Primavera, Sampa, sábado: 16h58.
De garra no telefone, do outro lado ouço um amigo dizendo baixinho: "Artur
está dormindo, te ligo já, já".
Aquelas simples e tão poucas palavras tocaram-me fundo, levando-me às dobras
do tempo.
Ali, naquela hora, vi/ouvi a minha querida mãe Maria cantando antiga cantiga
pra eu dormir.
Ai, ai, já fui bebê, já fui criança.
Lembro-me da mãe Maria. E como lembro!
Um dia o meu pai Severino ralhou comigo. Sem razão, acho. A minha mãe virou
fera e balançando os quartos, desafiou-o: tire-me de mim!, foi a fala dela. Ou
mais ou menos.
O amigo falando baixinho levou-me a pensar, a ter certeza, que ainda é possível haver amor
entre pais e filhos. Isso num tempo em que filho mata pai, mata mãe, vai pra
cadeira e volta recuperado para matar de novo.
A minha mãe Maria cantava pra que eu pudesse dormir.
O meu amigo, José, tem 70 anos e o seu filho menino, 2.
Pra amar, não há idade.
A minha mãe cantava Caymmi, mais ou menos como Caymmi cantava: