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domingo, 19 de novembro de 2023

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (53)

Não será ou seria exagero dizer que entre tantos profissionais de áreas diversas se acha o psicanalista alemão Sigmund Freud (1856-1939). Não foi Freud que certa vez disse que "Vivemos sob o princípio do prazer"?
Rétif de La Bretonne foi um cara que despertou antipatia e discussão, amor e raiva. O seu tempo foi o tempo do Iluminismo. Brilhou. Era poeta bissexto, político sem grande expressão, mas tinha lá seus admiradores. Não foi vítima nem algoz da Revolução Francesa. Era, digamos, um defensor dos oprimidos e dos vagabundos de rua. Pelas narrativas, era um devasso. Teve centenas de mulheres e um número expressivo de filhos, embora não se saiba exatamente quantos. Espécie de Casanova?
É possível que Casanova tenha inspirado Kierkegaard a escrever o Diário de um Sedutor, que no rigor do termo é uma bobagem. 
Tinhorão, no seu texto para o Diário Carioca, lamenta que o nome de Bretonne não fosse ainda conhecido no Brasil.
Em 1989, o diplomata e ensaísta carioca Sérgio Paulo Rouanet (1934-2022) publicou pela Companhia das Letras, SP, o livro O Espectador Noturno, com o subtítulo A Revolução Francesa através de Rétif de La Bretonne no qual discorre sobre a vida e obra deste autor. O destaque é para a política, mesmo assim afirma que "Rétif é dominado pelo fantasma da paternidade e, se defende o incesto, é em parte porque ele permite a cada família produzir um número ilimitado de filhos. Nisso ela se distingue do aristocrata Sade, que representa o consumo, e não a produção, que defende o incesto na perspectiva do consumidor - fonte de gozo, e não de filhos - e que de resto advoga a sodomia porque ela constitui um freio para a natalidade".
Para se contrapor ao livro Justine, de Sade,
Bretonne escreveu e publicou o livro Anti-Justine. No seu livro Sade falava de política social, criando uma personagem que perde os pais prematuramente e sofre todas as injustiças possíveis que alguém possa sofrer. Mas ao fim dessa história, o bem vence o mal. Enquanto isso, na vida real, Bretonne soltava o tesão e refestelava-se na cama com quem estivesse mais próximo. Por isso e outras coisas foi que José Ramos Tinhorão encerra seu artigo para o Diário Carioca dizendo que:
"Rétif de La Bretonne precisa ser lido novamente. O precursor do romance realista, que Lavater, o criador da fisiognomonia, chamava de 'Richardson francês' - embora outros preferissem chamá-lo de 'Voltaire das criadas de quarto' - não faria má figura, num tempo onde ainda se vende tanto as Confissões de Rousseau e as Memórias de Casanova".
Na vasta obra de Bretonne destacam-se vários títulos, entre os quais Le Palais-Royal, Le Paysan et La Paysanne Pervertis, As Noites Revolucionárias e Anti-Justine.
A sua biógrafa Elizabeth Lorenzotti, Tinhorão disse alto e bom som: 
"Fui eu quem, muitos anos antes de Sérgio Rouanet, revelou o Rétif de La Bretonne, grande ícone da literatura  libertina francesa, e um cronista da Revolução".
A vida e obra de José Ramos Tinhorão tem conteúdo e são extensas. Atuou em vários
jornais e revistas, ora com contrato fixo ora como freelancer. Como free chegou a publicar na revista Chuvisco e no Jornal dos Sports. 
Em maio de 1965, Tinhorão publicou no Jornal dos Sports o artigo As Dúvidas do Gênesis ou a Gênese da Dúvida. Na página onde aparece esse texto, aparecem também propagandas das extintas boates Pigalle e Moulin Rouge. E mais uma: da rádio Mayrink Veiga anunciando na programação a presença do seu astro rei do baião Luiz Gonzaga. 
E Tinhorão não bastou-se nos jornais e revistas do Rio, também apresentou um programa de entrevistas, Tudo é Música, na TV Brasil.
No cinema, Tinhorão aparece curiosamente como um dos personagens de Nelson Rodrigues. O filme, Asfalto Selvagem, deu o que falar. A respeito da "participação" de Tinhorão, o jornalista Ruy Castro escreveu no livro O Anjo Pornográfico:
"O futuro historiador da música popular, José Ramos Tinhorão, então copy desk do Jornal do Brasil, era mostrado como um jovem sátiro a bordo de um calhambeque e mantendo um caderninho onde anotava os nomes de suas conquistas - a maioria das quais iludia com a promessa de que Accioly Neto mandaria fotografá-las para a capa de O Cruzeiro".
Tinhorão gostou.

Foto e reproduções por Flor Maria e Anna da Hora

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