Tem um cara da nossa literatura, que
eu gosto muito: Machado de Assis
A obra de Machado, especialmente seus
contos, parece ser toda baseada na vida brasileira de seus personagens. De hoje,
inclusive.
Baseado em supostos manuscritos
beneditinos, o diabo certa vez, segundo lê-se num conto de Machado – A Igreja
do Diabo –, decidiu disputar com Deus as atenções de todos os católicos e não-católicos,
criando ele mesmo, o diabo, a sua igreja. Com essa decisão, o diabo
mudaria seu modo de governar desde as trevas.
Assim, as virtudes teriam todas o seu
teor invertido: a preguiça, a gula, a ira etc.; seriam transformadas em coisas
que não prestam. O diabo também faria valer na sua igreja o fim de todos os
direitos; o humanismo não teria sentido, o amor ao próximo seria totalmente
destruído, o homem teria como positividade o “direito” de vender-se, incluindo
o voto, a fé e a alma.
Aliás, vender a alma, é algo que os
filhos do cão têm feito desde sempre.
Ouvindo a advogada Beatriz Catta Pretta,
que em nome do medo e de seus filhos afirma ter renunciado ao exercício da
própria profissão, fiquei de “queixo caído”.
Queixo caído é uma expressão que faz
parte do rico tesouro da cultura popular.
Ao ouvi-la, lembrei-me também da
desculpa esfarrapada do engraçado e perigoso Jânio Quadros que, ao renunciar a
presidência da República, num 24 de agosto, atribuiu a sua decisão “às forças
ocultas”.
Pois é, como nos contos do carioca
Machado de Assis, há muita realidade dolorosa expressa na fala dos personagens
que dilapidam o patrimônio nacional e pululam por aí no campo do real e do
irreal, deixando-nos de pelos arrepiados. Enfim, “no céu e na terra há muitas
coisas e mistérios além do que pensa a vã filosofia”.
A advogada Catta Pretta seria “caixa
preta” do enésimo escândalo que rouba o sonho e a esperança de nós, pobres
mortais brasileiros?
Esperemos, pois nada melhor do que um
dia atrás do outro.