— Ah! Sim, todo mundo sabe: coração de sertanejo é duro de doer. É calejado, cheio de marca que nem seus pés e suas mãos. Olha aqui as minhas mãos, tá vendo? Todas cheinhas de calo de tanto amargar o cabo da enxada de sol a sol. Doem... E os pés? Olha aqui. Tudo rachado que nem a terra seca a espera de água da chuva que nunca vem.
— É, coração de sertanejo não é mole, não; mas quando dá de doer, seu moço, de machucar feito moenda com toras de cana ou aquelas maquininhas de repuxar agave, no muque, ah!, danou-se! E fique certo: o sofrimento é tanto que lembra dor de dente em hora de meio-dia, sob a danação da seca pesada. É de lascar!
— Por essas bandas tudo é triste. O nosso andar, a nossa fala puxada, o nosso riso, até o nosso espirro é triste. Pode reparar. Tudo é triste na gente. Menos a esperançca. Ah! Essa, não. É tudo que nos resta... Mas que a nossa vidinha por aqui é braba, lá isso é. Daí a tristeza. Deus que me perdoe, mas acho que até ele esquece da gente. E né não?
— Mas eu tava falando mesmo era dos carros de boi. Quando os carros de boi param, tudo para. Até o tempo. Eita tristeza danada é a falta do gemido, do choro inacoluto do carro de boi!... Eu sempre quis falar esta palavra: inacoluto...
— Essa história de carro de boi é triste, mas é bonita. Nem sei se pelo carro ou pelo boi. Prus meninos do sertão, o boi não é só um bicho trabalhador, não. É amigo, amigo mesmo! Boa companhia. Bem comparando, é que nem cão e gato na cidade grande. Mas um dia tudo se acaba. Nós, inclusive. E os bois. De morte morrida ou de morte matada, não interessa. Isso é detalhe. Quando o boi morre de morte matada, a sua carne é vendida no açougue. Que fazer? Das duas, uma: ou se morre de barriga cheia ou se morre de barriga vazia...
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