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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

FINALMENTE, CINZAS



Em 1967, Roberto Carlos defendeu no III Festival da Música Popular Brasileira, promovida pela TV Record, o samba-canção Maria Carnaval e Cinzas. Essa música, de Luiz Carlos Paraná (1932-1970), foi classificada em 5º lugar. Desse festival também participaram Erasmo Carlos e Ronnie Von, considerados até hoje apolíticos. Maria Carnaval e Cinzas começava assim:
Nasceu Maria quando a folia
Perdia a noite, ganhava o dia
Foi fantasia seu enxoval
Nasceu Maria no Carnaval...

E terminava com a personagem morrendo como morrem as quartas-feiras de cinzas:

Morreu Maria quando a folia
Na quarta-feira também morria
E foi de cinzas seu enxoval
Viveu apenas um Carnaval...

O Carnaval é o maior evento de público do Brasil. Suas origens são remotas. Chegou ao país nos fins dos séculos XVI. Entrudo era a marca dessa festa que o tempo findou por abolir. Era violento. Diz-se que o Imperador Pedro I e o filho que o sucedeu divertiam-se com isso.
O Entrudo foi proibido pela polícia no meio da segunda parte do século 19.
Não houve Carnaval em 1894, como registrou em crônica o escritor Machado de Assis (1839-1908). Clique: https://culturadetravesseiro.blogspot.com/2011/03/cronicas-de-machado-de-assis.html
O Carnaval que conhecemos começou a ganhar forma na virada do século XIV para o século XX, com a marchinha O Abre Alas (1899).
A primeira escola de samba, ainda não na forma que conhecemos, chamou-se Deixe-a Falar (1928).
São milhares as músicas que falam de Carnaval.
Em 1965, o cantor e compositor paraibano Geraldo Vandré lançou no seu 2º LP (Hora de Lutar; Continental), a marchinha Sonho de um Carnaval (Chico Buarque).
Seis anos depois, foi a vez de Carlos Lyra e Vinícius de Moraes comporem Marcha da Quarta-feira de Cinzas. Ouça: https://youtu.be/_ujIZja_rIU
No acervo do Instituto Memória Brasil, IMB, acham-se milhares de músicas feitas e gravadas para o Carnaval, incluindo as três citadas neste texto.

QUARESMA

A Quaresma começa hoje. Próximo dia 12 de abril, começa a Páscoa. Esse período é para os católicos repensarem a vida, a partir da tortura, morte e ressurreição de Cristo.

VANDRÉ, EU E CAMÕES

A naturalidade a mim apresentada ontem 25 por Geraldo Vandré leva-me à compartilhar com vocês, meus amigos, minhas amigas a informação que dei sobre a tarefa que desenvolvi adaptando o belíssimo texto Os Lusíadas, de Camões, para Canto e Cordel. São mais de mil versos em cerca de 170 estrofes de sextilhas. Surpreso, ele perguntou: "Você fez isso?". Não só, acrescentei, essa é a única adaptação do mundo desde 450 anos feita por alguém no mundo; E esse alguém, um cego. Prazer. Um trecho, bem pequenininho:

Um dia Júpiter chamou
Seus pares pra conversar
Queria deles saber
Que posição adotar
Sobre certa viagem
de um certo homem no mar

Deuses foram chegando
Decididos a escutar
Decididos a entender
O que Júpiter tinha a falar
Seria sobre a viagem 
Daquele homem no mar?

Ouviu-se um zum, zum, zum
Eram Deuses a murmurar:
Quem seria esse valente 
decidido a enfrentar
Os mau humores do tempo
E as estranhezas do mar?

VANDRÉ AGORA É FOLCLORE

O Grêmio Recreativo Cultural Social Escola de Samba Águia de Ouro insistiu durante 44 anos pra faturar o primeiro campeonato do Carnaval paulistano. Isso aconteceu ontem 25, no final da tarde.
Geraldo Vandré, por sua vez, precisou de menos de dez anos (1964-1968) para firmar-se na história da nossa música e ter sua obra como referência folclórica. Isso não é pouco!
O potiguar Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), o mais ilustre estudioso da nossa cultura popular, dizia ser preciso que se passassem pelo menos 100 anos para que um causo, um conto, uma anedota ou uma música caísse totalmente no gosto popular e fizesse parte do mágico tapete do folclore. Dizia também que, de certo modo, cada um de nós já nasce mestre. Ouça:


Em dezembro de 1978 entrevistei Cascudo em Natal. A entrevista foi publicada no dia 7 de janeiro em 1979 no suplemento Folhetim, do paulistano Folha de S.Paulo. Leia: O VELHO QUE SABE TUDO
Logo após o anúncio que encheu de alegria os integrantes e torcedores da escola samba Águia de Ouro, perguntei a Vandré o que ele tinha a dizer a respeito. "Foi muito bom, mereceu a vitória", ele disse. E disse isso com alegria, com muita alegria, tanto que me surpreendeu sobre maneira. Lembrei-lhe que o enredo (O poder do saber – Se saber é poder… quem sabe faz a hora, não espera  acontecer) não o citam nominalmente. Resposta: "E precisava?".


Conheço Geraldo Vandré há mais de 40 anos e nunca o vi tão de bem com a vida. Feliz, mesmo.
O modo natural de Vandré, fez-me lembrar o cientista e compositor Paulo Vanzolini (1924-2013).
Um dia fim de tarde Vanzo, como os mais próximos chamavam Vanzolini, telefona dizendo que tem uma novidade e que essa novidade ele gostaria de contar pessoalmente. E lá fui eu ao museu de Zoologia da USP para ouvir o amigo, ele era diretor do museu. À vontade, risonho, parecendo criança, ele mostrou-me o dicionário Aurélio aberto na página em que era citado. A citação deveu-se a Volta por Cima, composição gravada originalmente pelo mineiro Noite Lustrada, em 1963.

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