me disseram que não há pessoal capacitado para a matéria.
É o fim do mundo, ou do Brasil.

Amanhã, nos Sambódromos do Rio e de São Paulo tem mais desfiles de Carnaval.

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