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quinta-feira, 6 de agosto de 2015

HOJE TEM PAPO DE VIOLA NA VILA

Eu convido vocês para uma conversa sobre cultura popular em que a viola é o destaque. Estarei lá, logo mais às 20 horas, no auditório da Livraria da Vila, para o lançamento do livro Conversa de Violeiro, do violeiro Chico Lobo e do escritor Fábio Sombra, e do CD Cantigas de Violeiro, de Chico Lobo.

Segue o prefácio do livro Conversa de Violeiro


Livraria da Vila
Rua Fradique Coutinho, 915
Pinheiros, São Paulo
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UM PASSEIO PELO MUNDO DA VIOLA
Assis Ângelo

Como o forró, a moda de viola pode ser definida como um bisaco de cego, no qual se acham os mais diferentes badulaques. No caso, ritmos e gêneros musicais.
Em 1949, o rei do baião Luiz Gonzaga encontrou no seu conterrâneo José Dantas o parceiro que o ajudaria a dar forma musical ao forró.
Num ano que se perde na história, algo parecido aconteceu com a moda de viola.
O ritmo/gênero moda de viola passou a ser conhecido pelo público fora do campo, da roça, no começo do século passado, quando o brincante tieteense Cornélio Pires, com a ajuda de seu sobrinho Ariovaldo Pires, o Capitão Furtado, procurou o representante do extinto selo musical Columbia, no Brasil, Alberto Byington Jr..
A conversa entre Cornélio e o velho Byington foi, digamos, nada estimulante no primeiro momento para Cornélio.
A todo custo Cornélio tentava convencer o empresário a lançar discos com modas de viola. Num certo momento Cornélio perguntou quanto custava fazer um disco e levá-lo ao mercado. Era muito caro etc.. Para encurtar a história: Cornélio arrumou uma montanha de dinheiro e com ela convenceu Byington a lhe abrir as portas da gravadora.
E foi assim que, entre 1929 e comecinho de 1931, Cornélio Pires levou à praça a série de 52 discos de 78 voltas com seu próprio nome.
Pois bem, além de se transformar no primeiro produtor musical do Brasil, Cornélio Pires abriu veredas para os violeiros anônimos que com seus sons originais encantavam os ouvidos do povo nas tardes compridas dos fins de semana. Assim, desbravado o caminho, a moda de viola, incluindo toadas, cateretês etc., passou a ser apreciada por um público novo e ilustrado até então acostumado a ouvir Bahiano, Cadete, Eduardo das Neves e outros nomes cujas vozes que rodavam nos pesados gramofones, uma grande novidade da época.
Estamos falando dos primeiros anos do Século XX.
Em novembro de 1944, o Capitão Furtado entrava no estúdio da recém-criada Gravadora Continental – hoje extinta- para produzir o primeiro de uma longa série de discos da dupla Tonico e Tinoco, que ele acabara de descobrir e que se tornaria lendária entre nós.
Claro que anos antes muitos discos com modas de viola já haviam sido lançados ao comércio com grande sucesso e muitos autores e intérpretes viveram financeiramente bem com o que faziam.
Não dá para esquecer de Raul Torres, Florêncio, Serrinha, Rielinho, Carreirinho e tantos mais que em 1994 ganharam uma série própria: Som da Terra (Warner/Continental).
Muitas histórias permeiam o mundo da viola e dos violeiros.
No exterior, até hoje, todo instrumento que se parece com violão é comumente chamado de violão ou guitarra.
Das matas do Ceará, um dia, saíram os irmãos Mussaperê e Herundy.
Num ano qualquer os irmãos, ainda meninos, acharam um violão ou viola e com ela passaram a se entender musicalmente, e com este instrumento gravaram bem depois, em setembro de 1953, na velha Continental, o primeiro de muitos discos com o baião Tambor Índio e o galope Acara Cary, de autoria deles.
Mussaperê e Herundy, dois dos trinta filhos de um cacique, ficariam mundialmente famosos pelo nome de Índios Tabajaras.
Neste livro, o mineiro Chico Lobo e o carioca Fábio Sombra deixaram por instante as violas no canto da parede e mergulharam no universo caipira e de lá nos trazem informações valiosas de todo tipo sobre a viola e violeiros. Já no primeiro capítulo, Viola Caipira - Duas pequenas histórias, Lobo e Sombra falam de folclore e origens do instrumento. No último capítulo, Retirada, os autores se despedem do leitor com muita graça e alguma fantasia.
E tome história!
Constituído por 11 partes, o livro Conversa de Violeiro – Viola Caipira: tradição, mistérios e crenças de um instrumento com alma brasileira, escrito de forma bem natural conquista o leitor muito rapidamente, desde os primeiros parágrafos. É como se estivéssemos ouvindo a prosa e o ponteio dos autores. Saborosos são os causos e o modo como Sombra e Lobo nos apresentam as crenças, as simpatias, as curiosidades e tudo o mais que consta do rico, belo e agradável universo da cantoria dos violeiros do Brasil que ainda, e felizmente, se espalham por aí a fora.
No Rio Grande do Sul temos o trovador, equivalente ao cantador nordestino, que por sua vez tem também muito a ver com o cururueiro de São Paulo e o calangueiro de Minas Gerais.
O mundo do caipira ou do matuto, como se diz no nordeste é, sem dúvida, de grande riqueza. Nesse mundo cabe tudo, até o que não deveria caber: a mistura das cantigas de viola feitas de modo natural com a contaminação provocada por instrumentos eletrônicos, iniciada nos fins dos anos de 1960 por duplas como Léo Canhoto e Robertinho. Exemplos? Basta ligar o rádio.
A boa viola e o bom violeiro existem desde os tempos de antanho.
Ali pela virada do século XIX para o XX, em Canudos, BA, soldados matavam de dia os seguidores de Conselheiro e à noite, sob as insuspeitas estrelas do céu se transvestiam de violeiros, e pungentemente cantavam e tocavam em roda para afogar as mágoas, antes de virarem bicho com a cara cheia de cana.
A música, seja ela de que tipo for, existe em qualquer lugar; a partir, mesmo, do vento, do mar e até do coração humano, que bate em compasso binário.
A palavra “caipira” vem do tupi ka'apir ou kaa - pira, língua que o português Marquês de Pombal decidiu acabar, mas o que não acaba é a moda de viola representada por muitos ritmos e gêneros vindos da viola, que com sua magia inspira o tocador a expor suas alegrias e saudades.
Depois de Cornélio Pires e do musicólogo paulistano Mário de Andrade autor da obra-prima Viola Quebrada, a moda de viola como tal concebida nos primeiros registros fonográficos continua sendo apreciada cada vez mais por um público que se multiplica. Isso, não custa dizer, que se deve a iniciativas de artistas que marcaram presença entre nós: Tião Carreiro & Pardinho, Bambico (o Dourado da dupla Dourado & Douradinho), Zé do Rancho, Renato Andrade, Cacique & Pajé, Almir Sater, Ivan Vilela, Roberto Corrêa, Fernando Deghi, Tião do Carro, Téo Azevedo, Rodrigo Mattos, Helena Meirelles, Juliana Andrade e Inezita Barroso, por exemplo.
Inezita, que não tinha na viola o seu principal instrumento e sim o violão, deixou um legado muito importante.
Através do seu programa Viola Minha Viola (TV Cultura), que ficou no ar durante 35 anos ininterruptos, ela descobriu e incentivou nomes que o tempo confirmaria de real importância, como a dupla de mineiros Pena Branca & Xavantinho - e Bruna da Viola, sua última descoberta.
Antes de Inezita Barroso, não havia orquestras de violeiros como a de Mauá, Osasco, Campinas, etc.
O livro Conversa de Violeiro - Viola Caipira: tradição, mistérios e crenças de um instrumento com a alma do Brasil, é para ser lido num fôlego só, de preferência com um disco de Chico Lobo e Fábio Sombra tocando na sala.
E tenho dito!

Ah! Dizem as más línguas que violeiro é que aquele sujeito que passa metade do tempo cuidadosamente afinando sua viola e a outra metade tocando desafinado.


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