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segunda-feira, 14 de agosto de 2017

OS CEGOS, ESSES INVISÍVEIS SERES

Anotações de pesquisadores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, de 2010, indicam que há em torno de um milhão de cegos absolutos no Brasil. Somando-se a esses os parciais, o número de cegos chega à casa dos seis milhões. É muito cego, não é?
Sempre houve cegos no Brasil e no mundo. A situação de antes talvez fosse pior do que hoje, mas ser cego é uma barra dos diachos!
Eu perdi a luz dos meus olhos há poucos anos e nesses poucos anos creio que já paguei todos os meus pecados e os pecados dos amigos que continuam a minha volta. São amigos de ouro, amigos queridos e aqui nem vou citá-los porque certamente eles não gostariam desse tipo de propaganda.
Amigos de verdade, verdadeiros, são pérolas, são tudo de bom, são anjos que estão sempre a nos dar força, distribuindo alegrias.
Muito antes de Cristo vir à terra, cegos incríveis marcaram história. Caso de Homero...
Eu conheci muitos cegos na minha vida de menino, de adolescente na Paraíba e mundo afora. Anônimos e famosos, incluindo Patativa do Assaré. Assaré fica no Ceará, antes do Crato. Era da cidade do Crato o cidadão Pedro Pereira da Silva, que nasceu em 1912 e morreu em 1997.
Pedro nasceu cego e com 29 anos de idade ganhou uma rabeca e danou-se a tocar e a cantar romances inteiros que decorava. E logo ficou famoso, e logo passou a ser chamado de cego Oliveira.
Casou-se e teve 9 filhos. Um deles, José, também rabequeiro, desaparecido em 2009. Cego Oliveira comeu o pão que o diabo amassou, como todos os cegos.
No decorrer da vida Cego Aderaldo cantou tudo que lhe vinha ao conhecimento. Tocou e cantou em folias de rei e prá morto seguir em paz com suas incelenças ou "cantos de vigilança", ainda comuns no interiorzão do sertãozão deste Brasilzão sem eira nem beira.
O Brasil, ou melhor, seus governantes, dispensa à população cega indiferença. Sou testemunha disso, portanto falo com cátedra.
Você meu amigo, minha amiga, sabe quantos cegos trabalham formalmente no Senado? 
Dia desse pedi a um amigo, Severo, que mora em Brasília e trabalha no Senado, que fizesse um levantamento a respeito desse tocante assunto. resultado: No Senado brasileiro há apenas dois cidadãos formalmente contratados... Triste, não é? Enquanto isso, o Congresso aprova Estatuto disso e daquilo, incluindo o das pessoas com deficiência visual, ou seja, cegas. Uma pergunta, não custa fazer: quem, de fato, são cegas, as pessoas que têm poder e vêm com os olhos ou as pessoas que não têm poder e vêm com as luz dos olhos apagada.
O cego Oliveira cantou em toda parte do Ceará, nos bares, nas festas de casamento e batizado, nas feiras livres, até que participou de um filme Nordeste.... e Repente de Tânia Quaresma, e de um disco produzido por Fagner em que Patativa declamava seus próprios poemas. E aí começou a dar entrevista no rádio, na televisão e o povo achando que com isso ele estava rico. Resultado: morreu à míngua e só uns quinze dias depois é que apareceu nos jornais cearenses a notícia da sua partida definitiva deste mundinho de meu Deus do Céu.



BRINCANDO COM A HISTÓRIA (47)


O BRASIL E REPENTE DE CEGO ADERALDO

Jornalista Audálio Dantas media palestra de Assis Ângelo sobre o Cego Aderaldo, no Sesc
Aderaldo Ferreira de Araujo entrou para a história do Repentismo como o mais importante cantador cego do país. Ele nasceu no Ceará no dia 24 de junho de 1878 e partiu para a eternidade no dia 29 de junho de 1967. Quer dizer, ele nasceu num dia de São João e foi pular fogueira no dia de São Pedro e São Paulo. Interessante, não é? Pois bem, a respeito dele falei um monte de tempo sexta passada, 11, numa das unidades do Sesc em São Paulo. Mestre Audálio Dantas, alagoana na CEPA, foi o mediador no correr do meu falatório. Uma pergunta que não me deixa calar: por quê o Brasil todo não fala do Cego Aderaldo e de outros grandes cegos, como o Cego Oliveira? Oliveira também era cearense, nascido em 1912 e desaparecido em 1997, há 20 anos por tanto.

Para o Cego Aderaldo eu fiz o poeminha que segue:


Neste mundo ainda tem 
Muito cego apaixonado
Cantando a vida em verso
De modo improvisado
Como o tempo todo fez
O bardo Cego Aderaldo

Aderaldo foi exemplo
De poeta e cidadão
Enxergava muito longe
Sem nos olhos ter visão
E lutava boa luta
Com as armas do coração

E lutava e cantava
Com uma rabeca na mão
Enaltecendo a natureza 
E os filhos da Criação
Como os peixes do mar 
E as aves de arribação

Ele era incomparável
No seu tempo de repente
Estava em todo o canto
Cantando sempre contente
Brincando com a rabeca
E fazendo verso para a gente

E não via com os olhos
Ele via com a mente!
Ele era especial
Sensível, inteligente
E mais do que ligeiro
No gatilho do repente

O repente é arte
É a alma da cantoria
É a via que transforma
Tristeza em alegra
E leva o povo todo
Ao mundo da fantasia

Um mundo fabuloso
Bonito, encantado
De violas repentinas
Por poetas habitado
E onde sempre estará
O mago Cego Aderaldo

Bom tocador de rabeca
E doutor em verso rimado
Foi primeiro sem segundo
No canto metrificado
E nunca fugiu à luta
Toda vez que foi chamado

Lutou com Patativa Sinfronio e Oliveira
Rogaciano e Pinto
E também com Zé Limeira
Aderaldo foi um marco
da porfia brasileira

Ele chegou, ele partiu 
Mas deixou verso plantado
E verso de toda a cor
Pra um dia ser lembrado
E é por isso que digo
Viva o Cego Aderaldo!

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