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terça-feira, 30 de janeiro de 2018

ALÔ BRASIL, TINHORÃO ESTÁ VIVO!





Garimpeiro de bom quilate, José Ramos Tinhorão é o que sempre mostrou ser: um brasileiro de valor.
Detonado pela esquerda e pela direita, Tinhorão chega aos 90 anos de idade incólume e lépido.
Advogado e jornalista, Tinhorão sempre soube separar o joio do trigo. Nunca defendeu causa alguma em nenhum tribunal, mas como jornalista marcou profundamente a vida brasileira, especialmente a cultural. Detalhe: Nunca deixou de dizer o que quis, seja no rádio, na tevê ou nos seus escritos em jornais e revistas.
Tinhorão iniciou a vida profissional de jornalista no extinto Diário Carioca, do Rio de Janeiro, no começo dos anos de 1950. No fim dessa década, ele criou o que ficou conhecido como "texto-legenda". Texto-legenda é o texto feito a partir de uma fotografia, que se baseia entre o texto jornalístico propriamente dito e o texto poético, fora de pauta.
Textos-legenda de Tinhorão chegaram a ter autoria atribuída ao poeta maranhense Ferreira Gullar.
Até hoje, Tinhorão é considerado um dos melhores textos do jornalismo brasileiro.
No Caderno B do Jornal do Brasil, Tinhorão assinou a mais importante coluna semanal sobre música popular brasileira, intitulada Primeiras Aulas de Samba, que assinava com seu colega Sérgio Cabral.
No campo da música popular, Tinhorão tornou-se a maior referência. A sua obra chega a casa dos 30 títulos, metade deles lançada ou relançada pela Editora 34.
José Ramos Tinhorão, santista nascido no dia 7 de fevereiro de 1928, meteu-se fundo pelas veredas da história, da cultura popular brasileira. Entrevistou quase todos os grandes criadores de música dos últimos 60 anos, entre os quais Donga, Pixinguinha, João da Bahiana, Ismael Silva, Almirante, Luiz Gonzaga e Nelson Cavaquinho, que, aliás, abriu a coluna Música Popular assinada por Tinhorão a partir de Janeiro de 1974, no Caderno B do Jornal do Brasil. 
Os bossanovistas só faltaram perder o juízo por causa dos textos concretos publicados por Tinhorão.
O nome de batismo de Tinhorão é José Ramos, só José Ramos. Tinhorão foi um "sobrenome" dado por um dos seus chefes de redação, no Rio. No caso, nada a ver com a venenosa planta que carrega esse nome.
Tom Jobim detestava Tinhorão. Diz a lenda que Jobim teria comprado um vaso com essa planta e sobre ela fazia xixi toda a vez que chegava em casa meio chumbado.
Tem uma música que Elis Regina gravou, Querelas do Brasil, composta depois que Tinhorão disse que o melhor de João Bosco era Aldir Blanc, seu parceiro.


Tinhorão por Nair de Teffé

Há muito disse me disse sobre José Ramos Tinhorão. Sobre ele a jornalista, poeta e professora universitária paulistana, Elizabeth Lorenzotti escreveu Tinhorão o Legendário, publicado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo em 2010. Nesse livro há histórias do Arco da Velha e até a reprodução de uma caricatura de Tinhorão feita por Nair de Teffé, Rian, a primeira caricaturista do Brasil (acima). Não custa lembrar que Nair, filha do Barão de Teffé foi a mulher do marechal presidente Hermes da Fonseca (1910-1914). Detalhe: Em março de 1977, Tinhorão descobriu Nair de Tefé morando sozinha nos arrabaldes do Rio de Janeiro. Como repórter deu um furo de reportagem nacional.

Muito já se escreveu sobre Tinhorão e muito ainda se escreverá sobre ele. Em resumo: Tinhorão é duro na queda, é árvore que não cai, que sobrevive a todas as intempéries. A propósito, o cartunista Fausto o interpreta de modo perfeito, acima.
Não custa dizer, e é sempre importante dizer, que a obra de Tinhorão é a mais completa no campo da pesquisa musical feita até hoje no País. Aliás, é impossível alguém escrever sobre música popular brasileira sem citá-lo. Ah! uma curiosidade: no filme Bonitinha mas ordinária, de Nelson Rodrigues, Tinhorão é personagem... Agora pura provocação: ouçam o grupo musical Filarmônica de Passárgada, interpretando a saborosa canção Enfartando Tinhorão.



"Acho que estou ficando velho", disse-me outro dia ao queixar-se de uma dorzinha nas costas. Em outra ocasião disse-me "ficar velho é uma merda".

Digam o que disserem de Tinhorão, mas a sua obra é inconteste, de valor imensurável. Tinhorão é o mais importante e longevo estudioso da cultura popular brasileira. Nenhum estudioso dessa cultura viveu tanto para mostrar a grandeza do país através da sua história.
Cadê os repórteres de revistas, jornais e tevês que não o entrevistam? Ele tem ainda muito o que contar.


COMEMORAÇÃO


No próximo dia 10, a partir das 15 hs, amigos e "inimigos" de Tinhorão vão se reunir no Bar do Raí, ali na Vila Buarque, centro paulistano. A ideia é brindar os 90 anos de idade do incansável e polêmico José Ramos Tinhorão, vamos? O dia 10 é um sábado de carnaval.


quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

LULA É FOGO NA ROUPA!


Fogo Pagô é o título de um forró supimpa do eico repertório do saudoso paraibano Sivuca. Fogo Pagô também é o nome de um passarinho que bate asas no Nordeste de meu Deus do Céu (acima).
Fogo é fogo.
No Nordeste tem uma expressão que guardo na memória desde os meus tempos de criança. Essa expressão serve prá definir um sujeito bravo, temido. Esse temor provocado pelo cabra pode ser contínuo ou passageiro. "Fulano está com fogo na roupa", ou "Fulano tem fogo na roupa". Seria o caso de dizer: "Lula está com fogo na roupa".
O Brasil todo e boa parte do mundo está falando de Lula, do bater do martelo dos juízes de Porto Alegre, que resultou em confirmação de sentença do juiz de Curitiba, acrescida de mais quase 3 anos de condenação.
Perguntei a uma amiga que mora no Chile o que pensam os chilenos do brasileiro Lula: pensam que Lula está sendo perseguido por ser pobre".
Há muito tempo o Brasil é conhecido mundo afora por suas mazelas.
Em dezembro de 2016 a febre amarela voltou a mostrar que "tem fogo na roupa". Isso foi em Minas. E o surto está aí levando milhares, milhões de pessoas a formar filas em busca de vacinação. Muita briga, muito desentendimento com a presença da polícia etc. 
Nos jornais, hoje, a notícia de gente matando macaco com medo da febre amarela. Um Horror! Macaco não transmite a febre. Macaco é vítima do mosquito que transmite a febre.
Hora dessa falarei de povo, da formação do povo etc.
A febre amarela mostrou pela primeira vez a sua cara em 1685. E mostrou a sua cara feia que nem o bute. Primeiro em Recife, Olinda e na Ilha de Itamaracá, estendendo-se a Goiânia e Salvador.
No capítulo 32 do belíssimo romance Esaú e Jacó, o autor Machado de Assis faz referência a febre que muitos milhares de vítimas tem feito no correr do tempo. Oswaldo Cruz, o grande sanitarista criou no começo do século passado vacina para o mal, mas ele está aí, vivo que nem Lula.




SÃO PAULO, 464 ANOS



Entre as milhares de músicas feitas em homenagem a São paulo, além de Sampa, dá para destacar Perfil de São Paulo, do paulista Francisco de Assis Bezerra de Menezes, que o carioca Sílvio Caldas lançou em 1954. De destaque também são as composições de Nelson Gonçalves e  do gaúcho Teixeirinha, ouçam, pela ordem:








terça-feira, 23 de janeiro de 2018

SÃO PAULO, SECA E NORDESTE

Os estrangeiros começaram a chegar no Brasil em 1898, século 15. Foi um espanhol a mando do rei português Dom João III. Em 1500, foi a vez de Álvares Cabral aportar na Costa baiana, e tudo virou um inferno. Os índios foram dominados e de África começaram a chegar os escravos. Já em 1540, o inferno tropical estava posto.
São nove os Estados que formam o Nordeste, ocupando cerca de 1,5 milhão de Km².
E aí veio, fugido de Bonaparte, o gorducho imperador Dom João VI, que aqui botou banca. E Dom Pedro I e Dom Pedro II e o fim da monarquia com o alagoano Marechal Fonseca, em 1889.
Em 1822, foi dado o grito de independência ali a beira do hoje poluído riacho do Ipiranga.
Em 1922, o presidente da república era o paraibano Epitácio Pessoa, que vinha a ser parente do cidadão que desde 1930 dá nome à Capital paraibana.
Em 1554, os jesuítas Nóbrega e Anchieta demarcaram e fundaram a cidade dos paulistanos.
O Nordeste sempre foi a região mais explorada, agredida e abandonada do País, desde sempre.
Muitos movimentos revolucionários e guerras marcaram a vida nordestina.
Uma vez os holandeses invadiram o Rio Grande do Norte e judiaram do povo de todas as formas. Muita gente morreu na ocasião.
Há pouco o Papa Francisco santificou de uma vez só um grupo de 30 nordestinos do Rio Grande do Norte.
Há sete anos o Nordeste todo pena com a seca que bate e abate bichos e gente.
Dos 400 e tantos açudes e barragens do Nordeste, cento e poucos estão completamente vazios com o solo esturricado. E o governo federal nem, nem. Igualzinho ao comportamento dos governos estaduais.

O grande cidadão musical Luiz Gonzaga, ciente e lamentoso das condições precárias do povo da região que deu Bárbara de Alencar, avó do escritor cearense José de Alencar, gravou uma obra prima da sua lavra: Sertão Sofredor:

A construção do Município de São Paulo começou no Pátio do Colégio, ali nas proximidades da Sé.
No correr de mais de 20 anos, desenvolvi uma pesquisa que resultou em mais de 3.000 títulos musicais que tratam, de uma forma ou de outra, desse município, que se transformou no quinto maior do mundo em termos populacionais e industriais, e nesse município, que tem o mesmo tamanho territorial do Nordeste se acham brasileiros de todos os recantos do país.

Os mais de 3.000 títulos musicais que colhi durante a pesquisa são de autoria de mais ou menos 7.000 compositores. Para ilustrar ouçam os links abaixo:




LULA

Do que mais se fala hoje é sobre o destino do ex-presidente da república Luís Inácio Lula da Silva: a sentença que recebeu do juiz Sérgio Moro será ou não confirmada pelos juízes de Porto Alegre? Podia-se falar sobre a seca do Nordeste, e não só sobre a seca do Nordeste, mas sobre a solução para os tantos problemas que afligem o país, não é mesmo? Sete anos de seca não é bolinho... O amigo paraense José Pinto, do alto dos seus 88 anos de idade a se completarem no próximo dia 27 de novembro, fala sobre isso, sobre o abandono do Nordeste brasileiro. E resume: "quem pecou que pague os pecados, e seja quem for".

domingo, 21 de janeiro de 2018

BRASIL, UM PAÍS DA IGNORÂNCIA

Assis  e Cortez (D) no Instituto Memória Brasil (IMB)
O potiguar de Currais Novos, José Cortez, fundador da Cortez Editora, foi atingido pela crise econômica que se estabeleceu no Brasil gravemente há um ano e pouco.Perdeu a livraria, mas não a esperança de produzir e viver. Ele é daquelas pessoas que bebem no poço da esperança, que nunca seca.Felizmente.
Pois bem, como empresário do ramo editorial  no País, Cortez é direto: "as pessoas estão cada vez mais lendo menos livros".
O tema vem à tona, por uma razão pura e simples: fica-se hoje mais tempo diante da telinha da TV e do computador , incluindo celular, segundo pesquisas divulgadas por aí afora.
Os sinais de ignorância são visíveis, não é mesmo?
O Enem 2017 registrou 4, 72 milhões de candidatos. Desse total 309.127  receberam  zero daqueles enormes, grandões. Do total de inscritos, apenas 53 candidatos receberam a nota máxima de 1000 pontos.Vejam: apenas 53!
O tema da redação que resultou em tantos milhares de zero, foi oportuníssimo por se tratar de interesse geral e social. O tema foi: Desafio para a formação educacional de surdos no Brasil.
O total de pessoas que apresentam algum tipo de deficiência no nosso país é, segundo dados da última pesquisa IBGE (2010), chega a casa de 40 milhões. Nessa mesma pesquisa, foram identificados aproximadamente  9 milhões de surdos moderados e total.
Eu digo que o tema Enem 2017 foi oportuno por uma razão:para chamar atenção do grave problema social que são as deficiências nas pessoas do Brasil e do mundo.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), garante que há 42 milhões de surdos nos 4 cantos do nosso planetinha que tanto  judiamos.
Vivemos uma tragédia, e não uma tragédia grega. A nossa tragédia é uma tragédia brasileira, brasileiríssima.
A tragédia que vivemos é total, vai desde o desemprego à falta de especialização profissional. E aqui nem me refiro aos deficientes auditivos, visuais, etc.. Convivemos também com mais de 12 mihões de analfabetos totais, ou seja, o cidadão que não é cidadão, e nem sabe o que é isso, tampouco distingue um "o" de roda de caminhão.E tem mais, temos o analfabeto funcional, cujo total chega a 30 milhões. Você sabe o que é um analfabeto funcional? é aquele que até consegue obter um diploma universitário, mas é incapaz de raciocinar sobre um texto.
O paulista de Taubaté, Monteiro Lobato (1882-1948) dizia que " quem lê mais, sabe mais" e que " um país se faz com homens e livros". E se lemos tão pouco e nos interessamos tão pouco pela cultura, pelos rumos do país que nascemos, que país podemos ter amanhã?
O poço da ignorância em que vivemos é profundíssimo ou não é?
O austríaco Stefan Zweg (1881-1946), que morreu em Petrópolis- RJ, escreveu um livro bastante interessante: Brasil, um país do futuro, mas essa é outra história.


A CUÍCA QUE FALA, CHORA E RI É DE OSVALDINHO

Osvaldinho da Cuíca, André Domingues e Assis Ãngelo na verdadeira rede social.

Todo tempo é tempo de falar ou escrever sobre os artistas incluindo cantores e compositores que engrandecem a terra brasileira. E temos muito que plantaram e colheram respeito traduzido em homenagens. Foram-se já muitos, mas muitos outros ainda permanecem plantando obras na história do Brasil. Do Brasil musical, do Brasil cultural, do Brasil do branco, do preto, do pobre, das gentes.
Osvaldo Barro, que o Brasil e boa parte do mundo conhece pelo diminutivo de Osvaldinho com o sobrenome do instrumento que reinventou, a cuíca, é um dos grandes artistas que enobrecem a cultura popular. Ele é paulistano, do bairro do Bom Retiro, nascido num dia de carnaval em 1940. E corintiano!
E você sabe, meu amigo, minha amiga, quem é André Domingues?
André Domingues é pesquisador da cultura musical popular, paulistano, que hoje vive numa cidadezinha baiana bem longe da capital Salvador, chamada Teixeira de Freitas.
Em 2009 Domingues, junto com Osvaldinho, publicou um livro de extrema importância para a compreensão do samba fincado em São Paulo, do rural ao batuque. Esse livro tem por título Batuqueiros da Paulicéia.


Osvaldinho da cuíca enveredou pelo mundo do samba ali pelos finais da década de 1950. Ele já gravou com todo mundo, dos bons aos melhores sambistas. E não só de São Paulo. Fora a cuíca que reinventou, ele tem centenas de composições gravadas por meio mundo. Só de sambas de enredo puxados na avenida ele tem uns 30. E há pouco pôs na praça um disco com 11 faixas reunindo alguns desses sambas. Esse disco tem como título Sambas Enredo: História de Uma Vida. Nessa coletânea há verdadeiras pérolas como Na Arca de Noel Rosa, faixa 4 e Cuíca de Ouro, faixa 10, de R. do Cavaco, Thiago, Juninho e Nunes, em homenagem ao próprio Osvaldinho. Em 2008 a Escola de Samba Vai-Vai ganhou o carnaval com Acorda Brasil, faixa 8.





Em Teixeira de Freitas, André Domingues dá aulas de artes na Universidade. Ele já anda por lá há bons pares de anos e não pensa voltar à Paulicéia. Porém, anteontem, 19, ele esteve comigo cá no bairro de Campos Elíseos onde moro, ele e Osvaldinho. Foi um papo e tanto, que durou até o começo da madrugada de ontem. O registro desse belíssimo encontro pode ser conferido aí em cima, numa rede bem melhor do que a rede social que balança por aí que em vez de ligar, desliga as pessoas. Desliga, envenena e aliena.
E pra fechar, que tal ouvir Osvaldinho num solo de cuíca? A cuíca de Osvaldinho fala o que tem de falar, ri quando acha que deve e chora pela loucura em que está se transformando a política nacional. A propósito, Osvaldinho tem andado decepcionado e triste como o quê. Tem dado muito chute em pau de barraca.





ANDRÉ DOMINGUES


André Domingues é crítico musical e hoje leciona no curso de Artes da Universidade Federal do Sul da Bahia, na cidade de Teixeira de Freitas, no extremo sul do estado. Antes mesmo de se graduar em Filosofia, pela Unicamp, começou a publicar críticas e reportagens sobre música popular na imprensa paulista. Essa paixão foi levada para a academia nas posteriores pesquisas de mestrado e doutorado em História Social, na USP, dedicadas a temas como a obra de Dorival Caymmi ou a formação de vanguardas populares na MPB. É autor dos livros Os 100 Melhores CDs da MPB (Sá Editora, 2004) e Caymmi Sem Folclore (Editora Barcarolla, 2009), além de assinar com o mestre Osvaldinho da Cuíca o livro Batuqueiros da Paulicéia (Editora Barcarolla, 2009), de que tratou este blog.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

LAMPIÃO E JÔ SOARES

Na foto eu e a cantora Anastácia no Programa Onze e meia, do Jô Soares, no SBT, no início dos anos 90.

Um dos mais versáteis brasileiros acaba de completar 80 anos de idade. Refiro-me ao ator, escritor, humorista, produtor e diretor de teatro carioca Jô Soares, de batismo José Soares. Ele nasceu no dia 16 de Janeiro de 1938, seis meses antes de a polícia sergipana dar cabo ao pernambucano Virgulino Ferreira da Silva, Lampião.
O que tem a ver Jô Soares com Lampião? A rigor, nada. Mas pensando bem, tem.
Jô, como o seu colega cearense Chico Anysio (1931-2012), criou um monte de personagens e alegrou o Brasil inteiro, via teatro, cinema e tevê. Lampião, por sua vez, não criou personagens, matou-os, e não na ficção, mas na vida real.
Na Paraíba, minha terra, quem faz muita coisa é considerado macho e dizia-se: Lampião é cabra macho. Nessa linha são machos Jô Soares, Chico Anysio e Lampião.
Além do mais, Jô demonstrou várias vezes o seu interesse pela história do cangaço, entrevistando por exemplo a ex-cangaceira Ilda Ribeiro da Silva, Sila (1925-2005). 
Tergiversei???
Bem, o Brasil está cheio de cabras machos: Machado de Assis, José de Alencar, Monteiro Lobato, Santos Dumont, Glauber Rocha,  Dorival Caymmi, Luiz Gonzaga, Carlos Gomes, Villa-Lobos, Di Cavalcanti...
Viva Jô Soares!


domingo, 14 de janeiro de 2018

SAUDADE É BOA E DOCE QUE NEM RAPADURA, MAS DÓI!


"Mas rapaz que título legal, curioso... Esse livro deve ser muito bom."
Pois é, a fala acima aspeada é do meu amigo potiguar e editor festejado José Cortez referindo-se ao novo livro do querido cearense e cordelista espetacular Klévisson Viana,  Miolo da Rapadura.  Eu já li esse livro, melhor: Lúcia leu prá mim. E gostei muito. E o Tinhorão também.
Miolo da Rapadura: esse título emocionou Cortez "eu não ouvia essa expressão há mais de setenta anos, trouxe de volta minha infância lá no sertão do Rio Grande do Norte..."
"Esse Klévissom é um danado!" Diz de novo Cortez do auto dos seus 81 anos de idade completados em novembro passado, levando para si um exemplar extra que o Klévisson me enviou.
Bem, mas não é sobre esse assunto que eu agora quero falar. Aliás, porque já falei em texto anterior. E ontem eu disse que hoje falaria algo sobre saudade, certo?
O meu peito é um cofre que guarda bem guardado um tesouro de memórias, de histórias, de coisas que vivi e que certamente não viverei mais.
Passado é história, e como história, lembrança.
Lembrança é uma palavra que nos remete à saudade.
Saudade é uma palavra exclusiva da língua portuguesa, embora haja quem diga que suas origens levam ao mundo árabe. Não acho.
A palavra saudade é oriunda mesmo dos portugueses.
Nenhuma língua traduz o sentimento da saudade tão bem como a palavra inventada pelos portugueses. É uma palavra difícil de traduzir. Na verdade, é uma das seis ou sete palavras mais difíceis de traduzir. Os espanhóis tentaram isso, os alemães também, os italianos...
O latim fala algo como solitude, soledade, solidad, solidão. Isso tudo, misturando tudo dá em saudade. Saudade de alguém que parte e não volta mais, de alguém que morre, de alguém querido que simplesmente some, desaparece, que não dá notícia.
A gente sente saudade de uma alegria passada, de um momento bom. Por aí. Não dá é prá sentir saudade da dor, não é mesmo?
No tesouro que guardo no peito tem nomes como Seu Severino e Dona Maria Anunciada, meus pais. Não convivi muito tempo com eles, Seu Severino partiu com 33 anos de idade e dona Maria aos 27. Na somatória de idade, 60, cinco a mais do que a soma de anos que viveram.
No meu cofre de saudade tem Dona Alcina, minha avó, e Dona Benedita que mostrou-me os primeiros caminhos que eu deveria trilhar nessa vida doida, mostrou-me também as primeiras letras.
Tem muita gente bonita no cofre da saudade que guardo comido: padre Camilo, holandês que me ensinou português, e padre  Eugênio que foi o primeiro padre a casar no Brasil, virando ex-pare. Com eles convivi no Colégio de onde eu poderia ter  tomado gosto e virado padre, mas como a vida nos traz surpresas... virei jornalista, depois de estudar música e artes plásticas em João Pessoa, PB.
São muitas as lembranças que trago comigo e que me fazem bem.
Uma vez perguntei ao paulista compositor Adoniran Barbosa o que era saudade e ele me respondeu:
"É um bichinho que rói, rói, rói o nosso coração."
E prá findar ouvi de Cortez uma frase  que vem se somar ao que está escrito aí:
"Saudade é a ausência de algo ou alguém que você gosta".
O tema saudade é cantado e decantada em verso e prosa por autores da língua portuguesa especialmente do Brasil, eruditos e populares. Antonio Pereira, por exemplo, mais conhecido como O Poeta da Saudade escreveu estes versos:

Saudade é um parafuso
Que na rosca quando cai,
Só entra se for torcendo,
Porque batendo num vai
E enferrujando dentro
Nem distorcendo num sai.

Saudade tem cinco fios
Puxados à eletricidade,
Um na alma, outro no peito,
Um amor, outro amizade,
O derradeiro, a lembrança
Dos dias da mocidade.

Saudade é como a resina,
No amor de quem padece,
O pau que resina muito
Quando não morre adoece.
É como quem tem saudade
Não morre, mas não esquece.

Adão me deu dez saudades
Eu lhe disse: muito bem!
Dê nove, fique com uma
Que todas não lhe convêm.
Mas eu caí na besteira,
Não reparti com ninguém.

Quem quiser plantar saudade
Primeiro escolha a semente
Depois plante em lugar seco
Onde brota o sol mais quente
Pois se plantar no molhado
Quando nascer mata a gente.

                         Antônio Pereira







sábado, 13 de janeiro de 2018

JANEIRO FORA DO EIXO

Em quase todo o mundo, especialmente no Brasil, o mês de janeiro é o mês que marca o início do calendário gregoriano, inventado pelo Papa Gregório, no século 15.
O dia 1º de janeiro é tido como o dia universal da Paz.
Muitos países comemoram o dia 6 de janeiro como o Dia de Reis, mas é bom que saibamos que não eram três os reis, não eram reis, nem eram magos que foram visitar o Menino Jesus, recém nascido e tutelado pelos pais Maria e José etc. No Velho Testamento, em Mateus, há uma única referência sobre esse assunto.
Diz-se que no Brasil tudo só passa a funcionar depois do Carnaval. Mas acho que este ano as coisas podem mudar.
Daqui a onze dias os juízes da 4ª Região, sediada em Porto Alegre, RS, se manifestarão a respeito da condenação a Lula, martelada em Curitiba pelo temido juiz Sérgio Moro. Depois disso é que virá o Carnaval, quer dizer: a folia de Momo, pelos mais antigos chamado de Tríduo Momesco. Esse Tríduo já virou um mês inteiro ou mais. 
Mas sabem o que eu ia falar mesmo? Eu ia falar, neste texto, sobre Saudade.
Antes de mais nada: você sabe meu amigo, minha amiga, que há no calendário comemorativo do Brasil, o dia da Saudade e que esse dia é o 30 de Janeiro?
Falarei melhor a respeito no próximo texto, antes ouçam:







SÃO PAULO

Ah, ia me esquecendo: é em Janeiro, dia 25,  que os paulistanos  comemoram a fundação da cidade em que nasceram. E para essa cidade eu fiz uma declaração de amor, esta:




sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

LEMBRANDO PESSOAS QUERIDAS


Ainda guardo no peito, com carinho, pessoas que de algum modo me mostraram caminhos desconhecidos e que há muito com elas não falava. 
Esta semana andei falando com Renato Teixeira,  Júlio Medaglia e Fagner. Foram falas muito agradáveis, de lembranças idem.
Eu conheci Renato ali pelos 80, quando Elis lançava Romaria. E foi curioso o nosso primeiro encontro que surgiu a pedido de Samuel Wainer. Como muita gente deve saber, Samuel foi um dos braços fortes do gaúcho presidente Getúlio Vargas (1882-1954) e fundador do ainda lembrado vespertino, Última Hora.
Esse título fora incorporado à empresa Folha da Manhã e Samuel, um dos nomes da própria Folha. 
Na segunda parte dos anos de 1970,criou-se o suplemento dominical Folhetim. Fui um dos seus colaboradores. Por essa ocasião entrevistei o Renato. Entre umas boas bicadas de Wyborowa, saboreamos um coelho a não sei o que, prato de primeiríssima, isso num restaurante já extinto que ficava ali por perto da Brigadeiro, quase Bixiga.
Foi uma entrevista legal, que ocupou uma página do jornal.
Na conversa desta semana lembramos esse encontro e rimos. E rimos. E eu lhe disse que acabara de ouvir o seu novo cedê que está chegando à praça com a chancela da Kuarup. É um disco muito bonito, com repertório escolhido a dedo e interpretado com acompanhamento de orquestra e tudo o mais.
O papo com o maestro Medaglia foi também muito saboroso e lembramos o Vandré, que a mim disse mais de uma vez da vontade de ouvir sua obra, ou parte dela, no formato sinfônico assinado por Medaglia. Há poucos dias o maestro esteve regendo orquestra em João Pessoa PB, onde ora se acha o autor de Disparada e Prá Não Dizer que não Falei de Flores (Caminhando). A propósito: Em outubro completam-se 50 anos  que essa música chegou aos ouvidos do grande público. Será que a efeméride vai passar em brancas nuvens?
Fagner continua sendo uma pessoa muito agradável. A última vez que o vi foi no Leblon, ao lado do produtor musical José Milton e do forrozeiro Chico Salles (1951-2017).
A obra de Fagner é extensa, recheada de pérolas. São inesquecíveis seus encontros com grandes nomes da Música Brasileira e de países de língua espanhola. Entre os grandes nomes com os quais se juntou, em disco, não dá para esquecer Luiz Gonzaga (1912-1989).Com o rei do baião ele gravou dois LPs. Prá lembrar:

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

LUA E RENATO TEIXEIRA

Menina 23 chegando noite maravilha sampa São Paulo e não sei que  não sei que lá não sei que lá não sei que lá...., linda bela.
O sol é novo todos os dias.
O sol não tem tempo. E a lua nasce todos os dias, e pra se mostrar sorrir nas fases que quer: nascente, crescente, cheia e minguante.
Lua, lua, feminina.
Menina lua chegando no colo da lua mãe.Quem?
L de lua, a de amor, m de mar, a de não sei que lá não sei que lá não sei que lá....
A vida é sol, é mar...
A lua se esparrama no mar.
Vocês conhecem um poema Ismália, do poeta simbolista Alphonsus de Guimaraens? pois sim ou não, que beleza!

Faz bem pouquinho tempo que falei quase uma hora com meu querido Renato Teixeira, cantor e compositor,  amigo de muito tempo, que conheci através do fundador do jornal Última Hora,  Samuel Wainer.
Um dia Samuel diz que gostava dos textos que eu escrevia na Folha Ilustrada, no folhetim. E não pediu, mandou: eu quero que você faça uma entrevista com Renato Teixeira.
E eu nem sabia quem era Renato Teixeira, mas pela necessidade momentânea, fiquei sabendo que Renato tivera recentemente uma música gravada por uma tal de Pimentinha, chamada Elis Regina.
Título: Romaria. Ouçam:

Renato Teixeira é-me muito importante.Tá, sei que o Brasil também acha isso.
Neste momento ele se acha em Olinda, Recife e depois do dia 20 que vem, estará de volta à cidade que me adotou, São Paulo. Estaremos juntos, certamente.
Renato tem muita história com Vandré. Terei tempo de contar isso em outro momento.
Renato tem muita história de lua. Renato é um sonhador, meio besta assim que nem eu.

KLÉVISSON VIANA LANÇA MAIS UM BELO LIVRO

Aos 45 anos de idade, Klévisson Viana consagra-se  definitivamente como um dos maiores criadores e intérpretes da poesia dita popular, aquela que é tradicionalmente publicada em folhetos basicamente de 32 páginas.
Klévisson Viana é um cearense que praticamente desde o berço dá voz às coisas do cotidiano, incluindo gente e paisagens.
Kévisson, criador e dono da editora Tupynanquim, já publicou centenas e centenas de folhetos de diversos autores, entre os quais ele próprio.
Além de muitos folhetos de sua lavra, Klévisson tem uma boa penca de livros de poesias publicados. O mais novo desses livros é o Miolo da Rapadura,
( Premius editora e Tupynanquim editora, 2017; 168 pág.) em que conta saborosos causos e homenageia alguns nomes do universo da cultura popular, como o raçudo cantador repentista Geraldo Amâncio,(pág.33) , o poeta Alberto Porfíro (pág. 63), mestre João Firmino Cabral ( pág. 85), o imortal humorista Chico Anysio (pág. 113).
Além desses nomes importantes da cultura popular de que tanto gostamos, Klévisson fala nessa sua nova obra sobre os símbolos do cangaço Lampião e Maria Bonita,  pegos em emboscada no alvorecer do dia 28 de julho de 1938; e Zé Limeira, o mito do repentismo brasileiro, nascido e enraizado na Serra paraibana do Teixeira, ali pelo início da segunda parte do século 19.
O novo livro de Klévisson, traz-me boas lembranças e  surpresas.
Há uns anos, uns 10 talvez, gravei de Klévisson, uma jóia cujo mote é Eu Quero ver Acordado, Aquilo que vi Dormindo, que se acha no livro. Gravei com acompanhamento musical da viola repentina do mestre Sebastião Marinho. Esse disco, produzido pelo mineiro cantador Téo Azevedo, poeta e tudo mais, traz uma música que compus com próprio Klévisson e Gereba, Quixoteando, esta:


Eu tenho ouvidos muitos livros, áudios livros. e não raro a alegria bate-me a porta anunciando-se como Marco Haurélio, o cartunista Fausto, Vitor Nuzzi (biógrafo de Geraldo Vandré) Rômulo Nóbrega, Cristina, Tinhorão, Lúcia.....aliás, esse novo livro de Klévisson começou a ser lido para mim por Tinhorão e findo, agora,  por Lúcia. Quer dizer: mesmo  hoje sem  poder ler, eu leio pelos olhos de amigos e amigas.
José Ramos Tinhorão, veio sexta, como todas as sextas comumente, e conversa vai e conversa vem, leu para meus ouvidos o mote   O Namoro de Antigamente e o Namoro de Hoje em Dia,  do Klévisson, que diz muito de ontem e de hoje, na parte assim da safadeza, do duplo sentido....pois enfim o Tinhorão está escrevendo um livro sobre licenciosidade, coisas da poesia. E ele leu, começando assim: 

Vamos poeta!
Defenda o namoro antigo, 
Deixe o moderno comigo
Que agora vou embolar!

Sobre namoro, 
Gosto mais de hoje em dia...
Não tem  mulher arredia. 
Quando o assunto é gozar!
O casamento
é negócio ultrapassado
Pra mulher fazer agrado 
Não precisa se casar! 
....

Viva a cultura popular, viva o Brasil e que a esperança em nós nunca morra, nunca desapareça de nossa memória e imaginação.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Eu já disse e repito: há muita gente que acha que eu nunca fui criança. Eu já fui criança, sim!
Eu nasci com 18 anos e mamei até os quase 30, certo? Pois bem, eu fico sempre feliz quando pessoas em formação vem até mim pra dizer coisas, como o Pedro Ivo.
Pedro é o primeiro varão do querido casal amigo Lucélia, Marco.
Lucélia e Marco são baianos e eu baiano, quase.  Quem sabe, eu chego lá...
Outro dia fim de tarde alegraram o local onde vivo Lucélia, Marco e Pedro. O Pedro tá ai, se balançando e lendo página do novo livro do Fausto, o cartunista, Pré-Histórias. Esse livro nasceu ai, no nosso blog. Mas essa é outra história...


Pessoas muito queridas têm vindo até mim trazendo abraços, sorrisos, versos, e ás vezes uma caninha pra beber que ninguém é de ferro.
Enquanto dito essas linhas, ouço o anuncio "plin-plin" de mensagem do bom mineiro Téo Azevedo dando conta de que está em vias de lançar dois DVDs de cara  e mais um ou mais dois ou mais três CDs. E como se vê, o cara não para.

DVD "O Canto do Cerrado - Volume 01"
DVD "O Canto do Cerrado - Volume 02"
CD "Repentistas do Norte de Minas" (Téo Azevedo & Tone Agreste)
CD "Sonora Harmonia - João Francisco"
CD "O Choro do Cerrado"
Livro "A História de Nossa Senhora Aparecida em Cordel" Ed. Ampliada

Em 1983 Téo Azevedo gravou com o rei do baião, Luis Gonzaga, a Peleja do Gonzagão x Téo Azevedo pela extinta gravadora RCA Victor:



ARTÚLIO REIS, FORRÓ E SAMBA

Tudo anda muito rápido, nesta vida louca. Tanto que só me deu conta agora de que o baiano de Condeúba Artúlio Reis acaba de inaugurara a segunda parte da casa dos 70.
Meu amigo, minha amiga, você sabe quem é Artúlio Reis?
Artúlio é um dos mais admiráveis compositores da música popular.
Ele chegou à capital paulista ainda no seu tempo de jovem, com 20 anos. Fez jornalismo etc. Durante bons anos ele respondeu pela assessoria de imprensa da extinta gravadora RCA Victor, que ficava logo ali num prédio de poucos andares da rua Dona Veridiana, pertinho da Santa Casa e da rede de bares da Lilian Gonçalves, filha excomungada do cantor gaúcho Nelson Gonçalves. A propósito: é de Nelson uma das melhores interpretações para o samba Memórias do Café Nice, de Artúlio Reis. Antes de Nelson Gonçalves gravar Memórias do Café Nice, Milton Carlos e Doris Monteiro também o fizeram. 





Artúlio Reis nasceu no dia 6 se janeiro de 1942, em Condeúba, acima já referida. É casado com Janet com quem tem três filhos: Gabriela, Juliana e Junior.
Além de Milton, Doris e Nelson gravaram composições de Artúlio Luiz Ayrão (Saudade da república), Luiz Gonzaga (Tamborete de forró) e a banda baiana Olodum (Tambores de cores). Confiram:




A discografia não oficial de Artúlio chega próximo aos 150 títulos gravados, de forró a samba etc. E continua compondo, e muito.
Há uns 20 anos, um pouco mais talvez, ele foi agraciado com o almejado prêmio Caymmi de música, em Salvador BA.
Estou morrendo de saudade dos inéditos de Artúlio Reis! 

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

VANDRÉ, SECA E MÚSICA

O meu amigo pintor Miguel dos Santos telefona para dizer que a Paraíba continua bela, apesar da seca que a atormenta secularmente. Também para dizer que está bem, que está com saúde, como a sua família. Bom. Também para dizer que o Vandré andou por lá, que anda por lá, na Paraíba, especialmente na capital, João Pessoa.
Disso eu já sabia, eu lhe disse. 
Eu sabia porque o próprio Vandré havia me telefonado, quatro ou cinco dias antes, pra contar que estava por lá. E que a sua presença lá na sua terra (ele nasceu em João Pessoa) tinha razão de ser: conversas com o governador sobre a sua obra em tom sinfônico...
Pois bem, e para minha alegria hoje chegam à minha casa os queridos Fausto (cartunista) e Vitor Nuzzi.
Vitor é jornalista, autor do livro que conta a história do Vandré, lançado em 2015 pela Kuarup: "Geraldo Vandré -Uma canção interrompida". 

E conversa vai, conversa vem, com meus amigos Fausto e Vitor lembramos que neste ano da graça e certamente de complicações eleitorais de 2018 completa-se meio século da apresentação primeira de "Caminhando" ("Pra não Dizer que não Falei de Flores"), no Maracanãzinho (RJ).
Eu tenho dito para meu querido Audálio Dantas, cangaceiro de todas as belas letras, que é preciso discutir o Brasil, de todas as formas. E um momento muito apropriado seria agora, neste ano que começa, a partir de "Pra não Dizer que não Falei de Flores"...
Neste ponto, Fausto e Vitor concordam.
Vitor, Assis e Fausto, com obra de Miguel dos Santos ao fundo

Eu tenho conversado sobre este mesmo assunto com o maestro Júlio Medaglia.
Júlio é uma das maiores expressões musicais que conheço desde que sou quem sou, antes mesmo de jornalista.
Uma pena: o Brasil conhece pouco o Brasil, e menos ainda a obra dos seus gênios – Carlos Gomes, Joaquim Callado, Patápio Silva, Machado de Assis, José de Alencar, Lima Barreto, Chiquinha Gonzaga, Pixinguinha, Ernesto Nazareth, Noel Rosa, Caymmi, Villa-Lobos, Antenógenes Silva, Luiz Gonzaga, Dalva de Oliveira, Millôr Fernandes, Fortuna, Anselmo Duarte (este muito especialmente precisa ser revisto), Gláuber Rocha, Sivuca...
Eu aproveitei o momento, hoje, em minha casa, para perguntar a Vitor Nuzzi sobre dificuldades e curiosidades que encontrou para publicar o livro que escreveu sobre o autor de "Quem Quiser Encontrar Amor", "Fica Mal com Deus", "Disparada", "Caminhando". E ele disse que foram 10 anos pesquisando e procurando gente, falou da procura a editoras, sobre a dificuldade de publicar uma biografia não autorizada no Brasil e sobre a resistência do próprio biografado. E perguntei ainda: faz quanto tempo isso? E o Vitor contou que, quando conversou com Vandré, ele perguntou: "Quantos anos você tem?". Surpreso, Vitor respondeu: 43. "Quando você tiver 50, você vai entender", completou Vandré. E eu de novo perguntei ao Vitor: quantos anos você tem hoje? "Eu nasci no dia 1º de setembro de 1964". 
Meus amigos, minhas amigas, não está na hora de discutir o Brasil pra valer? De lembrarmos esses grandes nomes esquecidos, jogados fora, abandonados na poeira do tempo?
O Brasil é muito maior do que pensamos. 
Ah, sim! Ia me esquecendo que uma das melhores interpretações da guarânia "Pra não Dizer que não Falei de Flores" é do trio potiguar Marayá. Confiram:




EU FUI CRIANÇA E NÃO SABIA

Ah! Lembro-me agora que na minha terra, a Paraíba da minha infância, a pipa é coruja. Tá bom, tá bom. Pipa é papagaio, é coruja. E é também arraia! Ia me esquecendo. No Rio Grande do Sul, segundo meu amigo cartunista Fausto, é pandorga.
Pois bem, a pipa é um dos primeiros brinquedos de que se tem notícia.
Nos desenhos em pedra descobriu-se, há muito, algo parecido com a pipa. E era pipa. Alguém menino, ou adulto, com uma linha na mão e lá na frente uma figura em movimento... É pipa. Na Paraíba é coruja. Por que coruja? 
Coruja é uma ave noturna, de olhos grandõõões, com o pescoço com quase 360 graus, que vê tudo, ouve tudo, até onde o pescoço permite. E os olhos grandõõões... Além disso, essa ave é conhecida por ser da noite, óbvio, não é? 
Por que será que a inteligência está ligada diretamente à coruja. Para muitos povos, a coruja é observadora, é inteligente, é astuta, vê o que não vemos, principalmente à noite.
E a arraia?
A arraia, por tudo que me lembro, é um ser marinho, meio triangular. A coruja, como pipa conhecida fora do meu Nordeste, tem várias formas: quadrada, redonda, oval e triangular, assim parecidamente com a arraia. 
Ah, meus dias de infância...!
O meu amigo Rômulo, com o neto Hugo, está transformado. Tenho certeza. Nesse ponto, a pesquisa que faço é: quem dos dois é mais criança, Hugo ou Rômulo? Rômulo... Hahaha.
Falei de pipa por acaso, por acaso falei da mesma coisa bonita que encanta ou encantou os meninos, como eu, na minha época... Isso tudo faz-me lembrar das cantigas, das modas de roda, mas essa é outra história. Mas nessa mesma história podemos dizer que a pipa, o papagaio, a coruja e a arraia são um mesmo sonho, que se soma à formação infantil, que nos traz lembrança, com a inteligência natural de nós, seres humanos.
Uma coisinha: a pipa etc. é, tradicionalmente, um brinquedo ou passatempo infantil, masculino, como a boneca é um passatempo brinquedo feminino.
A coruja etc. é para o masculino tão importante quanto a bola.
A bola, meu Deus do céu... Essa também é outra história.
Que a criança em nós nos mantenha.



terça-feira, 2 de janeiro de 2018

E QUE VIVAM AS CORUJAS!

Há quem duvide, mas eu já fui criança. Já fui criança e pus no ar coruja. Sei, sei, você não sabe o que é por coruja no ar. Por coruja no ar é empinar coruja. Sei, sei, que você não sabe: coruja é pipa, coruja é papagaio, coruja é pipa no ar.
Eu já empinei pipa, tá bom?
Na minha Paraíba querida, pipa ou é papagaio ou é, principalmente, coruja.
Essa história de pipa papagaio e coruja é uma história longa, data de dois três ou não sei quantos séculos antes de Cristo.
Pela minha lembrança e histórias a mim contadas, a coruja dos meus impulsos vem da velha, da velhíssima China. Ou como dizem os outros: da antiga China, a.C.
Essa história me vem à pauta pela conversa que há poucos minutos tive com meu querido amigo Rômulo Nóbrega, paraibano da cepa.
Feliz feito um passarinho diante de um saco de alpiste, Rômulo acaba de me contar da alegria de estar com o neto Hugo.
Hugo, de cinco anos de idade, é filho de uma alemã e do único varão do Rômulo, Rodolfo.
Pois bem, Hugo está na casa do Rômulo, em Campina Grande. E agora fica até um pouco difícil saber dos dois quem é criança...
Pois bem, Rômulo não para de mostrar a vida nordestina ao neto Hugo. E os dois já galoparam juntos, e os dois já andaram juntos, e os dois já voaram juntos e os dois já nadaram juntos nos açudes e os dois já pescaram juntos e os dois já empinaram corujas juntos.
As corujas do meu tempo me deixaram marcas; marcas profundas de alegria, de vida, de uma vida que não volta mais.
As corujas s]ão em mim adulto, as meninas da minha memória mais livre, mais bonita...
Foi muito bom ser menino empinador de corujas e na linha que dava vida a elas iam meus recadinhos escritos com letras infantis às estrelas.
Eu, através das corujas, dos fios ou linhas que davam vida a elas, eu mandava mensagens para as minhas namoradas estrelas...
Pipas, papagaios ou corujas, foram inventadas há muitos séculos, como eu disse ali atrás.
As corujas de antes de Cristo, ou pipas ou papagaios, foram usadas como meios de comunicação nas guerras de antigamente.
Cada pipa, cada papagaio, cada coruja tinha uma cor ou forma que servia para identificar amigos ou inimigos em guerra. Depois disso, bem depois, a pipa, papagaio ou coruja serviu de inspiração para a criação do para-raio.
As corujas que Rômulo e Hugo empinam em Campina são as corujas da minha infância, são as corujas da minha lembrança, são as corujas da minha vida, são as corujas com suas cores múltiplas que ainda me fazem lembrar o encanto que foi a infância do sertão, do amanhecer, da aurora da minha vida. Isso parece coisa de Casemiro de Abreu, mas não é não. Tampouco de Augusto dos Anjos.
Ao mandar mensagem às estrelas, via linha que dava vida às corujas do meu tempo, eu sem saber estava alimentando o adulto que hoje sou. É por isso que vivo bem, alimentado pelo menino que fui.
Que assim seja sempre. E que os adultos se alimentem da criança que foram.
A cantora paraibana Socorro Lira tem uma música que fala de pipa. Vital Farias a acompanha, ouça, localizando o cursor na metade do álbum abaixo:


FAUSTO 44

Nos primeiros anos antes de completar 65 anos de idade, o cartunista, desenhista e não sei que lá mais Fausto foi criança. Há exatos 42 anos, num dia 2 de janeiro como o de hoje, ele iniciou a sua carreira profissional. E virou mestre. E viva Fausto!





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