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sexta-feira, 26 de julho de 2024

PAULO VANZOLINI: 100 ANOS


Esta semana o médico Drauzio Varella esteve por cá. Tivemos uma ótima conversa. Tudo gravado para em breve ser mostrado num podcast semanal.
O podcast, ainda sem título, tem como integrantes os craques Alex, Abreu, Magrão e eu.
O papo com o Drauzio começou com lembranças à memória do biólogo e compositor paulistano Paulo Vanzolini (1924-2013) e seguiu por aí afora.
Drauzio contou um pouco da sua história e do tempo em que Vanzolini foi seu professor na Faculdade de Medicina na USP. Contou também do tempo em que atendia presidiários na velha casa de detenção.
Durante certo período, Drauzio distribuiu uma revista em quadrinhos intitulada Viralata. Essa revista, com roteiro assinado por Paulo Garfunkel e quadrinhos por Libero Malavoglia, foi de especial importância para conscientizar os presidiários aidéticos no período mortal da doença.

A CULTURA ESTÁ DE LUTO



Hoje, poucas horas antes da cerimônia de abertura da Olimpíada de Paris, morreu o olímpico xilogravurista pernambucano J. Borges.
Borges, 88 anos, partiu para a eternidade de modo natural.
Celebrado no Brasil e no exterior, o artista do traço e da palavra foi pai 24 vezes: 18 biológicos e os outros adotados. Vários seguiram a profissão do pai.
Como o poeta popular Patativa do Assaré, J. Borges frequentou os bancos escolares por pouco tempo. Cerca de um ano; Patativa uns três meses apenas.
A partida inesperada do grande xilogravurista pernambucano deixa o mundo da cultura popular de luto.
Ah! Sim: J. Borges, além de deixar milhares e milhares de xilos, deixou também folhetos de cordel que ele mesmo ilustrava.

quinta-feira, 25 de julho de 2024

INEZITA BARROSO, CAPIBA E ISMÁLIA


Capiba e Assis
Até hoje é grande o número de pessoas que abreviam por meios próprios a própria vida.
Cleópatra matou-se, deixando-se espontaneamente ser picada por cobras.
Duas filhas do filósofo Karl Marx tiveram destino idêntico ao destino de Cleópatra.
No mundo todo muita gente continua se matando.
No Brasil, 30 ou 40 pessoas matam-se diariamente. No dia 15 de julho de 1921 o poeta mineiro de Ouro Preto Alphonsus de Guimaraens pendurou-se numa corda e partiu, pouco antes de completar 51 anos de idade.
Guimaraens teve uma grande paixão na adolescência: a prima Constança, que morreu aos 17 anos de idade.
Depois da partida de Constança, Alphonsus de Guimaraens casou-se e teve 14 filhos, incluindo a caçula Constança, que ganhou esse nome em memória da amada do grande poeta. No dia 21 de novembro de 1910, Guimaraens publicou pela primeira vez no jornal A Gazeta o poema que todo mundo conhece: Ismália. O detalhe é que esse poema foi publicado originalmente com o título de Ofélia.
Ofélia é uma personagem shakespareana que aparece no 4º Ato do final da cena 7 do clássico Hamlet. Confira: 
O REI: ...Então, meiga rainha?
A RAINHA: Tanto as desgraças correm, que se enleiam no encalço umas das outras. Vossa irmã afogou-se, Laertes.
LAERTES: Afogou-se? Onde? Como?
A RAINHA: Um salgueiro reflete na ribeira cristalina sua copa acinzentada. Para aí foi Ofélia sobraçando grinaldas esquisitas de rainúnculas, margaridas, urtigas e de flores de púrpura, alongadas, a que os nossos campônios chamam nome bem grosseiro, e as nossas jovens "dedos de defunto". Ao tentar pendurar suas coroas nos galhos inclinados, um dos ramos invejosos quebrou, lançando na água chorosa seus troféus de erva e a ela própria. Seus vestidos se abriram, sustentando-a por algum tempo, qual a uma sereia, enquanto ela cantava antigos trechos, sem revelar consciência da desgraça, como criatura ali nascida e feita para aquele elemento. Muito tempo, porém, não demorou, sem que os vestidos se tornassem pesados de tanta água e que de seus cantares arrancassem a infeliz para a morte lamacenta.
LAERTES: Afogou-se, dissestes?
A RAINHA: Afogou-se.
LAERTES: Querida irmã, já tens água de sobra; não te darei mais lágrimas. Contudo, somos assim, que a
natureza o obriga, sem que importe a vergonha; uma vez fora, deixou de ser mulher. Adeus, senhor. Com
as palavras, só chamas me sairiam, se não fosse apagá-las a tolice.
(Sai.)
O REI: Sigamo-lo, Gertrudes. Que trabalho me custou para a cólera acalmar-lhe! Receio que de novo a
explodir venha. Sigamo-lo, portanto.
(Saem.)
Ismália ganhou esse título por volta de 1919, foi interpretado por muita gente boa, incluindo Fernanda Montenegro, Larissa Luz e o rapper Emicida.
Em 1958, Ismália foi melodiado pelo compositor pernambucano Capiba e gravado, com orquestra, pela cantora paulistana Inezita Barroso. Ouça:



segunda-feira, 22 de julho de 2024

DIA 2 LANÇO LIVRO EM BRAILLE NO MEMORIAL

O dia 2 de agosto está chegando. É dia importante não só por ser o dia que lembra os primeiros 35 anos do desaparecimento do rei do baião Luiz Gonzaga, como também o dia em que estaremos reunindo amigos e amigas para o lançamento do livro A Fabulosa Viagem de Vasco da Gama em braille e o áudio desse mesmo livro em espaço próprio na Internet. Será no Memorial da América Latina, entre às 17h e 21h. Na ocasião haverá debate com professores da USP e de um representante português sobre o poeta português Luís Vaz de Camões.
De Camões adaptei Os Lusíadas, originalmente publicado em 1572.
A Fabulosa Viagem de Vasco da Gama escrevi em sextilhas. Usei todos os principais personagens do poeta português e acrescentei dois violeiros repentistas no começo e no final do texto poético.
Ao adaptar Os Lusíadas pensei numa ópera popular.
Agendem-se!



domingo, 21 de julho de 2024

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (116)

Além de romances e contos, Júlia também encheu páginas e páginas de jornais de sua época com crônicas e poemas. Na verdade ela começou a escrever escondida do pai. Em março de 1905, João do Rio a entrevista para o suplemento O Momento Literário, em carta dominical do diário Gazeta de Notícias, do Rio. Júlia ao jornalista:

Pois eu em moça fazia versos. Ah! Não imagina com que encanto. Era como um prazer proibido! Sentia ao mesmo tempo a delícia de os compor e o medo de que acabassem por descobri-los. Fechava-me no quarto, bem fechada, abria a secretária, estendia pela alvura do papel uma porção de rimas...

De repente, um susto. Alguém batia à porta. E eu, com a voz embargada, dando volta à chave da secretária: já vai! já vai!

A mim sempre me parecia que se viessem a saber desses versos em casa, viria o mundo abaixo. Um dia, porém, eu estava muito entretida na composição de uma história, uma história em verso, com descrições e diálogos, quando senti por trás de mim uma voz alegre: — Peguei-te, menina! Estremeci, pus as duas mãos em cima do papel, num arranco de defesa, mas não me foi possível. Minha irmã, adejando triunfalmente a folha e rindo a perder, bradava: — Então a menina faz versos? Vou mostrá-los ao papá!

— Não mostres! — É que mostro!

— Vai fazê-lo zangar comigo. Não sejas má!

Ela ria, parecendo refletir. Depois deitou a correr pelo corredor. Segui-a comovidíssima. Na sala, o papá lia gravemente o Jornal do Comércio.

— Papá, a Júlia faz versos! — Não senhor, não lhe acredites nas falsidades! — Pois se eu os tenho aqui. Olha, toma, lê tu mesmo...

Meu pai, muito sério, descansou o Jornal. Ah! Deus do céu, que emoção a minha! Tinha uma grande vontade de chorar, de pedir perdão, de dizer que nunca mais faria essas coisas feias, e ao mesmo tempo um vago desejo que o pai sorrisse e achasse bom. Ele, entretanto, severamente lia. Na sua face calma não havia traço de cólera ou de aprovação. Leu, tornou a ler.

A folha branca crescia nas suas mãos, tomava proporções gigantescas, as proporções de um grande muro onde na minha vida acabara a alegria... Então, que achas? O pai entregou os versos, pegou de novo o Jornal, sem uma palavra, e a casa voltou à quietude normal. Fiquei esmagada. Que fazer para apagar aquele grande crime? No dia seguinte fomos ver a Gemma Cuniberti, lembra-se? Uma criança genial. Quando saímos do espetáculo, meu pai deu-me o seu braço. — Que achas da Gemma? — Um grande talento. — Imagina! O Castro pediu-me um artigo a respeito. Ando tão ocupado agora! Mas o homem insistiu, filha, insistiu tanto que não houve remédio. Disse-lhe: não faço eu, mas faz a Júlia...

Minha Nossa Senhora! Pus-me a tremer, a tremer muito. O pai, esse, estava impassível como se estivesse a dizer coisas naturais:

— Estamos combinados, pois não? O prometido é devido. Fazes amanhã o artigo.

Sei lá o que respondi! O certo é que não dormi toda a noite, nervosa, imaginando frases, o começo do artigo. Pela madrugada julgava impossível escrevê-lo, tudo parecia banal ou extravagante. Mas depois do almoço, antes de sair, o pai lembrou-me como se lembra a um escritor: — Vê lá, Júlia, o artigo é para hoje. Tenho que o levar à noite. Havia um jornal que exigia o meu trabalho. Era como se o mundo se transformasse. Sentei-me. E escrevi assim o meu primeiro artigo... Só mais tarde, muito mais tarde, é que vim a saber a doce invenção de meu pai.

O Castro nunca exigira um artigo a respeito da Gemma…

O Senado Federal publicou em 2020 um livro reunindo crônicas esparsas de Júlia Lopes de Almeida. Título: Ânsia Eterna.

Nesse livro, originalmente publicado em 1903, se acha o conto O Caso de Rute. É sobre uma jovem órfã de pai. A mãe se casa de novo e o novo marido abusa sexualmente da pequena Rute. Tinha ela 15 anos quando isso ocorreu. Os transtornos provocados pelo fato jamais foram superados pela personagem.


Foto e reproduções de Flor Maria e Anna da Hora


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