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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

CRUZ E SOUSA, UM MESTRE DO SIMBOLISMO


Pois é, morreu pobre e decepcionado com a recepção que teve das pessoas brancas no mundo em que viveu.

O pai e a mãe de Cruz e Sousa (1861-1898), Guilherme e Eva, eram alforriados. 

O "dono" da mãe do poeta, Xavier de Sousa, ficou com o casal alforriado durante muito tempo. 

A mulher de Xavier, Clarinda Fagundes Xavier de Sousa, não tinha filhos e por isso acabou adotando o menino filho de Guilherme e Eva.

Xavier era "coronel", pessoa rica e bajulável. 

Dito isso, acrescentemos: o menino filho de Guilherme e Eva teve assim oportunidade de estudar num colégio da elite da terra onde nasceu, Florianópolis. Aplicado, aprendeu latim e grego.

João de Cruz e Sousa, sobrenome herdado do coronel, foi repudiado por mundo e meio só pelo fato de ser negro. 

Já adulto, Cruz e Sousa apaixonou-se pela literatura poética. Fundou jornais e em 1885 dividiu o primeiro livro,  Tropos e Fantasias, com o colega jornalista Virgílio Várzea. 

A carreira solo poética de Cruz e Sousa foi marcada, a princípio, pelos livros Missal e Broqueis lançados em fevereiro e agosto de 1893, respectivamente. 

As obras aí citadas foram as únicas publicadas em vida do poeta. De Broqueis, ressalto o poema Múmia: 

Múmia de sangue e lama e terra e treva,                                                              Podridão feita deusa de granito        Que surges dos mistérios do Infinito Amamentada na lascívia de Eva

Tua boca voraz se farta e ceva      Na carne e espalhas o terror maldito, O grito humano,  o doloroso grito      Que um vento estranho para os limbos leva.

Báratos, criptas,dédalos atrozes      Escancaram-se aos tétricos, ferozes    Uivos tremendos com luxúria e cio...

Ris a punhais de frígidos sarcasmos    E deve dar congélidos espasmos        O teu beijo de pedra horrendo e frio!...


Curiosidade: a palavra mais citada por Cruz e Souza nos seus poemas é virgem. Ou ainda virgindade ou virginal.

Como todo poeta simbolista, Cruz e Souza fala de amor, vida e morte. O mesmo fariam Alphonsus de de Guimarães (Ismália) e Augusto dos Anjos (Versos Íntimos).

Cruz e Souza é dos poucos poetas que li o que mais falou de música, dança etc. Exemplo é o bonito e provocativo Dança do Ventre.

Torva,febril, torcicolosamente,        Numa espiral de elétricos volteios,    Na cabeça, nos olhos e nos seios      Fluiam-lhe os venenos da serpente. 

Ah! que agonia tenebrosa é ardente!    Que convulsões, que lúbricos anseios,  Quanta volúpia e quantos bamboleios,  Que brusco e horrível sensualismo quente.  

O ventre, em pinchos, empinava todo    Como réptil abjecto sobre o lodo,      Espolinhando e retorcido em fúria.

Era a dança macabra e multiforme      De um verme estranho, colossal, enorme,                                Do demônio sangrento da luxúria!              

A dança do ventre é uma dança de origem muito distante, talvez do tempo do grego Homero. Ou seja, ali pelo século 8 a.C. O berço, Egito. A simbologia tem a maternidade como alvo. Nessa dança, a mulher "usa" o corpo para expressar a alegria da vida. Parece-se com uma serpente em movimentos eróticos.

A dança do ventre espalhou-se rapidamente por todos os países do chamado mundo árabe.

A língua que falamos tem muitas locuções de origem árabe. Fica o registro. 

Cruz e Sousa casou-se no final da última década do século 19 com Gavita Gonçalves, com quem teve quatro filhos. 

Os três primeiros filhos do poeta morreram prematuramente vítimas de tuberculose, mal que também mataria o pai e a mãe. Detalhe: Cruz e Sousa morreu no interior de Minas e o seu corpo foi transportado num trem de carga até o Rio de Janeiro onde foi sepultado. Os custos do enterro correram por conta de amigos como José do Patrocínio. 

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