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domingo, 24 de maio de 2015

CORRIDA PARA O NADA

Assis e Tom Zé num encontro na Bienal Internacional do Livro, em um debate sobre o poeta Patativa do Assaré, promovido pelo SESC


A vida é uma eterna corrida na qual todos caem, inclusive os que alcançam o pódio.
A vida também é uma eterna magia, uma mágica a rigor sem explicação.
Darwin, depois de se debruçar por anos na sua pesquisa científica, em torno da origem humana, chegou à conclusão de algo que todos sabemos, verdadeira ou não.
Descendemos do macaco? Ou primo do macaco?
A verdade é que somos seres extremamente confusos, caóticos, perdidos em nós mesmos.
Sim, sem dúvida a vida é uma eterna corrida na qual todos perdem.
Muito já se questionou sobre de onde viemos e para onde vamos.
Há muito tempo, li o livro “Eram os deuses astronautas?”.
Fui entrevistar o autor, Erich Von Daniken, tido por muita gente como um charlatão, mas, cá pra nós, eu o achei incrível. A entrevista, longa, foi publicada num ano qualquer da década de 1970, no caderno Ilustrada, do jornal Folha de S.Paulo.

“Tom Zé é um gênio”, me disse outro dia a minha filha Clarissa. Ela tem razão, quer ver?


Tô - Tom Zé


Tô bem de baixo prá poder subir
Tô bem de cima prá poder cair
Tô dividindo prá poder sobrar
Desperdiçando prá poder faltar
Devagarinho prá poder caber
Bem de leve prá não perdoar
Tô estudando prá saber ignorar
Eu tô aqui comendo para vomitar
Eu tô te explicando
Prá te confundir
Eu tô te confundindo
Prá te esclarecer
Tô iluminado
Prá poder cegar
Tô ficando cego
Prá poder guiar
Suavemente prá poder rasgar
Olho fechado prá te ver melhor
Com alegria prá poder chorar
Desesperado prá ter paciência
Carinhoso prá poder ferir
Lentamente prá não atrasar
Atrás da vida prá poder morrer
Eu tô me despedindo prá poder voltar

À guisa de curiosidade, devo dizer que conheci Tom Zé nos meus tempos de repórter da Folha e da extinta revista Visão.
Certo dia, seguindo pauta do editor Osvaldo Mendes, fui entrevistar o iraraense Tom Zé, que estava ameaçando abandonar a carreira profissional de artista, por ninguém mais dele se lembrar; e por dele não se lembrar, naturalmente lhe faltava convites para fazer shows por aí a fora. E olha que o Tom foi um dos criadores do polêmico movimento tropicalista. Depois dessa entrevista, coincidentemente, o líder do grupo musical Talking Heads, David Byrne, encontrou num sebo do Rio do Janeiro o LP Estudando o samba. A partir daí a vida de Tom Zé teria uma grande reviravolta com a contratação do Tom para gravar nos Estados Unidos.
E pronto. Tom Zé teve o reconhecimento que tão bem Clarissa observa.

A VÓ DO SAMBA

Vó Maria é o nome de Maria das Dores Santos, que a exatamente uma semana partiu para a eternidade. Ela tinha 104 anos de idade e por muito tempo foi a companheira inseparável de um dos pioneiros do samba, Donga, de batismo Ernesto Joaquim Maria dos Santos (1890 – 1974).
Donga foi o coautor do samba Pelo Telefone, lançado em 1917.

Eu não soube de notícia nos jornais e revistas sobre o encantamento de Vó Maria. E assim, a memória musical brasileira vai pra cucuia.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

DE BAIÃO, BANDA E MORTE

No dia 22 de maio de 1946 o grupo musical  4 Azes e 1 Coringa, formado por  jovens estudantes cearenses, lançava no Rio de Janeiro o 1º baião -gênero musical- de que se tem notícia no mundo, da autoria de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.
Essa música serviu de catapulta para o futuro Rei do Baião e Humberto Teixeira chegarem à boca do povo. A partir daí Humberto deixaria em 2º plano a profissão de advogado para se tornar um dos mais aplaudidos compositores do País. Detalhe: ele compôs com Gonzaga exatas duas dezenas de pérolas musicais, como Assum Preto e Estrada do Canindé.

Você sabe como se chama a banda musical mais antiga da cidade mineira de Ubá?
Pois é, os ubaenses se alegram até hoje com a performance da Banda 22 de Maio, criada no distante ano de 1898.

O que tem a ver o baião de Gonzaga e a Banda 22 de Maio de Ubá?
Nada.
Os dois eventos -o lançamento do gênero musical baião e a fundação da corporação musical de Ubá- levam o meu pensamento pra bem longe daqui: Irã, Iraque, Pérsia, Palmira...
Hoje, 22 de maio de 2015, ouço no rádio a triste notícia que dá conta das estrepolias do terrorista Estado Islâmico acabando com tudo que há de mais importante, documentalmente falando, do tempo de Cristo e até de mesmo de antes de Cristo. Esses felas, com suas ações depredatórias e até inacreditáveis estão apagando algumas das memórias mais antigas da humanidade. E a própria humanidade.
O que será do ontem nas mãos desses celerados?
O que será do mundo árabe nas mãos desses celerados?
O que será de nós, hein?
O amanhã é hoje/ que vira ontem/ passado/ história; história que guarda tudo/ tudo o que é memória/ até o escárnio da escória.
O baião e a banda musical de Ubá veem resistindo bravamente na história que continua sendo feita hoje.
E hoje, ainda 22 de maio de 2015, do Planalto desaba sobre nós um super-pacote de maldades denominado de Ajuste Fiscal  


quarta-feira, 20 de maio de 2015

SÃO PAULO DE TODOS NÓS



Informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE dão conta de que a população do Estado de São Paulo acaba de chegar aos 43 milhões de habitantes.
Ainda, segundo o IBGE, a população da capital paulista está próxima de 15 milhões.
É muita gente.
Não sei bem por quê, ao ouvir esta notícia alinhei à música.
Por quê? Porque simples: logo imaginei a população paulistana sendo movimentada por uma impressionante e bela trilha sonora.
Durante mais de duas décadas encetei pesquisas voltada ao tema. Em miúdos: reuni mais de três mil títulos musicais que encontram na capital dos paulistas eco, inspiração e eco, nas composições desenvolvidas por cerca de sete mil autores de todas as partes do Brasil, como Chiquinha Gonzaga, Lamartine Babo, Ary Barroso, Nelson Gonçalves, Luís Gonzaga, Paulino Nogueira, Osvaldinho da Cuíca, Tom Jobim, Billy Blanco e até Geraldo Vandré.
Há uns três ou quatro anos eu contei a história da capital paulista através da música, numa bela instalação que ocupou pelo menos 350 m2 na unidade SESC do bairro de Santana. Um punhado de anos antes, numa série de palestras, abordei este mesmo tema na rede CEU - Centro Educacional Unificado. Aliás, na ocasião, eu e o baiano Gereba compusemos uma música que trata de educação e que foi gravada por Dominguinhos.
Clique: 

Isso tudo para dizer o seguinte: tem sido muito comum, e já há tempo, que amigos e colegas jornalistas me perguntam qual música elejo como a melhor já feita para a cidade de São Paulo. Não é fácil escolher entre milhares de músicas aquela que melhor retrata São Paulo e seu povo. Mas, vou aqui arriscar enumerar alguns títulos que a mim me dizem muito:
·       Rapaziada do Brás, de Alberto Marino, composta há 90 anos a se completar no correr deste 2015. Originalmente composta em modo instrumental, essa música – uma valsa-choro – ganharia letra em 1960, a pedido do argentino naturalizado Carlos Galhardo ao filho de Marino, Alberto Marino Jr..
·       Trem blindado, de João de Barro, composta no calor das emoções que provocaram a Revolução Paulista de 1932.
·       Êh, êh, São Paulo, de Alvarenga e Ranchinho, composta no começo dos 40 do século passado e que tornou-se um clássico enfatizado pelo talento dos caipiras Tonico & Tinoco.
·       Ronda, de Paulo Vanzolini, misto de compositor e cientista especializado em herpetologia, que ganhou o disco pela primeira vez em 1953 através de Inezita Barroso. Essa obra, hoje com mais de uma centena de versões, foi composta em 1946.
·       Perfil de São Paulo, de Francisco de Assis Bezerra de Menezes, que ganhou o 1º lugar no concurso musical promovido pela Prefeitura paulistana para escolha da música-símbolo do 4º centenário da cidade, fundada pelo jesuíta espanhol José de Anchieta. Detalhe: na ocasião (1954), foram inscritas pelo menos duas centenas de músicas praticamente em todos os gêneros musicais, como o dobrado Quarto Centenário, do italiano naturalizado Mário Zan e o português, também naturalizado, J. M. Alves Curiosidade: a música de Zan e Alves chegou a vender algo em torno de cinco milhões de discos e teve até uma versão em japonês, gravada em disco de 78 voltas.
·       São Paulo, de Teixeirinha.
·       Porque amo São Paulo, de Nelson Gonçalves.
·       Lampião de gás, de Zica Bergami, lançada originalmente em 1958, foi imortalizada na voz da mesma intérprete de Ronda. Curiosidade: essa música também ganhou uma versão no idioma japonês, por Kikuo Furuno.
·       São São Paulo meu amor, de Tom Zé. Essa música ganhou o IV Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, em 1968, mas o autor não recebeu o prêmio até hoje.
·       Avenida Paulista, de Eduardo Gudin. Esse samba beira à perfeição na voz de quem o lançou em disco: Vânia Bastos.
·       Estação da Luz, de Herivelto Martins e David Nasse.
·       ·       São Paulo de todos nós, de Peter Alouche e Téo Azevedo. Essa música é uma verdadeira ode à capital paulista, escrita por um imigrante egípcio que em Sampa encontrou os meios que precisava para se desenvolver como cidadão e profissional da área de engenharia elétrica. É uma espécie de hino à capital paulista, que, aliás, não tem hino oficial até hoje. Quer ouvi-la?· 


Clique:


JORNALISTAS & CIA
Hoje, quarta, o newsletter Jornalistas & Cia, no gênero, o mais antigo do País, chegou a edição número 1.000. Todos estamos de parabéns. Coisa de um ano e pouco, encerrei uma etapa profissional neste informativo direcionado especialmente aos jornalistas, ao levar à praça o último dos dezessete especiais que trataram de cultura popular. Esses especiais eram mensais. Estou com saudade. E tudo começou há vinte anos com o projeto FaxMoagem, por sugestão do decano do jornalismo brasileiro José Hamilton Ribeiro. Para lembrar aí está a reprodução do primeiro número.


sexta-feira, 15 de maio de 2015

MAIO, MÊS DE MARIA

Mês das flores, mês de alegria
De lindos cantos, mês de Maria...

Parece que estou ouvindo as irmãs cantoras Celia e Celma entoando os versos acima em homenagem à mãe de Jesus. E agora não estou só a ouvi-las, estou a lembrar meus tempos de moleque no interior da Paraíba, ouvindo contrito as ladainhas puxadas por minha avó Alcina.
A lembrança, muitas vezes, dói.
Estamos no Mês de Maria, mais precisamente no meio do Mês de Maria, quando as crianças, enlevadas, coroam a imagem da santa. É cena marcante.
Em Alagoinha, uma cidadezinha muito bonita, localizada a poucos quilômetros da capital paraibana, João Pessoa, eu costumava passar férias e também fins de semana: saía do colégio e ia pra lá, brincar de agricultor, junto com meus primos, plantando no roçado do tio José. Tempos inesquecíveis de alegria, de descompromisso, de aprendizagem, de vida.
O Mês de Maria me traz, enfim, boníssimas lembranças de um tempo que não volta mais. Mas o Mês de Maria se repete, com sua graça como se fosse ontem. É do mesmo período a queima de flores, com cânticos alusivos à mãe de Jesus e com os devotos fazendo louvação, com as crianças cantando versos assim:

que te podemos ofertar Mãe pura
com expressão de filial ternura
recebe, já que outros bens não temos

esta coroa que te oferecemos... 

Pois é, coisas anônimas, coisas do povo, que continuam na boca do povo. Falo de cultura popular. Alás, a nossa cultura popular, incluindo a música popular, é muito rica. Quando falamos de cultura popular, falamos de coisas anônimas do povo. Mas, a música popular em casos específicos tem autor e nem por isso deixa de ser popular. É popular porque cai na boca do povo. Um exemplo? O carioca Lamartine Babo entrou para a galeria dos nossos grandes compositores por compor obras incríveis como esta, Ó Maria Concebida, que ele fez aos 15 anos de idade. Clique:


quarta-feira, 13 de maio de 2015

O TEMPO PELOS OLHOS DA VIDA


Aprendemos com o tempo. Tenho aprendido, por exemplo, que podemos ver o tempo, a vida e tudo o mais de outra forma, inclusive através da porta do sol e da janela do mar, também pelo assobio do vento e o balançar das árvores. Podemos ver também pelos olhos da consciência, do saber, da inteligência. Aprendi que posso ver até com os teus olhos. Quer ver?

Eu vejo com os teus olhos
E caminho com os meus pés
É teu o meu pensamento
Eu sou quase quem tu és
Neste mundo meio torto
De Marias, Joões, Josés.

Estes teus olhos me trazem
Imagens da natureza
O movimento das águas
No fluir da correnteza
O florir da plantação
E de Deus toda a grandeza.

Sem teus olhos não veria
Rumos na escuridão
Esperança no porvir
Ao cantar uma canção
Sem teus olhos não veria
A força de uma oração.

Meu amigo Marco Haurélio, poeta erudito enrustido no seio do povo, dá um chute cá na minha canela que hoje é dia de libertação. Pois é. Nesse dia e mês, proclamou-se a abolição dos escravos. Corria o ano de 1988. Foi uma vitória e tanto para todos, inclusive brancos, até porque, nessa luta pela liberdade, engajaram-se intelectuais brancos e pretos, como Joaquim Nabuco, Luís Gama e José do Patrocínio. Foi, com certeza, o primeiro grande movimento social ocorrido neste nosso país tão desregulado pelas elites governamentais. Mas, de certo modo, as correntes da negritude estão voltando à nossa gente.

E lá vem o Marco Haurélio fechando esse texto com uma setilha:

Livres nós seremos mesmo
Quando surgir o arrebol
Em que raças, credos, povos,
Seguindo o mesmo farol,
Entenderem que pra todos
Todo dia brilha o sol.


domingo, 10 de maio de 2015

UM ANJO TORTO


Este é livro importante por ter sido escrito de modo espontâneo por uma fã declarada de Nelson Gonçalves, Onélia Setubal Rocha de Queiroga; e não, necessariamente, por especialista nos estudos da história da música popular, cujo resultado, aliás, quase sempre é chato.
Na verdade, são poucos os textos em que os autores têm a coragem de revelar histórias de ídolos com firmeza e beleza como tão bem Onélia Setubal o faz, à parte graça no escrever.
Este livro é uma contribuição importante e natural à compreensão da força que os grandes artistas da música popular imprimiam aos fãs nos tempos dos anos 40, 50...
Dito isto, lembro que o cantor Nelson Gonçalves nasceu em 1941, pois foi nesse ano que a extinta gravadora Victor o contratou. Já o gaúcho Antônio Gonçalves Sobral, nome de batismo do cantor, nasceu no dia 21 de junho de 1919, mesmo ano em que o Rei da Voz, Chico, estreava em disco gravado com marca do selo Popular do companheiro da maestrina Chiquinha Gonzaga, João, confundido até hoje como filho dela, a marcha carnavalesca Pé de Anjo, de J. B. da Silva, o Sinhô.
Dito isto digo também, e assino em baixo, que Nelson foi um grande cantor, dos melhores no campo da música popular desde Vicente Celestino, Silvio Caldas, Chico Alves, Orlando Silva, o argentino naturalizado Carlos Galhardo e outros mais.
Um grande.
No palco, Nelson era impecável.
No palco Nelson arrasava, no melhor dos sentidos.
Fora do palco, Nelson era um pecador, grosso, bruto, um mal-educado que arrasava, no pior dos sentidos.
A história de Nelson é cheia de mentiras e contradições, de desrespeito e maltrato as mulheres.
Pode?
Não pode.
Nelson não estava preparado para a vida em família, entendem seus biógrafos e amigos mais próximos, como Marco Aurélio Barroso, autor do livro A Revolta do Boêmio; e Moacir Fontana, um dos seus mais fiéis seguidores, desde sempre.
Nascido em Santana do Livramento, RS, de pais portugueses, Nelson viveu na capital paulista por muitos anos; desde os seis, quando deixou a sua cidade natal.
Em São Paulo, ele viveu vendendo jornais, engraxando sapatos e fazendo bicos etc. e tal e atendendo a clientela do bar do irmão Joaquim, Quincas, na esquina da Alameda Nothmann com a Rua São João, ali perto da Ipiranga famosa da canção do baiano Caetano.
Eu o conheci bem.
Nelson frequentou por pouco tempo os bancos escolares, e nesses bancos pouco aprendeu.
A vida foi o seu professor.
O pai, seu Manoel, não era chegado a trabalho e se fingia de cego tocando rabeca para o filho; ele, Antônio, Nico, o futuro Nelson, cantar sobre caixotes nas feiras-livres e na Praça da Sé de São Paulo.
Essa rotina durou até ele, crescido agora chamado Metralha, sair de casa por causa das provocações sacanas da mãe, dona Libânia, que o chamava de vagabundo puxado ao pai.
Tinha uns 18, 19 anos de idade Nelson quando casou e teve dois filhos biológicos.
Os únicos.
Já na rua, Nelson tentou a carreira de lutador de boxe; mas um colega de academia, no Brás, lhe capou a vontade e o fez estéril, com um golpe nas partes pudendas.
Depois disso, o seu sonho passou a ser cantor.
Com a ajuda dos amigos Oswaldo e Orlando, compositores em início de carreira, Nelson gravou um acetato para mostrar que poderia ser um grande cantor ao mandachuva da extinta Victor, Vitorio Lattari, por recomendação do vendedor de discos por atacado, Cássio Muniz.
Lattari gostou do que ouviu, mas não acreditou que fosse dele a voz que ouviu do acetato, e sem conversa o expulsou da sala, chamando-o de gago e charlatão.
Dois ou três dias depois, Nelson voltou para se explicar.

O flautista Benedito Lacerda foi a sua salvação.

sábado, 9 de maio de 2015

BRASIL, POVO E CULTURA


“Trabalhar com cultura popular em nosso país não dá, é muito difícil”, disse num tom de desabafo, triste, o cara que deu voz, sorriso e choro à cuíca: Osvaldinho da Cuíca, de batismo Osvaldo Barro, cidadão paulistano nascido no bairro do Bom Retiro num dia de Carnaval.
Osvaldinho, desencantado com o nosso meio musical, acrescentou numa conversa comigo, que está abandonando a carreira.
Ontem 8, fez dois meses que a cantora paulistana da Barra Funda , Inezita Barroso morreu. Pouco antes de eu publicar o primeiro livro a seu respeito (A menina Inezita Barroso; Editora Cortêz, 72 pags.; 2011), ela me contou que fizera uma longa e proveitosa viagem por estados nordestinos colhendo ditos, benditos, cantos populares, coisas do povo enfim. Para colher tudo isso, um tesouro, ela permaneceu na região por meses. Aliás, foi nessa ocasião que ela, pelas mãos do compositor e pianista Capiba, iniciou sua carreira profissional no mundo artístico. Conclusão dessa historieta: ela voltou com centenas e centenas de anotações e, toda feliz, se apresentou à direção da rádio e TV Record e para sua surpresa as pesquisas que fez não despertaram nenhum interesse. Decepcionada ela voltou para casa e chorou, chorou e chorou. Em seguida acendeu a lareira e por horas o fogo engoliu o motivo de sua decepção. “É duro trabalhar com cultura popular”, resumiu a mais importante cantora de sambas e do folclore brasileiros.
Hoje faz nove dias que partiu para Eternidade o cantor e apresentador de rádio e TV Jorge Paulo Nogueira, o homem do Chapéu de Couro.
Jorge foi um dos nomes mais conhecidos da televisão e da radiofonia de São Paulo a partir do começo dos anos de 1960. Ele apresentou programas na Bandeirantes, Gazeta, Record, Cultura e Globo, com muito sucesso. Por seus programas passaram Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga, Marinês, Carmélia Alves, Oswaldinho do Acordeon e todo mundo.
Você amigo/amiga, viu ou leu alguma notícia a respeito da morte do Jorge Paulo?
No correr do mês passado morreram três sanfoneiros famosos: Mangabinha, Camarão e Severo.
Severo acompanhou por muitos anos o rei do ritmo, Jackson do Pandeiro.
Você amigo/amiga, viu ou leu alguma notícia a respeito da morte desses artistas?
Pois, infelizmente, está mais do que provado que trabalhar com cultura popular no nosso país não é bolinho, não.
Certa vez, no programa São Paulo Capital Nordeste que apresentei por mais de seis anos na rádio Capital AM 1040, apareceu de supetão o maestro João Carlos Martins. Como muita gente ainda lembra, o programa era uma festa só, e transmitido ao vivo para todo o País. Comigo, naquele dia, estavam Pery Ribeiro, Claudia e o Trio Virgulino, entre outros artistas. De repente, sorrindo, o maestro pegou a sanfona do Enok e dela puxou a melodia de Ciranda, Cirandinha.
Ciranda, Cirandinha é do nosso rico folclore. E aproveito para dizer o seguinte: a cultura popular, seja de onde for, é de muita importância para a identificação de um país, pois é a cultura popular na sua essência que dá identidade a um povo, uma nação. Mas no Brasil, quem poderia entender e chancelar isso, não entende nem chancela.
E pensar que toda a obra de Shakespeare é baseada no folclore da sua terra...

Você já ouviu falar do Instituto Memória Brasil, IMB?


sábado, 2 de maio de 2015

ADEUS, JORGE PAULO

“O Jorge morreu”, disse-me na manhã de hoje, pelo telefone, a querida Nodeci Nogueira, agora viúva do meu compadre Jorge Paulo, o Chapéu de Couro.
A tragédia da perda desse grande amigo ocorreu no último dia 30. Ele foi tragado por um câncer assassino.
Jorge Paulo Nogueira foi um dos maiores cultores e incentivadores da música do Nordeste em São Paulo e no País todo, através dos programas que produziu e comandou nas televisões Globo, Bandeirantes, Cultura e Gazeta e emissoras de rádio.
A sua trajetória profissional nos meios de comunicação foi intensa.
Além de apresentador de rádio e TV, Jorge arriscou-se a navegar na praia dos compositores.
O sucesso que ele fez foi dos maiores, e sem apelação.
Todos os principais artistas do Nordeste passaram pelo palco em que ele foi estrela; mas uma estrela simples, natural, compreensiva. No seu palco coube a presença de artistas iniciantes, como Anastácia, e talentos da grandeza de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Ary Lobo, Gordurinha, Dominguinhos.
Assis, Anastácia e Jorge Paulo

Fora a sua atuação nos diversos meios de comunicação, Jorge Paulo também foi ator de cinema e da cena política nacional, como, primeiramente, vereador em São Paulo e depois Deputado Federal.
Suas campanhas políticas foram embaladas por trilhas sonoras criadas pelo Rei do Baião. Aliás, o Rei do Baião teve sua última participação no cinema no filme Chapéu de Couro, de 1978. Nesse filme, Jorge tem grande atuação.
O corpo de Jorge Paulo Nogueira foi sepultado hoje à tarde no Morumbi.
Viva Jorge Paulo! 

sexta-feira, 1 de maio de 2015

ASSIS ÂNGELO: 40 ANOS


No começo dos anos de 1970, eu ainda atuava na imprensa paraibana; no Jornal Correio da Paraíba, como editor de Local, e no rádio, de mesmo nome, como locutor noticiarista. Naquele tempo, demonstrava grande interesse pela cultura popular do nosso país. 
Outro dia mexendo no acervo que deu base à criação do Instituto Memória Brasil- IMB, deparei-me com alguns livros e discos datados - e autografados daquela época. Quer dizer: a quatro décadas iniciava a formação desse acervo, considerado um dos pouquíssimos mais importantes do Brasil em mãos de particular. 
Nos últimos anos, centenas e centenas de estudantes e pesquisadores profissionais desenvolveram teses e estudos sobre a temática da música e da cultura popular, em geral. Pelo acervo inúmeros grupos de estudantes construíram seus TCC´s, mestrados e doutorados. Já estiveram fazendo pesquisas no acervo, pessoas procedentes de vários países, entre os quais Estados Unidos, Itália, Japão e França. O acervo Assis Ângelo é constituído por cerca de 150 mil itens, incluindo discos de todos os formatos (76,78,33,45), MD´s, fitas cassetes e VHS, jornais e livros centenários, milhares de partituras e fotos de várias épocas e documentos em geral.
Historiadores como José Ramos Tiorão concluíram, no Acervo pesquisas que renderam livros. Ao visitar o acervo o brazilianista Mark Currian, encantado com o que vira, disse que iria desistir de fazer pesquisas sobre a sua especialidade: a cultura popular brasileira. Há muitas histórias amealhadas em torno do acervo. Certa vez o premeadissimo tropetista norte americano Winton Masalys me disse uma coisa curiosa: "Se você fosse norte americano, o nosso governo lhe proporcionaria todas as condições para que você pudesse desenvolver suas pesquisas". Curioso, não? Triste também.

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