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domingo, 14 de janeiro de 2018

SAUDADE É BOA E DOCE QUE NEM RAPADURA, MAS DÓI!


"Mas rapaz que título legal, curioso... Esse livro deve ser muito bom."
Pois é, a fala acima aspeada é do meu amigo potiguar e editor festejado José Cortez referindo-se ao novo livro do querido cearense e cordelista espetacular Klévisson Viana,  Miolo da Rapadura.  Eu já li esse livro, melhor: Lúcia leu prá mim. E gostei muito. E o Tinhorão também.
Miolo da Rapadura: esse título emocionou Cortez "eu não ouvia essa expressão há mais de setenta anos, trouxe de volta minha infância lá no sertão do Rio Grande do Norte..."
"Esse Klévissom é um danado!" Diz de novo Cortez do auto dos seus 81 anos de idade completados em novembro passado, levando para si um exemplar extra que o Klévisson me enviou.
Bem, mas não é sobre esse assunto que eu agora quero falar. Aliás, porque já falei em texto anterior. E ontem eu disse que hoje falaria algo sobre saudade, certo?
O meu peito é um cofre que guarda bem guardado um tesouro de memórias, de histórias, de coisas que vivi e que certamente não viverei mais.
Passado é história, e como história, lembrança.
Lembrança é uma palavra que nos remete à saudade.
Saudade é uma palavra exclusiva da língua portuguesa, embora haja quem diga que suas origens levam ao mundo árabe. Não acho.
A palavra saudade é oriunda mesmo dos portugueses.
Nenhuma língua traduz o sentimento da saudade tão bem como a palavra inventada pelos portugueses. É uma palavra difícil de traduzir. Na verdade, é uma das seis ou sete palavras mais difíceis de traduzir. Os espanhóis tentaram isso, os alemães também, os italianos...
O latim fala algo como solitude, soledade, solidad, solidão. Isso tudo, misturando tudo dá em saudade. Saudade de alguém que parte e não volta mais, de alguém que morre, de alguém querido que simplesmente some, desaparece, que não dá notícia.
A gente sente saudade de uma alegria passada, de um momento bom. Por aí. Não dá é prá sentir saudade da dor, não é mesmo?
No tesouro que guardo no peito tem nomes como Seu Severino e Dona Maria Anunciada, meus pais. Não convivi muito tempo com eles, Seu Severino partiu com 33 anos de idade e dona Maria aos 27. Na somatória de idade, 60, cinco a mais do que a soma de anos que viveram.
No meu cofre de saudade tem Dona Alcina, minha avó, e Dona Benedita que mostrou-me os primeiros caminhos que eu deveria trilhar nessa vida doida, mostrou-me também as primeiras letras.
Tem muita gente bonita no cofre da saudade que guardo comido: padre Camilo, holandês que me ensinou português, e padre  Eugênio que foi o primeiro padre a casar no Brasil, virando ex-pare. Com eles convivi no Colégio de onde eu poderia ter  tomado gosto e virado padre, mas como a vida nos traz surpresas... virei jornalista, depois de estudar música e artes plásticas em João Pessoa, PB.
São muitas as lembranças que trago comigo e que me fazem bem.
Uma vez perguntei ao paulista compositor Adoniran Barbosa o que era saudade e ele me respondeu:
"É um bichinho que rói, rói, rói o nosso coração."
E prá findar ouvi de Cortez uma frase  que vem se somar ao que está escrito aí:
"Saudade é a ausência de algo ou alguém que você gosta".
O tema saudade é cantado e decantada em verso e prosa por autores da língua portuguesa especialmente do Brasil, eruditos e populares. Antonio Pereira, por exemplo, mais conhecido como O Poeta da Saudade escreveu estes versos:

Saudade é um parafuso
Que na rosca quando cai,
Só entra se for torcendo,
Porque batendo num vai
E enferrujando dentro
Nem distorcendo num sai.

Saudade tem cinco fios
Puxados à eletricidade,
Um na alma, outro no peito,
Um amor, outro amizade,
O derradeiro, a lembrança
Dos dias da mocidade.

Saudade é como a resina,
No amor de quem padece,
O pau que resina muito
Quando não morre adoece.
É como quem tem saudade
Não morre, mas não esquece.

Adão me deu dez saudades
Eu lhe disse: muito bem!
Dê nove, fique com uma
Que todas não lhe convêm.
Mas eu caí na besteira,
Não reparti com ninguém.

Quem quiser plantar saudade
Primeiro escolha a semente
Depois plante em lugar seco
Onde brota o sol mais quente
Pois se plantar no molhado
Quando nascer mata a gente.

                         Antônio Pereira







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