O
POVO É SÁBIO
Quem
já não ouviu falar que “agosto é mês de desgosto”?
Pois
é, esta é só uma das milhares e milhares de frases carimbadas pela boca do
povo.
E
esta aqui: “quem cochicha, o rabo espicha”.
Claro,
esta serve para todos nós peregrinos do céu e da terra: “quem tem boca vai à
Roma”.
Tem
outra que diz: “quem fala muito, dá bom dia a cavalo”. Aliás, outro dia uma
amiga me contou que certa vez inventou de bater boca com uma senhora que o
tempo parece ter esquecido de levar e boca vem e boca vai, as duas findaram por
se desentenderem completamente. A amiga então lhe dirigiu essa velha frase do
folclore. Resposta:
-Você
tá pensando que eu sou o que, uma cavala?
A
minha amiga riu muito e apaziguadora apenas disse:
-Eu
estou lhe provocando só porque eu gosto de ouvir a senhora falar, e como fala!
Hoje
é o Dia Internacional do Folclore, que os países civilizados certamente
comemoram.
A
palavra folclore é uma palavra que ainda não tem nem duzentos anos. Ela surgiu
da curiosidade de um arqueólogo inglês chamado William John Thoms (1803–1885).
Um
dia, Thoms enviou uma longa carta à redação da revista de Atheneu, de Londres.
Nessa carta ele demonstrava toda a curiosidade que nutria em torno das coisas
que o povo fala e faz. Coisas que têm a ver com anedotas, histórias infantis, cantigas,
rezas mágicas, pragas e tudo mais que tem a marca anônima e indelével do povo.
Pois
bem, o conjunto de todas essas coisas vindas, surgidas, criadas, por obra e
graça do popular, têm a ver com folk-lore, de origem anglo-saxônica. Em
tradução livre e espontânea: folclore vem a ser nada mais nada menos do que ciência
do povo.
O
meu querido Luiz da Câmara Cascudo detestava a expressão folk-lore.
Cascudo
–que bela palavra como sobrenome para um ser tão importante para o Brasil- foi
um dos nossos mais importantes e o mais prolífico estudiosos do saber popular. Deixou
cerca de 150 títulos publicados, dos quais cerca de 10 ou 15 podem se achar por
aí.
Aprendi
muito com o mestre Cascudo. O folclore é de fato uma ciência de suma
importância para a compreensão da vida. Toda inteligência passa pelo saber do
povo.
Há
uns cinco séculos, outro cidadão inglês e também de nome William, no caso,
Shakespeare, inventou de passar todo seu tempo a escrever histórias; histórias.
Do povo para o povo.
Pois
bem, grosso modo, podemos afirmar que toda obra de Shakespeare é baseada no
tesouro em que se encerra a sabedoria popular. E o que fez Shakespeare, antes e
depois, fizeram outros grandes nomes da literatura e música que não morrem. Bach,
também fez isso, por exemplo.
O
folclore é tão importante que até faz parte do imaginário de mestres da música
erudita como o húngaro Béla Bartok (1865-1945).
Em
1923, Bartok decidiu compor uma obra em homenagem às cidades que deram o nome
de Budapeste. E de sua mente privilegiada saiu a Suíte das Danças. Nessa música
o autor expõe, a partir do imaginário, o que seria na sua visão, folclore.
Entre
nós, brasileiros, Tom Jobim, Zé Dantas, Luiz Gonzaga e tantos e tantos, foram
céleres beber na fonte imorredoura da sabedoria do povo.
Asa
Branca e Assum Preto são boas amostras disso, cá entre nós.
Viva
o folclore brasileiro!