Passei a vida ouvindo, na escola e fora da escola, pessoas dizerem que a
princesa Isabel cometera um crime ao assinar a Lei Áurea.
Sempre me perguntei porque diziam isso, que fora um crime o que a
princesa fizera.
Logo após a assinatura da Lei Áurea, na tarde do domingo de 13 de Maio
de 1888, milhares e milhares de negros comemoraram entusiasticamente a
libertação do trabalho forçado a que eram submetidos nas fazendas e em
todos os cantos do País.
A Lei Áurea não foi assinada à toa.
Antes dessa lei houve as Leis Eusébio de Queirós, do Ventre Livre e do
Sexagenário.
Essas Leis, não por acaso, foram também assinadas pela filha de D.Pedro II.
Aliás, nessas ocasiões o Imperador, pai de Isabel, sempre se encontrava
ausente do Brasil.
D. Pedro só foi saber do que assinara a filha, duas semanas depois, quando se
achava em visita à Itália.
O movimento de libertação dos escravos foi iniciado nos fins da primeira parte
do século XIX. À frente desse movimento se achavam Luiz Gama, José do
Patrocínio, André Rebouças e outros mais.
Os libertos transformaram a Princesa Isabel numa verdadeira heroína e o golpe
republicano foi dado para freá-la no posto de rainha, que certamente ocuparia
após a morte do pai, D.Pedro II.
Meu amigo, minha amiga, você sabia que ao invés do Cristo Redentor, era
para estar no seu lugar uma estátua com todas as características da
princesa? Pois é, essa ideia foi de bate pronto anulada por ela mesma.
No último 20 de novembro, da Consciência Negra, não ouvi de nenhum
governador, e nem do presidente da República falar sobre o triste período
vivido pelos negros escravizados. Ouvi sim, um discurso profundo e
significativo do ex-presidente Lula. Uma pérola, sem dúvida, que compartilho
aqui com vocês. Cliquem:
A partir do lançamento do jornal O Homem de Cor, 5 meses depois do jornal
político O Grito dos Opprimidos, muitos jornais em defesa do negro começaram a
pipocar País afora. Na primeira edição do jornal O Homem, lançado em
Recife no dia 13 de janeiro de 1876, podia-se ler:
Há tempo de calar e há tempo de falar. O tempo de calar passou, começou o
tempo de falar. A classe dos homens de cor, sem dúvida nenhuma, a mais
numerosa e a mais industriosa do Brasil, parece atualmente voltada ao
ostracismo pelos homens que nos governam, contra toda a justiça, contra a
própria lei fundamental do país. Embora os particulares tratem-nos com
as atenções merecidas, embora muitos dentre eles se achem ligados conosco
pelos laços da mais sincera amizade, todavia os fatos denunciam que o
partido que há tempos predomina na província parece manter o propósito
desleal de ir apartando dos empregos públicos aqueles nossos que para eles
haviam sido nomeados por consideração de seus talentos e virtudes, conforme
preceitua a Constituição do Império.
Mesmo depois da Lei Eusébio de Queiróz e com a violência de sempre, os africanos
continuavam sendo laçados e trazidos em navios negreiros sob as rédeas dos
portugueses, principalmente. Essa vergonha, esse drible contra a Lei, durou
mais 2 ou 3 anos. Não sabiam os traficantes que estavam trazendo também
cultura ao Brasil. Em 1889, um ano depois da Lei Áurea, foi lançado em São
Paulo o jornal A Pátria, cujo epíteto era: “Órgão dos Homens de Cor”. Logo
depois, em 1897, foi lançado o jornal O Progresso, também em São Paulo.
Detalhe: No dia 13 de maio de 1888, um menino de 7 anos era levado pelos
pais a assistir a solenidade de anúncio da Lei Áurea pela princesa Isabel
(1846-1921), no Paço Imperial, RJ. Esse menino era Lima Barreto, um preto
pobre que virou um grande escritor. Referência da nossa literatura. Um
dia, Barreto escreveria para o jornal Gazeta da Tarde, edição de 4 de maio de
1911:
Estamos em maio, o mês das flores, o mês sagrado pela poesia. Não é sem
emoção que o vejo entrar. Há em minha alma um renovamento; as ambições
desabrocham de novo e, de novo, me chegam revoadas de sonhos. Nasci sob o
seu signo, a treze, e creio que em sexta-feira; e, por isso, também à emoção
que o mês sagrado me traz, se misturam recordações da minha meninice. Agora
mesmo estou a lembrar-me que, em 1888, dias antes da data áurea, meu pai
chegou em casa e disse-me: a lei da abolição vai passar no dia de teus anos.
E de fato passou; e nós fomos esperar a assinatura no Largo do Paço. Na
minha lembrança desses acontecimentos, o edifício do antigo paço, hoje
repartição dos Telégrafos, fica muito alto, um sky-scraper; e lá de uma das
janelas eu vejo um homem que acena para o povo. Não me recordo bem se
ele falou e não sou capaz de afirmar se era mesmo o grande Patrocínio. Havia
uma imensa multidão ansiosa, com o olhar preso às janelas do velho casarão.
Afinal a lei foi assinada e, num segundo, todos aqueles milhares de pessoas
o souberam. A princesa veio à janela. Foi uma ovação: palmas, acenos com
lenço, vivas... Fazia sol e o dia estava claro. Jamais, na minha vida,
vi tanta alegria. Era geral, era total; e os dias que se seguiram, dias de
folganças e satisfação, deram-me uma visão da vida inteiramente festa e
harmonia. Houve missa campal no Campo de São Cristóvão. Eu fui também
com meu pai; mas pouco me recordo dela, a não ser lembrar-me que, ao
assisti-la, me vinha aos olhos a "Primeira Missa", de Vítor Meireles. Era
como se o Brasil tivesse sido descoberto outra vez... Houve o barulho de
bandas de música, de bombas e girândolas, indispensável aos nossos
regozijos; e houve também préstitos cívicos. Anjos despedaçando grilhões,
alegorias toscas passaram lentamente pelas ruas. Construíram-se estrados
para bailes populares; houve desfile de batalhões escolares e eu me lembro
que vi a princesa imperial, na porta da atual Prefeitura, cercada de filhos,
assistindo àquela fieira de numerosos soldados desfiar devagar. Devia ser de
tarde, ao anoitecer. Ela me parecia loura, muito loura, maternal, com
um olhar doce e apiedado. Nunca mais a vi e o imperador nunca vi, mas me
lembro dos seus carros, aqueles enormes carros dourados, puxados por quatro
cavalos, com cocheiros montados e um criado à traseira. Eu tinha então
sete anos e o cativeiro não me impressionava. Não lhe imaginava o horror;
não conhecia a sua injustiça. Eu me recordo, nunca conheci uma pessoa
escrava. Criado no Rio de Janeiro, na cidade, onde já os escravos rareavam,
faltava-me o conhecimento direto da vexatória instituição, para lhe sentir
bem os aspectos hediondos. Era bom saber se a alegria que trouxe à
cidade a lei da abolição foi geral pelo país. Havia de ser, porque já tinha
entrado na consciência de todos a injustiça originária da escravidão. Quando
fui para o colégio, um colégio público, à rua do Resende, a alegria entre a
criançada era grande. Nós não sabíamos o alcance da lei, mas a alegria
ambiente nos tinha tomado. A professora, Dona Teresa Pimentel do
Amaral, uma senhora muito inteligente, a quem muito deve o meu espírito,
creio que nos explicou a significação da coisa; mas com aquele feitio mental
de criança, só uma coisa me ficou: livre! livre! Julgava que podíamos
fazer tudo que quiséssemos; que dali em diante não havia mais limitação aos
propósitos da nossa fantasia. Parece que essa convicção era geral na
meninada, porquanto um colega meu, depois de um castigo, me disse: "Vou
dizer a papai que não quero voltar mais ao colégio. Não somos todos
livres?" Mas como ainda estamos longe de ser livres! Como ainda nos
enleamos nas teias dos preceitos, das regras e das leis! Dos jornais e
folhetos distribuídos por aquela ocasião, eu me lembro de um pequeno jornal,
publicado pelos tipógrafos da Casa Lombaerts. Estava bem impresso, tinha
umas vinhetas elzevirianas, pequenos artigos e sonetos. Desses, dois eram
dedicados a José do Patrocínio e o outro à princesa. Eu me lembro, foi a
minha primeira emoção poética a leitura dele. Intitulava-se "Princesa e Mãe"
e ainda tenho de memória um dos versos: "Houve um tempo, senhora, há
muito já passado..." São boas essas recordações; elas têm um perfume de
saudade e fazem com que sintamos a eternidade do tempo...
A princesa Isabel, ao centro, na missa de 17/5/1888
Em 1897, em Porto Alegre, era lançado O Exemplo. Esse jornal, que durou 52
números e teve 3 fases, chegou a acolher textos de brancos. Mas findou, em
1930, por falta de grana.
Os jornais abolicionistas ou não abolicionistas eram de pouca tiragem e de
curta duração, mas bastante atrevidos.
Uma vez, o poeta e contista Olavo Bilac (1865-1918), meio fulo da vida, disse
que eram muitos os jornais da sua época. Mas, acrescentou: “juntando todos,
não chegavam a 150.000/mês de exemplares”.
Em 1833 havia, em circulação, 35 jornais no País.
No dia 17 de outubro de 1915 era lançado na Capital paulista o jornal O
Menelick, editado por
Deocleciano Nascimento, com proposta de circulação mensal. A redação era na
casa dele, na rua da Graça, Bom Retiro. Durou, porém, 2 números, mas fez
história.
O título era uma homenagem ao rei da Etiópia, falecido em 1913. Para os
etiópios, esse rei era “O rei de todos os negros”.
Depois de A Pátria e O Progresso e antes de O Menelick foram editados em São
Paulo os jornais O Baluarte, O Propugnador, A Pérola, O Combate e O Patrocino.
Em 1924, ainda em São Paulo, José Correia Leite lançava à praça o jornal O
Clarim da Alvorada. Nesse jornal foi publicada a primeira coluna sobre música.
Seu colunista era Horácio da Cunha.
Era um jornal altivíssimo, como altivíssimo foi o jornal A Voz da Raça.
Era tudo por tudo contra o preconceito e tudo mais.
A Voz da Raça surgiu exatamente 100 anos depois do jornal O Homem de Cor.
Fortíssimo, claríssimo nas ideias, era esse jornal.
Muitos jornais, tabloides, surgiram depois.
Em setembro de 1931 surgiu, em São Paulo, a Frente Negra Brasileira (FNB).
Houve um racha nesse movimento e desse racha surgiu a Legião Negra.
A Legião Negra, que contou com mais ou menos 2 mil cidadãos, pegou em armas
contra Getúlio Vargas em 1932.
Importante também lembrar que a “Imprensa Negra”, definição do sociólogo
francês Roger Bastide (1898-1974), contou com jornalistas tão importantes
quanto Francisco de Paula Brito. Entre esses Luís Gama, André Rebouças e José
do Patrocínio, criadores da Confederação Abolicionista (1883).
José do Patrocínio amargou o degredo no Amazonas, no segundo governo da
República (Floriano).
Isso ocorreu pelas críticas que ele fazia ao governo que sucedeu Deodoro.
Comeu o pão que o Diabo amassou. Sofreu nos infernos.
Naquele tempo, monarquistas e republicanos se dividiam, no pensar e no agir. E
o pau continuava a comer, sem dó.
Não custa lembrar que Patrocínio começou a carreira no jornal Gazeta de
Notícia, seguiu na Gazeta da Tarde e findou criando Cidade do Rio, no qual
empregou o futuro criador da reportagem, no Brasil:
João do Rio.
Os jornais de linha moderada ou de centro-esquerda, como se diz hoje, não
mediam palavras para atacar os jornais de direita ou de direita-conservadora
como o Diário de Pernambuco, criado em 1825. Vivo até hoje.
Um dos mais intransigentes republicanos foi Quintino Bocaiúva.
Primeiras edições dos jornais O Clarim e A Voz da Raça
Em 1870, Bocaiúva reuniu contrários à Monarquia e lançou o Manifesto
Republicano no jornal A República, editado pelo paraibano Aristides Lobo
(1838-1896).
A República foi o primeiro dos grandes jornais surgidos no Rio de Janeiro. Sua
posição anti-monarquista irritou poderosos da época, que o destruíram através
de empastelamento.