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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

A SECA MATA SEM O GOVERNO VER...


O Jequitinhonha, em Minas, e todo o semiárido nordestino estão ardendo, queimando o solo, como há muito tempo ocorre, sem que as autoridades do momento tomem as providências necessárias em favor dos flagelados. A coisa está feia e isso, não sei por quê, não aparece nos jornais e revistas e no noticiário do horário nobre. Esquisito, não é? É tudo muito esquisito neste nosso País secularmente tão judiado...
Eu disse e repito: a seca no Brasil se acha como tema em tudo quanto é manifestação artística.
A crônica poética do cordelista paraibano, Leandro Gomes de Barros (1865-1918), registra momentos de grande efervescência social, especialmente no Nordeste.
Da antena aguda e sensível de Leandro não escaparam a fome, a seca, a carestia, a política. De tudo, ou de quase tudo, ele falou.
A seca de 1877 foi de lascar, muita gente sabe disso. As secas subsequentes também.
Leandro Gomes de Barros deixou para a história o seu relato sobre o miserê provocado pela ardência do Sol de 1915, que fez mortos gentes e bichos (acima a menina Francieli lê o texto...)
A seca no Ceará, de Leandro Gomes de Barros é uma obra-prima. Em 1930, a escritora cearense Raquel de Queiroz publicou o seu primeiro livro, a obra-prima O Quinze. Antes dela, em 1928, o paraibano José Américo de Almeida lançou A Bagaceira, marco do romance regionalista brasileiro. Dez anos depois foi a vez de o alagoano Graciliano Ramos tornar pública, em livro, a sua visão sobre o flagelo da seca. Isso está em Vidas Secas.
Raquel tinha 20 anos quando lançou O Quinze.
Os personagens que se movimentam nesses três livros se fundem por identificação.
Valentim é pai de Soledade, uma linda jovem desejada por um dono de engenho e seu filho. A história com sangue, suor e tristeza, tem por foco um triângulo amoroso. Falo de A Bagaceira.
O livro de Raquel traz, digamos assim, uma história central e outra paralela.
Em O Quinze, o leitor sofre e vibra com Vicente e Conceição; e com Chico Bento e seus cinco filhos, que rompem estrada comendo poeira em busca por dias melhores. No meio do caminho, um dos meninos se perde e outro morre depois de comer mandioca crua. Mandioca, ao contrário de macaxeira, mata.
Em Vidas Secas, o sofrimento provocado pelo rigor do sol é transmitido ao leitor através de Fabiano, sua mulher Sinhá Vitória, seus dois filhos sem nome ou sobrenome, a cachorra Baleia e um papagaio, que morre logo no começo da história para amenizar a fome da família de retirantes.
É tudo muito triste.
A ficção é filha da realidade terrível que aflige o povo sem posses no nordeste brasileiro e no Brasil inteiro.
A realidade parece ficção, tudo junto e misturado.
A seca de 1932 levou o poeta popular cearense Patativa do Assaré (Antonio Gonçalves da Silva, 1909-2002) a criar o tocante poema a Morte de Nanã. Poucos anos depois, o mesmo poeta publicou originalmente num folheto o poema Pau de Arara do Norte, que viria a integrar as páginas do seu primeiro livro, Inspiração Nordestina (Borsoy, 1956, RJ), sob o título A Triste Partida. Esse poema ganharia música, uma toada, que Luiz Gonzaga eternizaria na sua voz em 1964.
A Triste Partida é um clássico do cancioneiro nordestino, por muita gente considerado um hino do povo.
Um amigo meu e do chargista Fausto, Roberto Barbosa, acaba de voltar do Nordeste com lágrimas nos olhos. Disse ele não se recordar de ter visto seca tão braba como a que assola o sertão paraibano. "Em Campina Grande já nem há água para tomar banho".


O colaborador deste blog Rômulo Nóbrega confirma as palavras de Barbosa. "Não sei não, o que poderá acontecer até o fim deste mês se não chegar água às torneiras".
Já passa de um mil o número de municípios atingidos pela falta de água do céu.
Em 1985, quando mais uma seca devastava o sertão nordestino, a pedido de Fagner e Chico Buarque, o poeta Patativa compôs o poema Seca d"Água. Esse poema foi musicado por Chico e Fagner e gravado por um coral de mais de 150 vozes da música popular brasileira, incluindo Luiz Gonzaga, Chico, Fagner, Simone, Belchior, Elba Ramalho, João do Vale, Gonzaguinha, Fafá de Belém, Gal Costa, Ney Matogrosso...Esse disco, um compacto, foi vendido e o dinheiro disso resultante vertido para os flagelados.


NA SANGRIA O RIO SÃO FRANCISCO GEME




A história é incrível, tanto a real quanto a fantástica.
Os negros de África trouxeram para o Brasil a lenda de Iemanjá, rainha dos mares, oceanos... Segundo a lenda, Iemanjá salgou as águas do mar e do mar se fez dona.
Desde menino, ouvi dizer que no mar tem sereia...
Iemanjá é uma divindade, de acordo com a lenda, nascida no Rio Ogum.
Iara é a rainha, é a dona das águas doces; das águas de todos os rios...
O mundo é fantástico, incluindo o real em que vivemos.
A divindade que habita as profundezas do rio São Francisco atende pelo nome de Irati.
Irati, segundo a imaginação geral dos ribeirinhos do São Francisco era uma índia; uma índia apaixonadíssima por seu índio que um dia, de arco e flexa, saiu da oca para enfrentar o inimigo branco, invasor...
O Rio São Francisco nasce na Serra da Canastra, em Minas.
O Rio São Francisco é comprido e largo, muito largo, e na origem com águas da quantidade de um mar.
O Rio São Francisco corta a Bahia, faz fronteira com Pernambuco e põe limites em Sergipe e Alagoas. Tem mais de 2.800.000 quilômetros. Bondoso, receptivo, atende diretamente a mais de doze milhões de pessoas.
O Rio São Francisco foi descoberto em 1501, pelo navegador aristocrata Américo Vespúcio.
O Rio São Francisco está sofrendo, há muito tempo. A razão do seu sofrimento somos nós, chamados de humanos.
Desde o começo do ano de 1990 que ele, o rio, está sendo demasiadamente violentado pelo homens que o querem minguado, dividido, judiado... Tudo isso em nome do povo, dos Estados de Pernambuco, Paraíba...
A primeira grande seca de que se tem notícia ocorrida no Brasil data do começo do século XVIII.
Entre os anos de 1876 e 79, a seca no Nordeste fez pedra chorar, de tão grande. Num momento qualquer desse período, um agente do governo cearense procurou o imperador Dom Pedro II para lhe propor a transposição das águas do Velho Chico. O imperador, depois de ir pessoalmente ao Ceará e constatar com os próprios olhos a desgraça, disse que isso não era possível. Detalhe: por esse mesmo tempo, Dom Pedro jurara que venderia até a última pérola da Coroa para que a situação dos flagelados fosse minimizada...
Depois da seca de 1877, veio a de 1915.
A seca de 1915 também matou muita gente e muito bicho no Nordeste; de novo no Ceará. Dessa vez, lá, foram construídos até campos de concentração.
E se olharmos com olhos de quem vê, veremos que nada mudou no Brasil; no tocante, especialmente, à seca.
Os problemas do nosso País são os mesmos do passado agigantados no presente.
Deus do Céu, como erramos na escolha dos nossos governantes!
O Rio São Francisco é conhecido desde séculos como o Velho Chico.
Como o Velho Chico, o rio tem despertado a atenção de todo mundo.
E no seu silêncio, a tragédia se consome.
Mais de 15 bilhões de reais já foram desviados em seu nome. E outro dia ouvi a notícia de que serão necessários mais pelo menos 10 bilhões para que ele seja sangrado para  Pernambuco, Paraíba...
O Velho Chico virou tema de livro, de estudos. O seu nome é cantado em verso e prosa, por repentistas e poetas de bancada. Já virou nome de filme e telenovela.
O Velho Chico está sofrendo (eu constatei estando lá, acima).
Eu gostaria de saber a opinião de Guimarães Rosa sobre a violência, mais uma, que está se praticando contra esse fabuloso rio, um dos maiores do mundo.
Já que isso não é possível, na minha imaginação eu perguntaria a Diadorim... Melhor, imagino o valente Diadorim convidando Riobaldo a, com ele, atravessar o São Francisco numa canoa antes de o São Francisco se acabar.
Ah! Rômulo Nóbrega acaba de me mandar as fotos que ilustram esse texto. São fotos feitas no município pernambucano de Sertânia, terra do meua migo cordelista, radialista, Luiz Wilson. O governo promete às vítimas da seca as águas do rio São Francisco ainda para este mês. Veja as fotos. Vc acredita?
Ouça, agora, meus amigos Valdir Teles e Sebastião da Silva cantando a modo próprio...




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