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domingo, 9 de fevereiro de 2025

ADEUS, VITAL FARIAS



 Já disseram e certamente ainda hão de dizer que "a vida é de morte".

E é mesmo, pois nascemos, vivemos e morremos. 

Ninguém nasce pra ser semente, tirante o fato de que como bichos humanos nos perpetuaremos até o fim dos tempos. E está perto, bem perto, bem pertinho... Pois, os poderosos donos do mundo em que vivemos continuam brincando com bombas atômicas e outros que tais igualmente mortíferos. O fato de momento é que nossos dias estão contados pelo Homem lá de riba.

A cada dia que passa penso estar ficando mais e mais só, pois os amigos têm partido sem se quer se despedir. Agora mesmo foi o querido Vital Farias, cuja carreira acompanhei desde o início. 

Antes, bem antes de Vital, foram-se Manezinho Araújo, Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Rolando Boldrin, Téo Azevedo, Otacílio Batista, Sebastião Marinho, João Paraibano, Valdir Teles, Patativa do Assaré, Luiz Vieira, Chico Salles, Audálio Dantas, José Ramos Tinhorão, Paulo Vanzolini, Inezita Barroso, Marinês, Carmélia Alves...

Tem hora, confesso, que pego o telefone pra ligar pra uma dessas pessoas aí citadas. Há tempo caiu em mim dando conta de que fulano e beltrano já não se acham perto de mim.

A última vez que Vital me telefonou faz um mês ou pouco mais ou menos de um mês. Dizia que estava se preparando pra me abraçar cá em Sampa, mas aí o coração o traiu, levando-o para a Eternidade. 

Neste Blog tem muita coisa que escrevi sobre Vital e mais os amigos aqui citados. 

Vital Farias foi o 51° filho de um mesmo pai. Partiu com 82 anos de idade e deixou, pelo menos, uma dezena de rebentos de seu próprio sangue. 


LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (167)

O Brasil foi o último país a descravizar pessoas.

Essa é informação que dói na alma.

Pela primeira vez, o dia 20 de novembro foi considerado oficialmente data nacional: Dia da Consciência Negra. Isso ocorreu em 2024.

O dia 20 de novembro é o dia da morte de Zumbi.

Zumbi, na pia batismal recebeu o nome de Francisco.

Quem deu esse nome a Zumbi, foi um padre que o criou: Antônio Melo.

Essa questão ainda hoje é discutida por muita gente boa.

Há nas cadeias do Brasil mais pretos e pardos do que brancos. E pobres de marré, marré, marré.

O médico Dráuzio Varella surpreendeu os leitores brasileiros com o seu bombástico livro Estação Carandiru, lançado em 1999. Foi enorme a polêmica. Esse livro como os dois outros que se seguiram, Carcereiros e Prisioneiras, talvez tenham contribuído para a decisão do então governador Geraldo Alckmin em demolir o velho presídio de que tratam os livros de Varella.

A leitura de Estação Carandiru dói e mexe com nossas ideias, principalmente no ponto que conta a invasão policial que resultou em 111 mortos.

Há muitas histórias nesse livro. Uma delas:


Mulher de cadeia casada jamais circula pela galeria, e para descer ao pátio, só acompanhada. Para casar, o marido deve estar em boa situação financeira, pois a ele cabe o sustento da casa; a ela, a submissão ao provedor. De forma velada, alguns condenam, mas a união é respeitada socialmente. O parceiro passivo não é considerado do sexo masculino. Nos estudos que conduzimos, não bastava perguntar se mantinham relações homossexuais. Era preciso acrescentar: e com mulher de cadeia? Antes das visitas íntimas, a homossexualidade era prolífica. Uma vez, dei o resultado positivo do teste de AIDS para um ladrão desdentado e perguntei-lhe se havia usado droga injetável no passado: 

— Nunca. Peguei esse barato comendo bunda de cadeia. Muita bunda, doutor! 


A vida na cadeia é uma vida inimaginável pra quem está fora dela.

Varella não minimiza nenhuma piscada registrada por seus olhos.

Pela memória de Dráuzio Varella circulam em Carandiru problemas profundos e almas de gente, de pessoas.

Na cadeia, a vida de um pobre preto ou de uma pobre preta é a mesma. Dura, duríssima.

Imaginem, pois, uma mulher negra, gay, prostituta, pobre…

A sociedade, não só no Brasil, condena de olhos fechados a miséria de quem vive pobre e aparentemente sem futuro. Principalmente quando esse pobre sem futuro é negro ou negra.

Nessa linha de realidade e interpretação segue Dráuzio Varella no livro Prisioneiros.

Nessa mesma toada segue a leitura do livro Presos que Menstruam. A autora, Nana Queiroz, leva às páginas a história de mulheres que caem no crime e são presas e condenadas a cumprir pena na cadeia. Começa com Júlia que cedo perde a infância, engravida e coisa e tal. Nana não mede palavras pra contar o que conta nesse livro.

Pois é, a realidade é terrível aqui e alhures. Mas até no mundo da fantasia há histórias que nos levam a pensar e a sofrer por contingências diversas.


Foto e ilustrações de Flor Maria e Anna da Hora

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