ASSIS ÂNGELO: Seu irmão Toquinho tem uma parceria musical com Geraldo Vandré. A última vez que você viu Vandré foi no Carnaval de 1968. O que acha da obra desse artista?
JOÃO CARLOS PECCI: Conheci Geraldo Vandré no Guarujá, carnaval de 1968. Ele tornou-se amigo de minha turma, afável, carinhoso, divertido. Disponível em muitos momentos de vários dias. Depois o vi somente em 1976, levado à minha casa por uma amiga. Era um outro Vandré. Ficou quieto, sentado em um canto, falando pouco, escrevendo o tempo todo. Vandré é um romântico revolucionário. Polêmico, sua música é forte e transformadora. No final de 1968 ele agitou o Maracanãzinho apenas com seu violão e sua voz falando de flores e canhões. Depois saiu pelo mundo propagando o Brasil e suas raízes nordestinas.
ASSIS: Você escreveu livros sobre Vinícius de Moraes. O que mais importante você vê na obra de Vinícius?
JOÃO: Vinícius é um grande poeta e um grande músico também. Aliás, a música chegou para ele antes que a poesia propriamente dita. Sua primeira canção é de 1929, com 15 anos, “Loura ou morena”. Anterior ao seu primeiro livro, “O caminho para a distância”, de 1933. Vinícius retrata o amor e a paixão em poemas, sonetos, baladas, crônicas e peças teatrais. Acredito que o mais brilhante de sua obra são os sonetos que ele criou entre 1938 e 1940 quando esteve na Inglaterra como bolsista em Oxford. Mas o mais importante de sua carreira é o fato de ele ter transferido sua poesia para a música popular, dotando-a de leveza e simplicidade, tornando-se, ao lado de Tom Jobim, artífice da mais dignificante transformação musical que encantou e encanta o mundo até hoje: a Bossa Nova. E mais: na música, ele jamais deixou escapar o viço de sua poesia, mantendo-se sempre ao lado de parceiros jovens como Baden Powell, Carlos Lyra, Francis Hime, Edu Lobo e Toquinho.
ASSIS: João, o Brasil é um país fantástico. O que falta para o Brasil ser de fato um país feliz? Os políticos atrapalham?
JOÃO: Há tempos o brasileiro descobriu a mágica de ser feliz ludibriando a realidade. Com todo direito e criatividade. Seu divertimento é fazer piada de políticos que atravancam esse país. No Brasil, o povo vive de lampejos. Com alguns clarões mais promissores, mas sempre interrompidos. Passamos por suicídio, renúncia, ditadura, morte quase no dia da posse, dois impeachments, corrupção, um ex-presidente preso, ameaças à democracia... E sempre na esperança de que algum lampejo se transforme num brilho mais duradouro. Longe disso. Vivemos hoje um parlamentarismo disfarçado. Mas o nível dos congressistas é cada vez mais desanimador....
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