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sábado, 5 de abril de 2025

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (175)


Pois é, tudo bem. Gosto daqui, deste lugar, onde nasci, brinquei, cresci, virei gente, casei, tive filhos e depois de algumas tempestades e sutis terremotos, enviuvei.

Como os pássaros, os filhos foram em busca dos seus caminhos. Isso faz tempo, embora não me lembre de quanto tempo. 

O tempo é intangível, impegável, impalpável, sem cor. Às vezes engrossa e toma jeito de tornado, tempestade, furacão e tudo mais. O vento é violento quando quer, quando não quer é um doce: suave, cheiroso que nem o perfume de todas as flores juntas.

A propósito, em tempos outros eu cheguei a fazer uns versos atemporais. Diziam:

 

O vento sou eu

O vento sois vós

Sem o vento ventando

O que será de nós?...


Eu gosto deste lugar, daqui onde estou a contemplar o bailado mágico das plantas e dos galhos com suas verdes folhas que o vento tanto gosta de soprar.

Sim, eu gosto mesmo deste lugar.

Eu gosto de ouvir o trinado dos passarinhos em bando ali pelo meio da tarde.

O bem-te-vi me faz um bem enorme! E no tempo de chuva, ou de chuva a cair, me vejo em êxtase ouvindo o canto da acauã. 

A mim sempre doeu ouvir o bater da asa branca fugindo por prever tempos de seca. É o primeiro pássaro que faz isso. 

O lugar cá onde estou parece mais o Paraíso. 

Areia é o nome da cidade onde hora me acho e escolhi para viver a minha eternidade.

Essa terra faz parte dos oito municípios do Brejo paraibano. 

Do Brejo paraibano faz parte a cidade onde nasceu o popular Jackson do Pandeiro: Alagoa Grande. 

Desse brejo também fazem parte Pilões, que conheci no meu tempo de menino; Bananeiras e Serraria. 

Serraria, pegada com Bananeiras, é uma bela cidadezinha de porte gracioso pronta para encantar quem a visita. Parece mágica. Foi nessa cidade, onde o vento é sempre brisa e cheiroso como o perfume das melhores pétalas, que nasceu o cantor Roberto Luna.

Não é todo mundo que tem o privilégio de viver aqui. 

Aqui em Areia eu nasci e voei para o mundo pra depois voltar. 

É uma fazendinha de nome Ninho de Pássaros. Tem sei lá quantos hectares!

Aqui em Ninho de Pássaros tem de um tudo. Exemplo? 

Além dos pássaros que voam em bando enchendo o céu de cantos, no chão tem bichos que andam. 

A menina Bibiu brinca sem nunca se cansar com coelhinhos e passarinhos. 

Bibiu também adora brincar com tartarugas e corujas. Parece encantar tudo com os seus olhos de fantasia. 

É uma delícia ver Bibiu hipnotizando a corujinha Bastiana.

E como descrever Bibiu ensinando a tartaruga Xiroca a andar apressada, hein?

E o que dizer de Bibiu correndo e tangendo passarinhos que insistem em brincar com ela?

Bom, Areia, com seus 30 mil habitantes, é uma terra de deuses. 

A história dessa cidade é uma história comprida. 

Antes de virar município, num ano qualquer do século 19, Areia recebeu esse nome por causa de um riachinho estreito, de águas cristalinas, do tamanho de nada e muito do bonitinho com peixinhos miudinhos dando-lhe vida. Eu sei tudo dessa terra.

Corria o ano de 1625, quando a região começou a ganhar casas e virou povoado.

À época a região era habitada por indígenas da etnia Bruxaxás.

De repente fui interrompido por Margarete, dona Margarete, trazendo nas mãos um telefone. Ela disse, pedindo milhões de desculpas:

— Seu Olégna, é uma ligação internacional. 

De fato, do outro lado da linha vinha uma voz feminina doce e firme. Era Flor Maria dizendo que se achava em Veneza, Itália, a caminho da Alemanha e da Suíça. Gostei do que ela disse. 

Eu estava mesmo aonde?

Atentos a minha volta estavam Zé Perrepe, Zé da Luz e Zé de Bia, sem a Bia.

Eu nem precisei terminar a frase quando Zé Perrepe disse logo: 

— O Sr. estava falando a respeito do povoado que virou Areia.

Ouvi palmas ante a fala de Zé Perrepe. 

Eram palmas que vinham dos amigos Onaldo, Ribbas, Klévisson, Rômulo, Maurício, Marcelo, Peter, Betão, Osvaldo Mendes, Faustino, Celso Sávio, Valmir Salaro, Zé Nêumanne, Chico Anísio, Joyce, Irene, Fatel, Cilene, Silvia, Júlia, Madalena, Rebeca, Júnia, Cristina, Marília, Célia, Anna e a violeira Mocinha de Passira, que vieram até aqui sob o pretexto de me parabenizar pelos meus supostos… sei lá quantos anos!

Pense numa risada estrondosa, bombástica! Era o cantador Oliveira de Panelas trazendo a tiracolo Jarbas Mariz, Sebastião Marinho, Ivanildo Vila-Nova, Geraldo Amâncio, Mário de Andrade, João Cabeleira, Téo Azevedo, Wilson Baroncelli, Manoel Dorneles, Jorge Araújo, Eduardo Ribeiro, Audálio Dantas, os irmãos Paulo e Jean Garfunkel, Paulo Caruso, Jessier Quirino, Zé Hamilton, Marcos Zanfra, Wilson Seraine, Carlos Silvio, Leonel Prata, Loyola Brandão, os emboladores Cajú e Castanha e o todo prosa Fausto Bergocce. Um timaço.

Bom, como eu ia dizendo: em 1625 o que hoje é Areia era um pequeno povoado do tamanho de quase nada, porém lindo que só! Enfim, devo dizer que Areia é uma terra legendária. Aqui nasceram o pintor Pedro Américo, autor do famoso quadro O Grito do Ipiranga e o escritor e político José Américo de Almeida, que chegou a ser governador da Paraíba e ministro do governo Vargas. Fora isso e mais importante, foi o autor do marcante romance A Bagaceira. 

No correr dos anos, Areia gerou filhos corajosos e brilhantes. Muitos deles participaram da Revolução Pernambucana (1817), da Confederação do Equador (1824) e da Revolução Praieira (1848). 

Foi em Areia que se travou a batalha derradeira da Praieira em 1849. 

— Muito bem, muito bem seu Olégna Cameron!

Era o historiador José Octávio chegando e batendo palmas com aquele sorrisão e jeitão só dele.

Não custa dizer pra quem não sabe que esse Zé Octávio é o mais reverenciado historiador do Nordeste e por que não dizer do Brasil.

É bom que se diga que estamos num amplo espaço pontilhado de plantas e árvores frutíferas. 

É bom que se diga também que estamos aqui na fazenda degustando um bom feijão verde com carne de panela e um churrasquinho dando sopa, enquanto molhamos o bico com uma cachacinha de nome Volúpia. Hmmmm… Essa cachacinha dela quem me falou foi Jarbas Mariz.

Dessa cachacinha boa para o gogó quem também me falou foi o poeta e juiz de Direito Onaldo Queiroga.

Lá dentro as mulheres estão preparando cuscuz, macaxeira, inhame, um baiãozinho de dois pra três, pra quatro, pra cinco…  e tapioca de todo tipo. Como sobremesa tem caju, jaca, manga, laranja, banana, melancia, mamão e até fruta-pão. 

Pois é, fruta aqui dá o tempo todo.

E ia me esquecendo: também tem mel e rapadura a granel diretamente de nosso engenho.

Da igrejinha perto daqui o sino está dando conta da hora: treze.

O dia de hoje é sábado. 

O céu de brigadeiro, lindo, mostra o sol mandando faíscas. 

O vento faz uso da sua força e beleza para balançar os galhos e folhas das árvores muitas centenárias.

Em dado momento sai de algum lugar um som de rabeca.

Outra vez, chega até mim a prestativa Margarete. Diz que acabara de falar ao telefone com Flor Maria. Perguntei: e daí?

Margarete sempre atenciosa, contou que Flor Maria tinha convencido  os escritores a estarem aqui  logo, logo e que ela mesma já está de volta ao Brasil. 

Essa Flor Maria não é brinquedo, não!

Zé da Luz pergunta: 

— Quem é Flor Maria?

Eu digo a Zé da Luz e a todos que queiram ouvir: Flor Maria é a coordenadora de pesquisa do Instituto Memória Brasil. Uma fotógrafa e tanto, com canudo outorgado por Harvard. É a melhor que há.

— Ela foi fazer o que lá na Europa?

É o cantador Oliveira de Panelas, com aquele vozeirão de trovão intergaláctico, curioso perguntando o que perguntou.

Matando a curiosidade do cantador, eu disse que Flor está acompanhada de assistentes com a missão de combinar uma entrevista reunindo Pietro Aretino, Sade, Rétif de La Bretonne e, principalmente, Giacomo Girolamo Casanova. 

— Poxa vida! Verdade!?

— Isso mesmo, pessoal. A ideia é mostrar a vida desses namoradores que fizeram história e ainda dão muito o que falar.

— Muito bom! Muito bom!

Zé da Luz: 

— Eu já ouvi falar desse tal de Casanova. Seu Assis, com todo respeito, eu lhe desafio para um embate ao som de viola com a temática Ca-sa-no-va. Topa?

— Fazer o quê, hein?

O multitudo Luiz Wilson levanta a mão pedindo pra falar. Mais do que isso: declamar de improviso uns versos sobre o famoso garanhão de Veneza que já rendeu até filme de Fellini:


Das histórias de amor

Do passado, se comprova

Cito o galanteador 

Aqui nesta minha trova

Que por ser namorador 

Transformou-se em sedutor

O famoso Casanova!


Boêmio na sua época 

E grande conquistador

Se Inspirou no poeta

Pra's mulheres foi terror

Para trazer à Memória 

Pesquise a sua história 

Casanova o sedutor!


Ao fim da fala cantada Wilson sorrindo fez gesto de agradecimento pelas palmas a ele dirigidas. 

É a vez do poeta Klévisson Viana pedir pra dizer uns versos citando o Casanova. Ele faz uma comparação…


A vida de um sedutor

Nunca foi vida vadia

É um serviço pesado

Mata-se um leão por dia

Venha conhecer o Don

Juan da Periferia


A sua alcunha é Francisco

Filismino das Donzelas

Já nasceu predestinado

Pra ser amado por elas

Chico Tripa para os íntimos

Por ter pernas magricelas


Don Juan, ou Casanova

Perto de Tripa era brocha

O elemento é do tipo

Iludidor de cabrocha

Que só olhando pro rastro

Acendia a sua tocha


terça-feira, 1 de abril de 2025

TORTURA NUNCA MAIS!

O dia 1° de abril de 1964 começou com militares e tanques nas ruas do Rio de Janeiro. Era o começo de longa escuridão que o país passaria a viver.

O dia 2 de abril de 1964 terminou como começou o dia anterior. A tensão tomava conta do país. Nesse dia o presidente deposto, João Goulart, se achava no Rio Grande do Sul conversando com Brizola e aliados. A conversa girou em torno de possível enfrentamento contra os poderosos de plantão que se perpetuariam até março de 1985.

O presidente tampão foi o titular da Câmara, Ranieri Mazzilli, paulista. "Governou" durante 13 dias. Aliás, por 13 dias o mesmo Mazzilli esteve à frente do poder em 1961. Foi nesse ano que Jânio, acusando umas tais "forças ocultas", pegou o boné e foi-se. 

Por dois meses, o Brasil foi "conduzido" por uma junta militar formada pelos ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica. Depois disso, se revezaram na cadeira de presidente Castelo Branco, Costa e Silva, Médíci, Geisel e Figueiredo, esse tal aí que "imortaluzou-se" por dizer que não gostava do cheiro do povo. 

Bom, esses cinco aqui citados se acham com o capeta pulando miudinho no fogo do inferno.

Durante 21 anos seguidos, o Brasil sofreu e muito.

Os anos de 1960 findaram com o povo revoltado. 

Em 1968, a repressão matou a tiros o estudante mineiro Edson Luís. O fuzilamento ocorreu no restaurante Calabouço no Rio.

O cantor e compositor paulista Sérgio Ricardo eternizou o episódio gravando Calabouço, de sua autoria.

Em 1970, já com o afastamento de Costa e Silva, a censura prévia desabou nas relações de jornais, revistas e emissoras de rádio e TV. 

Não custa lembrar que alguns jornais apoiaram o golpe de 1° de abril. 

Durante anos que nunca terminavam foram censurados pelos menos, 500 filmes, 500 composições musicais, 450 peças de teatro, 200 livros e tal.

Muitos brasileiros tombaram mortos pela fúria assassina dos milicos. 

Além dos mortos pela ditadura, foram presos milhares e milhares de brasileiros. Foi nessa leva que sumiu o deputado Rubens Paiva. 

O Congresso foi fechado e muita coisa feia aconteceu no decorrer daquele triste capítulo da vida brasileira que jamais algo sequer parecido volte a ocorrer no nosso Patropi. 

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