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sexta-feira, 24 de setembro de 2021

SEVERO É AGORA ESTRELA NO CÉU

 

No ano de 2012 o Sesc Santana, SP, abriu espaço para que eu pudesse apresentar uma exposição/ocupação sobre músicas que falam da Capital paulista. Mais de 3mil títulos, resultado de uma pesquisa que fiz no decorrer de mais de 20 anos. Na ocasião, estiveram comigo muita gente bacana: Inezita Barroso, Altamiro Carrilho, Paulo Vanzolini e tantos e tantos. Entre esses tantos e tantos: Antônio Severo, Joel dos Santos, Ana Maria e eu.
Foi uma exposição muito bonita, visitada por milhares de pessoas no decorrer de 2 a 3 meses.
Severo nos deixou na madrugada de hoje 24. 
Em junho deste ano escrevi um texto lembrando a trajetória do jornalista João do Rio. Foi texto originalmente publicado no Newsletter Jornalistas&Cia. Neste texto, que também saiu no folheto de cordel (ao lado), faço uma singela homenagem ao querido Severo.
Fica o registro. 
Sobre a exposição, clique: 

ADEUS CORTEZ, ADEUS SEVERO

José Xavier Cortez e Paulo Freire
O mundo continua girando, girando e dele gente caindo e subindo. Aos trancos.
Gente querida tem partido sem se quer dizer adeus. Rapidamente. Fechando os olhos e pronto.
No começo da madrugada de hoje 24, ali pela 1h30, partiu para a Eternidade José Antônio Severo. Gaúcho. Amigo querido. Jornalista.
Ali pelas 5 horas de hoje 24 foi juntar-se às estrelas outra pessoa querida: José Xavier Cortez.
Guardo de Severo e Cortez gratíssimas lembranças, boas risadas.
E é assim, estou me sentindo só. Cada dia mais.
Primeiro foram meus irmãos ainda crianças. Depois a minha mãe e o meu pai.
E assim seguimos, voltando de onde viemos: o Cosmos?
A última vez que falei com Severo, pessoalmente, foi dia 16 de julho passado. Cá em casa.
A última vez que falei com Cortez, por telefone, foi na tarde de domingo 19 passado. Falamos um monte de coisas, como sempre falávamos. Naquela tarde, falamos e falamos sobre o educador Paulo Freire. Confira:

Claro que é política a proposta de alfabetização contida no livro Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire.
O que é que há em comum entre o pernambucano Paulo Freire e o baiano Anísio Teixeira?
Freire nasceu em 1921 e Teixeira, 21 anos antes. Ambos formaram-se primeiramente em Direito e só depois tornaram-se educadores.
Teixeira foi o primeiro educador a detectar falhas e necessidades na alfabetização de jovens e adultos, no nosso País.
Como Teixeira, Freire abandonou a profissão de advogado para continuar no direito de ensinar para aprender junto aos analfabetos seus alunos.
Em 1963, Paulo Freire pôs em prática um método revolucionário de alfabetização no município de Angicos, no Rio Grande do Norte, RN.
Naquele ano, conseguiu ensinar as primeiras letras a mais de 300 trabalhadores da construção civil, que não conseguiam distinguir um “O” de uma roda. Foi quando os empregadores se arrepiaram, recusando-se a pagar até os direitos trabalhistas.
Foi esse o “pulo do gato” de Freire ao imaginar e desenvolver o método que leva o seu nome no Brasil e mundo afora.
Em 1964, Anísio Teixeira foi exilado pelos poderosos de plantão.
Em 1964, Paulo Freire foi exilado pelos poderosos de plantão.
Os poderosos de plantão são personagens que atuam em movimento contrário ao avanço da sociedade moderna, sempre à espreita.
Um povo analfabeto é um povo cego sem luz, sem graça, sem futuro, que precisa de muleta para existir.
Um povo analfabeto e sem futuro é presa fácil de quaisquer poderosos de plantão, ditadores, prepotentes, obscurantistas.
Uma pessoa alfabetizada reconhece com facilidade o mundo em que vive e nele se movimenta com a graça de quem ama a vida.
Uma vez o paulista Monteiro Lobato (1882-1948) disse que “quem ler mais, sabe mais”.
Uma vez, há muito tempo, o grego Sócrates à beira da morte teria dito: “Só sei que nada sei”.
No livro A Importância do Ato de Ler, agora na 52ª edição (Cortez Editora), Paulo Freire diz à pág. 66: “Na verdade, para que a afirmação ‘quem sabe ensina a quem não sabe’ se recupere de seu caráter autoritário, é preciso que quem sabe saiba sobretudo que ninguém sabe tudo e que ninguém tudo ignora. O educador, como quem sabe, precisa reconhecer, primeiro, nos educandos em processo de saber mais, os sujeitos, com ele, deste processo e não pacientes acomodados; segundo, reconhecer que o conhecimento não é um dado aí, algo imobilizado, concluído, terminado, a ser transferido por quem o adquiriu a quem não o possui”.
Atualmente, o Brasil tem cerca de 11 milhões de analfabetos completos. Fora isso, é incontável o número de analfabetos funcionais. Esses são aqueles que aprenderam o bê-á-bá mecanicamente, sem raciocinar, na base da decoreba.
O método Paulo Freire é importante, muito importante, por identificar esse caminho errado. Ou seja, não basta decorar o bê-á-bá, é preciso interpretar o bê-á-bá.
“A leitura do mundo precede a leitura da palavra”, afirma Freire na palestra que proferiu no Congresso Brasileiro de Leitura, realizado no dia 12 de novembro de 1981, em Campinas (SP).
O analfabeto é analfabeto por não saber ler nem escrever, mas não é analfabeto no mundo real em que vive. Pois nesse mundo, o seu mundo, ele distingue facilmente os códigos que o rodeiam. Portanto, nesse caso, o bê-á-bá pouco acrescenta ao sujeito em questão.
Sabe aquela história de o caipira ou o matuto falar errado?
“A primeira vez que mantive contato com Paulo Freire, foi por telefone. Ele se achava na Suíça ou na Suécia, não lembro bem. Propus-lhe editar seu livro Pedagogia do Oprimido. Mas ele respondeu que já tinha editora, a Paz e Terra”, lembrou o potiguar José Xavier Cortez. “Isso foi pouco antes de ele voltar do exílio”, acrescentou.
No decorrer do tempo, Cortez e Paulo Freire tornaram-se amigos. “Antes de A Importância do Ato de Ler publiquei Educação e Atualidade Brasileira, Pedagogia: Diálogo e Conflito e Paulo Freire: Uma Bibliografia”, relembra Cortez.
Enquanto publicava livros pela Cortez, Paulo Freire publicava artigos na revista Educação e Sociedade. Essa revista era resultado de uma parceria entre a editora Cortez e a Unicamp.
É possível que os textos de Freire publicados na revista virem livro.
A gratidão que o educador pernambucano tinha pelo editor potiguar fica explícita nesta declaração: “Se o país tiver sensibilidade, reconhecimento, amor e o sentimento do agradecimento corajoso e leal, Cortez vai virar nome de instituição no País todo. Tenho Cortez como editor e também como amigo”.
Cortez já virou nome de escola: Escola Estadual José Xavier Cortez, no extremo sul da Capital paulista.
Anísio Teixeira envolveu-se com a educação desde muito cedo.
Em 1931, já figura de destaque no campo da Educação, Anísio assinou o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova.Corria o governo Vargas. O ministro era Capanema e seu chefe de gabinete, Carlos Drummond.
Esse manifesto, assinado por 26 educadores e intelectuais como Cecília Meirelles, não agradou o governo Vargas. O tempo passou e muita água correu sob a ponte.
O resto é história.
Anísio Spínola Teixeira nasceu no ano de 1900 e morreu em março de 1971, isto é: há 50 anos.
Paulo Reglus Neves Freire morreu em 1997 e nasceu no dia 19 de setembro de 1921, ou seja: há 100 anos.
A educação deve muito a esses dois brasileiros. 
O cantor e compositor paraibano Chico César compôs e cantou, no ritmo de aboio, isso aqui:


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