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sábado, 29 de março de 2025

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (174)

CHICO ANYSIO: “Mulher é uma boa. A sapatão que o diga!”


Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, humorista, comediante, escritor, compositor, 50 anos, quatro casamentos. Dono de uma incrível capacidade de criação, ele se multiplica, se transforma e de repente é Topó, Salomé, Tavares, Meinha, Azambuja, Roberval Taylor e por aí afora, fazendo todo mundo rir. Mas, para HOMEM & MULHER, ele, Chico Anysio, é o seu maior personagem. Veja, nesta entrevista [ao repórter Assis Ângelo], se não é a pura verdade.



Homem & Mulher — Na verdade, quem é Chico Anysio?

Chico Anysio (sério, pigarreia, cruza as pernas e se ajeita na poltrona) — Eu sou poeta, teimoso, batalhador, trabalhador, cearense, cabeça chata. Três de mim juntos dá pra fazer um Caravelle descer... (faz pausa, dá um sorriso meio sem jeito; procura, com os olhos, um cinzeiro e acende um cigarro). Sou boa-praça, bom pai, bom caráter; sou mau amigo, porque procuro pouco os amigos; sou bom colega, procuro dar emprego; sou mau marido, pelo menos as aparências indicam; sou bom ator, não um bom comediante ou humorista. É isso aí. Sou impaciente por ser ariano e, por ser ariano, sou explosivo; e por ser explosivo, sou controlado para evitar que pinte a implosão (aqui, ele se abre num sorriso largo, satisfeito, talvez por encontrar as palavras certas para fazer o próprio per- fil). Além do mais sou alto, forte, feio, fraco, baixo, lindo, louco, certo, esperto, errado, pilantra, mestre, miserável, estroina, bobo, bêbado, lúcido, lépido, lento, lerdo... dependendo do personagem que eu interprete.

Homem & Mulher — Tudo isso?

Chico Anysio — E mais alguma coisa. No fim, eu sou um covarde que se esconde atrás de várias caras por receio de me expor; ou um mau caráter que, em vez de se dar ao trabalho, prefere pôr vários infelizes para trabalhar no seu lugar. Mas faço questão de ser a música do Belchior porque nasci num engenho, com o vento agitando o verde-marinho dos pendões da cana, num tempo em que havia galos, noites e quintais. Eu sou o quintal, de pé no chão, pião na unha, pião no mundo, rodando, rodando, rodando, esperando uma palma de mão que o sus- tente, pelo menos por algum tempo. Cadê?


"MINHA MÃE É MINHA MELHOR PARCEIRA"


Homem & Mulher — Poxa, que fôlego! Você grava discos, programas de televisão e rádio, faz shows, escreve livros, mantém colaborações freqüentes em jornais e revistas e faz parceria com um monte de intérpretes da nossa música popular. E, mais ainda, nos faz rir. Agora, responda depressa: em você o que nasceu primeiro, o compositor ou o humorista?

Chico Anysio — Eu acho que os dois nasceram ao mesmo tempo. Não há quem saiba o que vem antes, se o toco ou a água. As coisas vêm no rio. O rio corre, e eu nele. Comecei a fazer letra de música por volta de 1951 com o Jaime Florence, autor de "Molambo". Depois com Altamiro Carrilho, Monsueto, Dolores Duran, João Roberto Kelly, Nonato Buzar, dona Aide, minha mãe e melhor parceira. Isso, no tempo da Rádio Mayrink Veiga. O humor veio um pouco antes, na Rádio Guanabara. 

Homem & Mulher — Como é que você consegue separar todas essas funções?

Chico Anysio — Simples: não tenho esquema nenhum.

Homem & Mulher — …e desenvolver uma por uma sem prejuízo de nada. Nesse seu trabalho tão diversificado você não se confunde, não mistura as bolas?

Chico Anysio — Olha, não dá pra confundir. São coisas muito diferentes. É como jogar futebol, basquete, beisebol. Quer dizer, tudo é jogo... mas são jogos diferentes, todos com bolas no campo, jogadores uniformizados e tal, mas não dá pra confundir (diminui a fala, sorri maroto, levanta as sobrancelhas; ar professoral). Nós podemos confundir economia com finanças, mas isto jamais acontecerá com o Delfim.

Homem & Mulher — Voltemos à música. A rapaziada de hoje não te conhece como compositor. O que é que você acha disso?

Chico Anysio (aparentemente indiferente) — Eu devo isso à falta de sucesso. Se eu tivesse alcançado o sucesso do Herivelto Martins, eu seria conhecido. Mas a música nunca foi o meu degrau mais importante, talvez o descanso da escada.


"SOU MAIS ATOR. O RESTO É ALFACE"


Homem & Mulher — Você disse que não se considera um bom humorista. Compositor, então? Ou escritor?

Chico Anysio — Ator. Mais ator, porque é disso que eu vivo. O resto é alface. (Luiz, o fotógrafo. pede para Chico mudar de poltrona. O comediante não se faz de rogado, e até concorda que a luz ambiente, fraca, pode prejudicar as fotos. E aproveita para dizer que, não faz muito tempo, fez, no Rio de Janeiro, um curso de fotografia com um profissional famoso. Diz também que chegou a montar um estúdio completo e a possuir onze câmaras.)

Homem & Mulher — Atualmente, e olha que esse atualmente faz anos, fala-se muito em crise. Crise no humor, crise no Carnaval e outras. Há até quem garanta que o circo morreu...

Chico Anysio — Eu vejo isso com muita tristeza, porque é verdade. O rádio foi o veículo responsável pelo surgimento de muitos humoristas. Mas o rádio mudou. Ele hoje se abstém de lutar contra a televisão e, talvez por isso, tornou-se menos importante, principalmente para fazer novos humoristas. Um humorista não se faz em menos de dez anos.

Homem & Mulher — Chico... 

Chico Anysio — Eu sou do tempo em que amar era feio, era pecado, era crime. Hoje em dia já se sabe que amar é bonito, é o lógico, é o certo. As pessoas começaram a ter novos interesses, descobriram o surf, o sol, o mar. Isso tudo é um pouco obra da minha geração, que permitiu que a geração atual tivesse o que tem. Apesar disso, acho que já não se fazem humoristas como antigamente.

Homem & Mulher — Quem está fazendo humor hoje no Brasil?

Chico Anysio (num repente) — Os mesmos de sempre. Nós somos vinte. Não aparece ninguém novo, embora eu tenha tentado muito. Cheguei a aceitar convites para ser jurado em festivais de humor da Record e da Globo, mas esses festivais foram cancelados porque faltou material de alguma categoria. Nível péssimo. Os textos que chegaram às nossas mãos eram, em sua maioria, copiados de revistas, banais ou profundamente cultos. Ora, o humorista não tem que mostrar cultura; humorismo é a arte do óbvio.


"SOU A FAVOR DO POBRE, DO PRETO E DO DESEMPREGADO"


Homem & Mulher — Você teve muitos problemas com a Censura Oficial?

Chico Anysio — Não. Eu nunca tive um texto cortado. Acho até que eu sou o sujeito menos censurado no Brasil, na área do humor, é claro.

Homem & Mulher — A que você deve isso?

Chico Anysio — A minha sinceridade. Eu nunca falei sobre hipóteses, nunca chamei ninguém de ladrão sem ter provas. Sempre falei a verdade. Eu não faço piadas sobre "o que eu acho que", mas sobre "o que todo mundo sabe que". Se eu faço uma piada sobre o Juca (Chaves) dizendo que ele tem o nariz grande, ele não pode reclamar. Mas se eu fizer uma piada dizendo que ele é seqüestrador, ele pode me processar. E com razão, entende? 

Homem & Mulher — Como é que você vê o sistema político implantado há 17 anos no Brasil?

Chico Anysio — Vejo tudo isso com a cabeça fria, porque não tenho culpa nenhuma do que aconteceu. Eu votei no Marechal Lott. Sou do pobre, do preto e do desempregado. E até do assaltante. Eu sou a favor do preso, do menor abandonado...

Homem & Mulher — E a "abertura", e o liberalismo, e...

Chico Anysio — Acho que todos os excessos são demasiados. Outro dia eu comentava com um amigo que, atualmente no Brasil, só se faz filmes de sacanagem. Mas acho que essa "abertura" acontece no mundo inteiro e é um processo irrefreável.

Homem & Mulher — Você acredita nela?

Chico Anysio — Eu habito nela. O acreditar não é importante. Acho que não há como evitar, há como maneirar. Se eu só dissesse palavrões nos meus shows, certamente não surtiriam efeitos.


"A MULHER MANDA HÁ MUITO TEMPO"


Homem & mulher — Falar em sacanagem, tem uma história aí que diz que nordestino é homem "até debaixo d'água". Machismo? O que é que você acha disso?

Chico Anysio — Para mim, esse negócio de machismo é um equívoco. Não tem nada a ver. Acho que a gente andando em dois encontra o caminho mais fácil. O feminismo é a mesma coisa. Aliás, o feminismo nasceu por descuido de uma geração. Besteira pura, porque entendo que a mulher manda há muito tempo. Ela é o meio-campo.

Homem & Mulher — E os outros? Existe o homem e a mu- lher e os outros: "bicha", "sapatão", o escambau.

Chico Anysio (soltando uma risada) — É isso aí. A "sapatão" descobriu que mulher é uma boa, coisa que nós já sabíamos há muito tempo. Mas é uma minoria tão menor que não me preocupa. Inclusive, se eu fizer uma piada sobre "sapatões" não vai funcionar porque há mulheres que nem sabem que isso existe. Portanto, não faz sentido eu me preocupar.

Homem & Mulher — Chico, você não acha que o lesbianismo está aumentando cada vez mais?

Chico Anysio — Não sei, talvez sim, talvez não. Mas acho que o homem perdeu um pouco o romantismo. E a mulher sente falta disso, sem dúvida. Então, se vem uma pessoa e dá atenção à mulher, carinho e tudo o mais, a mulher vai se ligar, se prender a essa pessoa. A mulher quer se sentir mulher, isto é lógico. Também acho que homem nenhum tira uma mulher de outra mulher. Mulher que transa com mulher, "só" transa com mulher. É isso aí. E olha que tenho experiência própria.

Homem & Mulher — Esse tipo de mulher não sabe o que está perdendo...

Chico Anysio — Às vezes até que a danada sabe, só que pensa que acabou. Já tive implicações com mulheres que gostavam de outras mulheres. Mas eu só soube disso depois, porque se soubesse antes eu nem tentava. É uma pena, porque ninguém faz o "gol" sozinho. Alguém tem que dar a bola, é ou não é?


quinta-feira, 27 de março de 2025

EU E MEUS BOTÕES (84)

Hummm... Tá faltando alguém... Cadê o Lampa?

Zilidoro dá uma risadinha safada. Barrica cutuca o mamo Biu, enquanto é observado por Mané, Zé e Zoião. 

Sentados, num banco rente à parede, se acham Pitoco e Fuinha. 

Maria passa os olhos na sala perguntando por onde anda Olavim, que já começa a ser apelidado de O Sumido. Zilidoro:

"Seu Assis, o Lampa tá que tá! Tem feito a barba e penteado o cabelo todo dia...".

Zoião interrompe pra dizer que "O Lampa está ultimamente todo vaidoso. Acho até que ele tem tomado banho todo dia, coisa que não fazia há muitos anos".

Ah! É, é? A que se deve isso? 

Zé, um tanto matreiro, com um sorriso irônico no canto da boca diz depressa: "É amor! É amor!".

Mané: "Eu acho também. E acho que o motivo disso tem a ver com dona Flor".

A fala de Mané provocou risos gerais, menos na historiadora. Para agravar a situação, Lampa deixa o banheiro enxugando o rosto e passando em si mesmo um perfume de péssima qualidade. Ele vem penteado e sorrindo numa ingenuidade de dar pena. E pela primeira vez dá boa tarde, com voz caprichada. Nisso, chega silenciosamente à sala o tão esperado Olavim. Ao vê-lo Barrica vai logo perguntando qual o seu mundo de origem. Pitoco cutuca Fuinha, que pisca pra Olavim. O silêncio é total. Sorrindo, Olavim dirige-se a Barrica:

"Já ouvi pessoas dizerem que são cidadãs do mundo. Eu posso dizer que sou um cidadão dos mundos. Conheço de perto muitos planetas, além dos oito que são indicados nas escolas por professores. As estrelas não conheço todas, até porque se acham na casa dos bilhões. Quando me canso dos passeios que faço, bem além da Via Láctea, corro pra descansar na Lua".

Ouve-se um ôôôôh geral. De queixo caído se acham quase todos. Flor Maria:

"Poxa! Que história fantástica!".

Pois bem, realmente é incrível essa história do Olavim. Satisfeito, Barrica?

"Barrica parece que se acha no mundo da lua", diz rindo Mané. 

Todos caem numa risada só. Até Olavim dá um ar da risada, enquanto desaparece como num passe de mágica. 

Flor, você costuma ler histórias de ficção científica? Eu gosto e gosto de autores como Isaac Asimov. 

Rindo, Flor responde: "Passei a gostar dessa tipo de literatura depois que descobri um cara chamado H.G. Wells. Esse cara estreou na literatura em 1895, com A Máquina do Tempo. Em seguida, ele escreveu O Homem Invisível. Esse é de 1897. Em 1898, Wells lançou A Guerra dos Mundos. Mas também gosto de Asimov, Arthur C. Clarke e Ray Bradbury. E vocês aqui, também gostam de ficção científica?". 

Um pequeno tumulto se forma rapidamente, com todos querendo se sobressair dizendo que gostam desse ou daquele autor. 

Bom, chega né? A hora já bateu seu tempo e ainda tenho de pegar o trânsito. 

domingo, 23 de março de 2025

EU E MEUS BOTÕES (83)

"Olha lá, olha lá, olha lá, pessoal!", disse em voz alto chamando a atenção dos amigos botões, Mané. 

Num passe de mágica, quase todos se levantaram. Mané:

"Agora quem está rindo à toa é a dona Flor!".

Oi, pessoal! Ué, por que vocês estão aí de pé esperando pela gente? Zilidoro:

"Seu Assis, pra ser franco devo dizer que as reuniões com o Sr. têm sido ótimas, mas depois que a dona Flor chegou aqui houve, da parte de todos nós, um interesse maior pela...".

"Isso mesmo, isso mesmo! A gente escolheu Zilidoro porque o Zili fala com mais desembaraço do que nóis", disse no seu jeitão um tanto estapafúrdio o Lampa. 

Obrigado, obrigado. Devo dizer que estou muito satisfeito com todos vocês...

"Essa é boa! Eu pago uma depois!", interrompe com cara de bobo o solerte Barrica.

Hummm.... Calma, calma...

"Bom pessoal, quando aqui há pouco chegamos ouvimos alguém ou mais de alguém chamando a atenção de que eu estava rindo. Sabem por que eu estava rindo? Eu estava rindo porque eu passei a gostar de vocês", disse com seu jeito natural a historiadora Flor Maria. Na verdade, nem chegou a dizer a frase completa porque a casa encheu-se de palmas e urras. E de repente, surpreendentemente Olavim, Pitoco e Fuinha incrivelmente se sobressaíram dizendo que nunca viram pessoas tão interessantes, juntas, se entendendo. Todos voltaram-se aos três novos amigos. 

Pitoco olhou pra Olavim, que olhou pra Fuinha. Fuinha:

"Eu vou usar aqui uma palavra que o seu Assis sempre fala: Vocês são incríveis".

Pitoco olha pra Olavim, Olavim olha pra Pitoco. 

Lá detrás, Biu e Barrica dizem: "Queremos saber se Olavim é daqui ou do Além?".

Calma, pessoal! Desse jeito a gente não vai chegar a canto nenhum.

"Seu Assis, eu tenho certeza que a dona Flor concorda que temos de saber quem está com a gente", expressa na sua linguagem natural o Zé. Dona Flor balança a cabeça concordando com o que foi dito.

Displicentemente Fuinha dá um toque de cotovelo no seu amigo Olavim. Numa fração de segundos, Olavim se levanta e diz que está adorando o lugar onde está. 

Silêncio... 

Fique à vontade, amigo novo Olavim. É claro que há uma grande curiosidade sobre você...

"Amigos, aposto tanto no Olavim quanto o Zilidoro aposta em mim. Mas eu não sou nada, não sou ninguém. O Olavim vai surpreender muito", diz o Fuinha de modo peremptório. De repente, Olavim se levanta de onde está e diz:

"Eu sou de longe, vim de longe. Antes de mim, outros vieram".

Depois de dizer o que disse, o lugar onde estava Olavim ficou vazio. 

sábado, 22 de março de 2025

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (173)

PEGANDO O LEITOR À UNHA

Foi preciso, primeiro, que o livro fosse traduzido e fizesse sucesso na Itália, para que os editores brasileiros criassem coragem de lançá-lo. Mas a coragem não foi suficiente. A censura cassou o livro e, somente depois de muita espera, Ignácio de Loyola Brandão conseguiu que o seu romance Zero chegasse ao leitor do seu País. Autor de oito títulos (entre eles, “Pego Ele, Silêncio”, “Dentes ao Sol”, “Cuba de Fidel” e “Cadeiras Proibidas”), traduzido na Itália, Espanha, Alemanha e França, Loyola abdicou o jornalismo há menos de um ano para se dedicar apenas à sua tarefa literária. Entretanto, longe de se encastelar em seu gabinete, ele faz de cada livro ser um motivo de comício. E vai por esse Brasil afora buscar seu leitor e conhecê-lo. Um escritor que se projetou nos anos 70, Ignácio de Loyola Brandão fala da sua experiência ao repórter Assis Ângelo.



FOLHETIM — Loyola, seria possível fazer um retrospecto dos anos 70, na área da Literatura, sem se falar no regime autoritário, na censura oficial?

LOYOLA — Claro que não. Essa década foi o período mais brutal acontecido no Brasil. Os anos 70 foram os anos da repressão a todo tipo de criação.

FOLHETIM — Não houve período pior?

LOYOLA — Bom, há bem pouco tempo, numa mesa redonda feita na Unicamp, em Campinas, São Paulo. Roberto Schwartz levantou uma questão curiosa. Na ocasião, ele disse que a censura dos anos 70, apesar de muito violenta, não foi tão grande quanto a do Estado Novo. Mas eu não conheci aquela, eu conheci essa. Inclusive eu fui atingido pessoalmente pela censura da década passada, e é dela que eu posso falar. A censura imposta pelo regime me mostrou uma coisa muito importante, que não adianta brigar sozinho. Então, de repente, percebi que era necessário todo mundo brigar junto contra o inimigo, no caso o Sistema. Esta é uma das lições que aprendi.

FOLHETIM — Mas há quem diga que os escritores são alienados.

LOYOLA — Antes de tudo, eu acho que o grande acontecimento dessa década, em relação à literatura e ao escritor, foi exatamente isto. Gradualmente, à medida em que os anos foram avançando, os escritores, que são uma raça vamos dizer assim isolada, que lutam por uma solidão e que acham que a criação é uma coisa que não tem a ver com a vida política, com briga, com mudança de condições e com a transformação do País — os escritores não alienados — eles entenderam, de repente, a necessidade de lutar contra o inimigo comum: a censura, o Sistema. E a partir desse momento, houve a união. Portanto, acho que a primeira grande marca dos anos 70 foi a união dos escritores.

FOLHETIM — Concretamente, o que resultou disso?

LOYOLA — Resultou no fortalecimento do Sindicato dos Escritores no Rio de Janeiro, ao mesmo tempo em que começava a luta pelo Sindicato dos Escritores em São Paulo. Quer dizer, já temos uma casa sindical com uma diretoria embora, pessoalmente, eu não esteja completamente de acordo com ela. No entanto, temos mais é que brigar, criar uma chapa e renovar. Em Belo Horizonte já há uma Associação, que é o primeiro passo para a formação de um Sindicato. No Rio Grande do Sul já tem isto: e em Goiânia os escritores estão brigando unidos e em breve, também terão seu Sindicato. Do jeito que a coisa está indo, em pouco tempo teremos uma Federação.

FOLHETIM — Quando os escritores começaram a despertar para a gravidade da situação e partiram para a briga?

LOYOLA — Logo depois que foram proibidos livros como Zero, Feliz Ano Novo, Aracelli. Na ocasião, houve um movimento de âmbito nacional e 1946 intelectuais assinaram um manifesto que foi entregue ao então ministro Armando Falcão. Esse foi, praticamente, o primeiro movimento de escritores protestando concretamente a não aceitação da censura.

FOLHETIM — Você diria então que os anos 70 foram os anos da conscientização?

LOYOLA — Sim, pois de repente se abriram as cabeças. Escrever é um ato solitário, tudo bem. Mas somente enquanto estou na minha escrivaninha, escrevendo um livro. Depois disso, tem-se mesmo é de lutar, pois há uma grande luta lá fora. O país que está ali fora e é o País ao qual estou me dirigindo. Portanto, se esse País não ler, se esse País está reprimido, se esse País está violentado, então eu tenho de brigar pela transformação desse estado de coisa. Entendo que o ofício de escrever tem duas etapas. Algumas pessoas discordam disto, mas tudo bem. Eu até concordo que elas discordem. Para mim, o escritor tem de ter uma atuação política. Digo isso no sentido de transformação. E me parece que os autores brasileiros já estão tendo essa consciência, pois a gente tem de estar em constante estado de alerta. O inimigo pode atacar a qualquer instante, e por isso é preciso que estejamos preparados.

FOLHETIM — Lutou-se contra a censura, mas ainda há muito mais por que lutar.

LOYOLA — Claro, ainda há muito por que lutar. Por exemplo: direito autoral, mercado, etc. Há, mesmo, uma série de coisas, como a aposentadoria e até a profissionalização do escritor. No brasil não existe profissão de escritor. Se você disser que é escritor, as pessoas vão rir porque não existe esta profissão. Na verdade, o escritor existe apenas simbolicamente.

FOLHETIM — Nos primeiros anos da década, alguns escritores começaram a participar de debates e a aceitar convites para falar nas escolas, universidades…

LOYOLA — Essa experiência foi muito proveitosa, inclusive porque a censura não foi o único problema que enfrentamos. Descobrimos que tínhamos de sair às ruas, conversar com as pessoas, fazer comício enfim, ir ao encontro do leitor. Na ocasião, tínhamos várias interrogações, como: Quem é o leitor? Ele existe? Não existe? Se não existe, qual o motivo? Quem é o culpado dessa situação toda? O Sistema? A escola? O analfabetismo? O governo? A televisão? O pai? Ou os culpados somos nós mesmos? O preço do livro? O livreiro? O distribuidor? O editor? Ou tudo isto reunido? Sim, descobrimos que o problema era muito grande, eram todas estas interrogações e algo mais, como escritor silencioso.

FOLHETIM — E daí, o que foi feito?

LOYOLA — Bom, baseados intuitivamente numa experiência que a música popular brasileira enfrentou por volta de 1965, quando ela estava num impasse, num beco sem saída e descobriu o circuito universitário, nós, escritores, partimos em busca do nosso público. E então saímos às ruas, eu, Torres, Scliar, Miguel Jorge, João Antônio, Wander Pirolli, Márcio de Souza. Aí fizemos o circuito universitário. Não houve escola primária, secundária, organização, clube que a gente não tivesse feito contato. O resultado foi muito bom, e hoje, se estou vivendo de livros, exclusivamente, é graças a essa experiência. O trabalho ainda está rendendo, pois em cada cidade que passei eu deixei cinco, dez, vinte, 400 leitores.

FOLHETIM — Dá para saber quantas palestras você fez até hoje?

LOYOLA — Com precisão, é difícil saber. Só sei que estive em mais de 250 escolas nos últimos cincos anos.

FOLHETIM — No seu entender, o povo lê?

LOYOLA — Olha, falar em literatura para o povo é uma grande bobagem. Bobagem porque o povo não pode ler. Ele não está participando da realidade do País. E as razões nós todos sabemos. O povo não tem escola, ganha pouco  e por isso não pode comprar livro. O povo está mais preocupado com outras coisas, como o leite, o pão, a carne e com a própria família. O brasileiro trabalha tanto que, quando chega em casa, só pensa mesmo em descansar. Quem lê no Brasil é a elite, a classe média, os estudantes universitários. Então a gente termina se dirigindo a elite. Leitor no Brasil a gente conquista indo pessoalmente a ele — os meus leitores, pelo menos, eu os conquistei assim. Não houve outra forma.

FOLHETIM — E não há perspectivas de mudança?

LOYOLA — Não, pelo menos por enquanto. Antes, é preciso que o Sistema mude, que haja uma verdadeira revolução, com escola para todos, trabalho, comida, enfim, uma vida mais condigna. Somente a partir daí é que se poderá pensar em cultura. Mas como as coisas estão, não dá sequer para pensar em cultura. Somente com uma verdadeira revolução poderemos levar as pessoas a encontrarem nos livros uma forma de lazer. Hoje, no Brasil, cultura é uma brincadeira de gente rica, um hobby.

FOLHETIM — Antes dos anos 70, o escritor era considerado uma espécie de deus. Ele era colocado sobre algo como um pedestal. Agora, porém, percebe-se perfeitamente que este tipo de raciocínio mudou. Como se deu isso?

LOYOLA — Exato. O escritor era aquele indivíduo cultuado pelo professor de Literatura, de Letras. Mas o raciocínio começou a mudar no momento em que passamos a ter um contato maior com o leitor. O leitor percebeu que o escritor era um sujeito igualzinho a ele, que comete erros, fala errado, que ouve as mais diversas perguntas e para todas elas procura uma resposta, e quando não a encontra se mostra humilde e sincero, admitindo ou confessando sua ignorância. Portanto, a partir do instante em que a gente se expõe, o mito cai e fica o homem igual a todos os outros.

FOLHETIM — Fala um pouco sobre as andanças.

LOYOLA — Ah, eu tenho aprendido muito. Especialmente sobre a realidade brasileira, com detalhes mínimos. O Brasil não é só São Paulo e Rio de Janeiro. E isto parece que nem todo brasileiro está sabendo. O Rio Grande do Sul, por exemplo, é muito diferente de Goiás… Há poucos dias estive nas cidades de Bento Gonçalves, Farroupilha e Garibaldi. Lá, alguém me procurou dizendo que a feira de livros era um acontecimento importante para a juventude, principalmente , porque as moças aproveitavam como motivo para sair de casa a noite. Claro, fiquei abismado e disse: pôxa, em Araraquara, interior de São Paulo, há dez anos, as minhas primas de 16 e 17 anos saíam e voltavam no dia seguinte, às 7 horas da manhã. E não inventaram nenhum pretexto, chegavam e diziam aos pais: estivemos num baile. Quer dizer, não tinha problema nenhum e não necessitavam de uma feira de livro ou seja lá o que for para sair de casa à noite.

FOLHETIM — Realmente, chega a ser absurdo. No Rio de Janeiro, em São Paulo ou outro grande centro, dificilmente algo idêntico poderia acontecer. No interior do Brasil, porém…

LOYOLA — Pois é. Antes, eu imaginava o Brasil de outra forma, mas até então eu não conhecia as cidade menores. Por isto, acho que ainda há muita gente enganada a respeito da verdadeira realidade deste País. Quer dizer, nas minhas andanças eu tenho aprendido muito, muito mesmo. Tenho assimilado muitas informações… Chega a ser inacreditável que, num lugar qualquer do Brasil, uma menina de 17 anos precise de um pretexto para sair de casa à noite. Mas este é o Brasil que pouca gente conhece!!

FOLHETIM — Nos anos 70 falou-se insistentemente sobre um tal “boom” da literatura brasileira. Que história foi essa?

LOYOLA — Foi simplesmente um modismo resultante do boom latino-americano, que também não era um boom tão grande como se propagou. Na verdade, o boom latino-americano favoreceu a uma meia dúzia de monstros sagrados, como Vargas Liosa, Garcia Marques, Ernesto Sabato, Cortazar e alguns outros que se utilizaram da máquina. Eles aproveitaram aquele movimento das universidades norte-americanas e, pronto, faturaram em cima. Na verdade, o boom foi uma coisa ilusória, um negócio forjado. Em Cuba, quando alguém falava no tal boom todo mundo morria de rir.

FOLHETIM — Qual o grande momento da literatura brasileira nos anos 70? Esse momento chegou a existir?

LOYOLA — Não, creio que não. Publicou-se muito, especialmente depois de 1974/75. Alguns livros estouraram, como Zero e alguns outros. A crítica literária inclusive sumiu para dar espaço ao noticiário comum, que por sinal aumentou bastante. Mas houve um instante de euforia. Um cara chegava com alguns originais debaixo do braço, e dizia: sou novo. Imediatamente o seu livro era editado. No entanto, ser novo não significa nada. Aliás, ser velho também nada significa. O que importa é ser bom, ter o que dizer num livro. Os anos 70 foram de grande efervescência. É isto, no meu entender, foi positivo. Acho que é só.



[Nota: entrevista publicada originalmente no extinto FOLHETIM (FSP), no dia 13 de janeiro de 1980].


quinta-feira, 20 de março de 2025

EU E MEUS BOTÕES (82)

"Olha lá, olha lá, gente!", diz Mané eufórico, chamando a atenção dos coleguinhas. E todos voltam o olhar à porta por onde entra Flor Maria. "O seu Assis está logo atrás. Olha lá, olha lá. E ele está sorrindo".

Muito bem, gostei de ver. Agora quero saber o motivo de tanta euforia. 

De certo modo e pra começo de conversa, Lampa diz em nome de todos que a alegria que se vê é devida ao modo sábio de falar de Flor Maria.

Hummm... 

Com leve sorriso no rosto, a historiadora agradece o elogio e diz: "Falar é se comunicar. Comunicação é item necessário à boa convivência social. E falar de história falo com prazer, pois sempre é tempo de aprender".

Dito isso, com firmeza e brejeirice, Flor diz que está à disposição para qualquer pergunta que lhe façam sobre história. 

Zoião: "Dona Flor, achei muito interessante a leitura do polêmico livro Os Sertões. Acho que todos aqui poderiam lê-lo".

"Concordo, concordo. E a mim não custa dizer, mais uma vez e sempre, que ler é fun-da-men-tal.

Zé, aproveitando a deixa, abre a boca pra pedir de empréstimo a Zoião o livro de Euclides da Cunha. 

O trio Olavim, Pitoco e Fuinha está atento a tudo que ali se diz. 

Zilidoro: "Seu Assis, dona Flor, confesso que estou sem dormir desde ontem. Isso porque não me saiu da cabeça a ideia de o nosso novo amigo Olavim ser um ser de fora do planeta Terra".

Pra mim isso que você diz não é surpresa. Também não consegui dormir pensando no que foi dito. Nem café da manhã tomei direito...

Fuinha devagar foi se levantando. E disse: "Curiosidade mata".

"E mata mesmo. Curiosidade mata, sim!", reforça no seu jeito natural de ser o sempre enervado Lampa. 

Calma, calma. Deixemos o Fuinha dizer o que quer dizer.

"Obrigado, seu Assis. Sou muito amigo do Olavim. Pessoa rara, raríssima. E o que aqui digo tem a sua anuência. Ele confia em mim e eu nele...".

Os manos Bio e Barrica interrompem a fala de Fuinha pra perguntar: "Queremos saber é de onde vem o Olavim".

Calma, calma. Pra que tanta pressa?

"É de muito longe. Ele vem de lugar longínquo, de distância inimaginável pra nós mortais comuns. É pra lá de..., retoma à fala Fuinha enquanto Olavim dá sinais de que vai dar o ar de sua graça e responder as perguntas que lhe forem feitas. Num piscar de olhos, porém, no lugar que estava já não está. Sumiu, evaporou-se, sabe-se lá! Fuinha:

"Ele é assim mesmo, quando se sente ameaçado toma chá de sumiço e chau!".

Pelo jeito teremos bons papos no correr dos dias. Eu, particularmente, sou leitor assíduo de Júlio Verne, Isaac Asimov e outros bambas da ficção científica. 

"Eu também sou grande apreciador desse tipo de literatura. Além de Verne e de Asimov, também gosto de Arthur C. Clarke", revela o poeta Zilidoro. Zoião:

"Seu Assis, o sinhô sabia que o nosso Machado de Assis também enveredou na trilha desse tipo de ficção?".

Realmente, vocês estão impossíveis! Passo batido. Sei, no entanto, que há autores brasileiros de ficção científica. 

Zoião, todo orgulhoso: "Em 1882, o bruxo do Cosme Velho escreveu e publicou o conto O Imortal. Esse conto trata do enfado que seria a imortalidade humana".

Lampa, se ajeitando no tamborete: "No meu caso, seu Assis, estou fazendo uma pesquisa sobre esse assunto e também sobre o Cangaço".

Zé: "Muito bem, muito bem. Agora pergunto se vocês sabem que existe até o Dia Nacional da Ficção Científica?". Zilidoro:

"Eu sei, eu sei que esse dia existe. É o 11 de dezembro".

De repente,  como num passe de mágica, entre Pitoco e Fuinha se acha o incrível Olavim. 


quarta-feira, 19 de março de 2025

EU E MEUS BOTÕES (81)

 Olá, pessoal! Tudo bem?

"Tudo bem, seu Assis!", disseram todos.

Zoião, cada vez mais solto nas estribeiras, quase sem respirar, foi perguntando: "Dia desse ou tarde dessa, o sinhô ou dona Flor disse que o livro Os Sertões acaba com o autor contando que tudo em Canudos se acabou restando apenas três sobreviventes. Ouso discordar e discordo porque li cá com os meus próprios olhos que o final do acontecido é que, aspas por favor, Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança na frente dos quais rugiam enraivecidos cinco mil soldados".

Muito bem, Zoião. Gostei.

"Eu também gostei Zoião. Você está lendo Os Sertões?", pergunta entusiasmada Flor Maria.

"Se estou lendo, dona Flor? Não, não estou lendo. Já o li", conta orgulhoso e insuspeito Zoião, acrescentando: "Aliás devo diz também, pra ficar bem claro, que Antônio Conselheiro foi acusado de matar a esposa e a própria mãe.  A acusação era vazia, sem fundamentos". 

A fala de Zoião  levou entusiasmo aos presentes, que se levantaram batendo palmas.

Zoião, eu quero dizer: essa sua fala me deixa feliz. Isso porque leitura é fundamental na nossa vida...

"O escritor paulista Monteiro Lobato disse uma vez Quem lê mais sabe mais", interrompeu Zilidoro.

Pois é, pois é, vocês estão impossíveis. Você concorda, Flor?

"Claro, claro que concordo. É muito bom, bonito mesmo, conversar com pessoas como vocês".

Num relance, Lampa dá uma espiada geral na casa (de botões) e flagra Mané e Zé cochichando sob o olhar dos manos Biu e Barrica. Sabe-se lá como, mas o fato é que o nervoso Lampa descobriu que as duas duplas estavam a falar a seu respeito. Não disse palavra, mas a sua cara de poucos amigos fez as duplas silenciarem. Eu vi o movimento e não deixei de rir. Surpreendentemente, Lampa pergunta se Euclides da Cunha escreveu sobre o Cangaço. A pergunta é dirigida à historiadora que diz:

"Lampa, Euclides não viveu no tempo de Lampião. O seu velho parente nasceu em 1898 e o autor de Os Sertões em 1866. Lampião foi morto de emboscada em 1938. Quando Euclides morreu, de tuberculose, Lampião tinha apenas 11 anos de idade. Ele caiu no cangaço no começo dos anos de 1920. Satisfeito?".

Lampa diz que sim, que está satisfeito e que gostaria de saber mais sobre o assunto. 

Barrica, quieto até então, pergunta à Flor Maria se está sabendo da doença do papa Francisco e do inferno que voltou a provocar Israel na Faixa de Gaza. Flor diz que sim.

Pois é, o mundo está pegando fogo. Dá pra perceber que a guerra deflagrada por Putin contra a Ucrânia ainda vai continuar, pois Putin não quer paz e paz também não quer na Faixa de Gaza o mandachuva de Israel, Netanyahu. E acabam de voltar à Terra os dois astronautas que foram ao espaço para um tempo de oito dias e por lá ficaram sem querer por nove meses. 

"Como é mesmo seu nome?", pergunta a historiadora dirigindo-se a Olavim, que surpreendido gagueja sem saber bem o que dizer. Fuinha pede licença pra dizer o seguinte: "Dona Flor, o Olavim é um cara que não é daqui. Digo isso e não digo mais".

Como é que é? 

"Não entendi, confesso que não entendi", diz embatucada Flor Maria. 

Bom pessoal, voltaremos ao assunto. Sim, esse mesmo: astronautas e tal.



domingo, 16 de março de 2025

EU E MEUS BOTÕES (80)

Bom, minha gente, hoje ninguém há de dizer que cheguei atrasado. Já dona Flor...

"Dona Flor está chegando, está bem atrás do senhor, seu Assis", diz o desenvolto Barrica. E todos ali se levantam batendo palmas. Flor: "Obrigada, pessoal, assim vocês me deixam sem jeito".

Hummm... Realmente você nos surpreende, Flor Maria. 

"Deixa disso, Assis. Estou,  como sempre, de bem com a vida".

Flor foi chegando e espalhando bom astral e um perfume de cheiro inebriante. Num fechar d'olhos, Lampa levanta-se como um raio em direção ao banheiro. Sua ação não passou desapercebida. Olhei nossa historiadora que riu de forma assim-assim à toa. Os olhares de todos os botões voltaram-se ao cabra Lampa que num minuto voltou passando a mão no rosto,  na camisa... Foi quando o Lampa percebeu os olhares irônicos e sem se conter grunhiu entredentes, já com a mão no seu indefectível punhalzinho: "O que que há, o que que há? Nunca viram macho, não??"

O comportamento do cabra Lampa provocou uma risada incontrolável. Flor Maria: "Vamos parar com isso, pois somos todos aqui amigos".

Zilidoro: "Dona Flor, a última vez que a senhora aqui esteve nos falou sobre o massacre de Canudos. O Euclides, autor do livro Os Sertões, cobriu o massacre do começo ao fim?".

Depois de agradecer a pergunta, a historiadora disse que o escritor e jornalista nunca esteve no campo de batalha. Não conheceu o Conselheiro e o máximo que fez foi andar um pouco pelas vielas que ele chamaria de Troia de Taipas. Ficou na região menos de um mês. Na verdade, Euclides chegou a Canudos no dia 16 de setembro de 1897".

A maioria dos botões presentes fez um "Oh! Oh! Oh!...Puxa!!!".

Zoião, com aquele jeitão de quem tudo vê, perguntou se é verdadeira a frase "O sertanejo é antes de tudo um forte".

"Acho que é verdade, sim. Mas acho que o Assis poderia falar um pouco a respeito".

Bom, o livro é muito controverso. Tem muita coisa boa e outras coisas nem tanto.  A frase a que se refere o querido Zoião é verdadeira e o seu autor é Euclides. E antes que me perguntem, acrescento que Euclides era preconceituoso, muito preconceituoso. E até racista. Achava que o branco era a "raça" dominante. Pra ele havia raça e "sub-raça". Achava que mulato, mestiço, curiboca era gente fraca.  De certo modo, dava algum valor ao vaqueiro. 

"É isso mesmo, o Assis tem razão. O livro tem três partes: A Terra,  O Homem e A Luta. Essa última parte considero a mais legível, pois mesmo com algumas cenas ficcionais, prevalecem dados históricos".

"Estou curioso, quero ler esse livro. Tem muitas páginas?", pergunta Mané.

"Os Sertões foi publicado em dezembro de 1902. A primeira edição foi bancada pelo autor. No original tinha cerca de 500 páginas, talvez mais. A sétima edição, considerada definitiva com acréscimos do autor feitos de próprio punho, foi publicada em 1923", explicou a historiadora. 

No canto da sala onde costumeiramente nos encontramos Olavim, Pitoco e Fuinha quietos estavam e quietos ficaram enquanto tudo ouviam.

Bom, está na hora do lanche. Vamos nessa pessoal?

Zé pediu licença pra perguntar: "Seu Assis, ouvi em algum lugar alguém dizer que já faz 40 anos que vivemos na Democracia, é verdade?".

Sim, foi no dia 15 de março de 1985 que o maranhense José Sarney foi empossado como presidente do Brasil no lugar do mineiro Tancredo Neves. A ditadura militar foi aqui instaurada no dia 1° de abril de 1964, depois de Jango ser posto pra correr. Antes, e isso é história, militares da Aeronáutica armaram uma operação denominada Mosquito. A ideia era derrubar o avião onde se achava Jango, pouco depois de Jânio renunciar. Jango morreu em 1976. Um século antes, o imperador Pedro II se achava na Síria. Nesse mesmo ano, Antônio Conselheiro era preso pela polícia acusado de matar a esposa e a própria mãe. Agora chega, né?

Olavim, Pitoco e Fuinha foram os primeiros a se levantar e a bater palmas.


sábado, 15 de março de 2025

LICENCIOSIDADE NA CULTURA POPULAR (172)


De todas as regiões do Brasil, estatisticamente o Nordeste é a mais sofrida. A seca chegou lá e lá ficou.

Apesar das intempéries, o Nordeste e sua gente continuam insistindo em viver. Com graça, inclusive. Os exemplos são muitos. 

Chico Anísio fez sucesso e deixou saudade e pupilos como Tom Cavalcante.

São muitos os artistas talentosos que andam por aí espantando mau olhado, mau humor e desgraças de todo tipo que nos incomodam no dia a dia. 

Quando ouço Jessier Quirino declamando acho sempre graça. Das boas. O cabra tem presença. 

Quando ouço Jessier Quirino declamando lembro do Chico Pedrosa e do velho Patativa do Assaré. 

Quando ouço Jessier Quirino declamando lembro do querido Orlando Tejo, que usou seu talento para recriar Zé Limeira e sua obra. 

Digo isso com firmeza. 

E digo mais: quando ouço Jessier automaticamente lembro de outras belas figurinhas carimbadas como Rolando Boldrin, João Cláudio Moreno e Klévisson Viana, por que não?

Pois bem, Jessier Quirino traz consigo o talento do mundo. É autor e declamador de alto nível. Nasceu na Paraíba. Tem livros e discos lançados na praça. 

Outro dia peguei Jessier de jeito e tasquei-lhe perguntas que você meu amigo, minha amiga, pode conferir lendo o que segue aí abaixo:


ASSIS ÂNGELO — Como você vê a questão da licenciosidade nos dias atuais?

JESSIER QUIRINO — Licenciosidade partindo de quem se revela um desregrado moral, vejo como algo deplorável a qualquer tempo. Já o licencioso como objeto, texto, música etc., mesmo ferindo questões de virtude, educação e tudo mais, se estiver dentro de certas regras (fugir do escatológico), modos e circunstâncias, me parece palatável e digno de risos e aplausos. Destacando que sempre carece de uma boa embalagem para ser dita, escrita e representada. 


ASSIS Vê hipocrisia em condená-la? 

JESSIER — Acho que há uma boa dose de hipocrisia sim, devido ao quão falso são o caráter e a moralidade das pessoas, principalmente aquelas supostamente mais importantes, educadas, cheias de recatos e princípios religiosos, que a condenam até mesmo na arte. Mas foi me valendo da licenciosidade verbal que sobrevivi em colégio noturno e até botei o pé na poesia e nos palcos da vida.


ASSIS Como se deu isso?

JESSIER — Eu, rapazote de 16 anos, me beneficiei e muito por fazer uso da dita imoralidade em verso e prosa. Isso para despistar uma timidez aguda em território hostil de sala de aula no turno da noite no Colégio Pio XI, em Campina Grande. Eu trabalhava durante o dia e estudava no 3º turno onde a faixa etária dos colegas era muito desigual. Isso me obrigou, a bem dizer, ser artista e abrir os braços pra não ser engolido. Por quem? Por quem fumava, bebia, raparigava,  brigava, tinha carro e inda por cima era conquistador. Os bambambãs do lugar.


ASSIS Como foi conviver com isso na cabeça? 

JESSIER — Eu, coitado, zero tiquinho de pessoa, não tinha nenhum desses predicados. Na devassidão, eu era o mindinho do pequeno polegar e no comportamento era amoitado que só carneiro que tomou bicho na capação. E assim mesmo precisava sobreviver.  Era o segundo caçula de Seu Quirino - um homem cordial, poeta, de bons modos, culto e afável – fui dando de garra da poesia fescenina de domínio público que aprendia com a molecada do bairro. E tome paródias, declamação e loas em corredor de escola e só assim consegui ser respeitado. Depois virei declamador com a “pegada” matuta, depois virei poeta.


ASSIS Frequentou cabaré?

JESSIER — Penso, talvez, que ser putanheiro é uma aptidão que se herda. Um “talento” que nunca tivemos lá em casa. Éramos quatro filhos homens. Já entrei em cabaré pra tomar cerveja e me fazer de escroto. Mas tinha lá certa vontade de ver a música e dança da noite: Apolo na bateria e Jaime no piano, no Luz-Vermelha de Cazé lá em Campina Grande.

Fui lá, subi a escadaria, fiz cera, mas ainda era cedo pra tal música ao vivo.  


ASSIS Os cabarés de hoje já não são lá essas coisas…

JESSIER — A concorrência pesada derrotou o seguimento e a decadência impera. Mas como bom roteirista que sou e prestador de atenção da experiência alheia, boto olho de tejo no assunto e ouvido na escuta. É material de pesquisa. 

Um amigo meu chegou a morar durante três anos dentro dum cabaré aqui em Itabaiana. Exímio raparigueiro, pouca grana e bom de papo, convenceu a dona a ocupar o único espaço vago da casa: um quarto de duas portas, na esquina da sala para o corredor, que tinha uma radiola engavetada na porta da frente e que cantarolava pra sala. Morou nesse quarto e conta que nos domingos de manhã debulhava feijão verde no quintal arrodeado de quenga entre fuxicos e risadas. Pode?


ASSIS Que outras lembranças você tem?

JESSIER — Poucas. Basicamente a música. O sotaque dançante dos boleros, o brilho dos azulejos do boteco e portas de pano estampado. Mas a música é realmente o que marca. Só agora dou fé do quanto havia de produção naqueles discos: arranjos bem feitos, músicos talentosos, pianos e demais instrumentos. Uma mini orquestra.

  

ASSIS — Você lembra algum poema escrachado?

JESSIER — Lembro sim, dos mais ingênuos até um retrato-falado vaginal. 


A Ingênua é uma musiquinha:


Dona Maria o seu gato deu

Vinte cinco pirocada na bunda do meu

De novo!

Dona Maria o seu gato deu

Vinte cinco pirocada na bunda do meu


Já deu tá dado

Piroca de gato, não faz mal a ninguém

Já deu tá dado

Piroca de gato, não faz mal a ninguém


O Retrato Falado Vaginal é:


A buceta é uma gruta

De cabelo arrodeado

Tem parte que é enxuta

E tem parte que é molhada

É o roçado da puta

Consolo do vagabundo

Fica a dois dedos do fundo

Mas, pra aqueles que vêm nascendo

É a porteira do mundo


ASSIS - Nos velhos cabarés sempre teve música de putaria nos mais diferentes rítmos… 


JESSIER- Músicas, além dos boleros dançantes e samba canção, eram os sambas de latada ou samba de gafieira tocados nos bares. Lembro também de Abdias dos 8 baixos cantando Minha ex-Mulher: Coiatada da mulher que já foi minha / Hoje vive tão sozinha / Perambulando na rua  / Ninguém me ama / Ninguém me quer / E como sofre minha ex-mulher


E tem ainda o clássico de João Silva, Pra Não Morrer de Tristeza:


Mulher 

Deixaste tua moradia

Pra viver de boemia

E beber nos cabarés...


Na Rádio Borborema de Campina Grande o programa Forró do Zé Lagoa, do mestre Rosil Cavalcanti, tocava o clássico de Jackson do Pandeiro Forró em Campina que cita nomes dos cabarés (e de prostitutas) da época: 


Ó linda flor, linda morena

Campina Grande, minha Borborema

Me lembro de Maria Pororoca

De Josefa Triburtina e de Carminha Vilar

Bodocongó, Alto Branco e Zé Pinheiro

Aprendi tocar pandeiro nos forrós de lá


ASSIS — Na sua formação cidadã como entrou a licenciosidade?

JESSIER — Antes de mais nada, a mulher tem que ser respeitada. Havia sim um padrão Seu Quirino de civilidade na família. Na comissão de frente: educação, honestidade e respeito, sem exageros. Tinha de tudo um pouco do que tinha no Colégio. Os temas devassos eram assuntos de rua, de conversa de calçada e dos famosos “bacuraus”, que eram encontros noturnos de conversa fiada em esquinas estratégicas no esfriar da noite. 

E assim cresci. Dizer qualquer coisa pesada e com arte, como citei no início, era uma questão circunstancial. O acessório principal viria a ser a composição declamada com segurança. O texto pronto, a personagem e o tempo. Dizer quando? A qualquer momento a depender das circunstâncias. Aí nasce o compositor. Mas, mulher tinha que ser respeitada.


ASSIS — Alguma curiosidade autoral na área da licenciosidade? 

JESSIER — Algumas histórias autorais viraram clássicas.  Ex: O Matuto Doente das Partes, que conta a cirurgia de hemorroidas e outras mais:

 

UM RAPAZINHO FODAZ   -   (publicado no livro Bandeira Nordestina Editora Bagaço)

MATUTO DOENTE DAS PARTES  -  Cirurgia de hemorroidas  ( publicado no livro Agruras da Lata d´água – Editora Bagaço)

RELEMBRANDO A CHUPADELA  -  História de Bill Clinton e Mônica Lewinsky  ( Inédito)

SE ACHAR RUIM, COITE-SE!  - Um poema fescenino, baseado no clássico poema “SE” do poeta inglês Rudyard Kipling (1865 – 1936).   (Inédito)

MANIFESTO DA FUDENE (publicado e posteriormente retirado do livro Agruras da Lata D´água)


UM RAPAZINHO FODAZ

Jessier Quirino 


De primeiro, uma revista

Era a maior das conquistas

Dum rapazinho fodaz

Amaridado com ela

Era aquela coisa bela

Sonhando de paz em paz


Ele sorria e beijava

E ela de puta ria

Era revista rameira

Flor de lodo, messalina

Biscaia, franga, dadeira

Tolerada e pistoleira

Com semblante de felina


Sem cancha pra vadiagem  

Ou pra luz de cabaré

O jeito pra o rapazinho 

Era correr pro migué


Migué de porta fechada

E a revista escancarada

Querendo se desfolhar:

Tanta coisa em coisa-fofa

Tanto fruto proibido

Maçã de Adão provar...


Tanta matinha encantada

Tanto ventre, tanta furna

E tantos lábios vulvares

Pro mundo se envaginar


Tanta peça mamalhuda

Peitudinha, bundudinha

Luz-em-cu sem pirilampo

Tanta feira de mulher...


Tanto estrabismo nos olhos

Tantas vogais pelos lábios

Tanto fêmur almofadado

Antes de ser oboé


E o rapazinho fodaz

Amativo pela vista

Namorava essa revista 

Gozando de paz em paz

De garra com os possuídos

De punho masturbativo

Era aquela liberdade 

Misturada com prisão:


Teje solto, teje preso

Teje solto, teje preso

Teje solto, teje preso

Teje solto, teje preso...


A professora chega...

– Menino?!

– Professora! 

A senhora não morre tão cedo


MATUTO DOENTE DAS PARTE 

Jessier Quirino


No tronco do ser humano

Nos finá mais derradêro

Tem uma rosquinha enfezada

Que quando tá inflamada

Incomoda o corpo inteiro


Se tossir se faz presente

Se chorar se faz também

O cabra não pode nada

Com nada se entretém

Eu lhe digo meu cumpade

Não deseje essa maldade

Pra rosca de seu ninguém


Não sei o nome da cuja

Desta cuja eu tiro o “ja”

O que resta é quase nada

Bote o “nada” na parada

Quero ver tu aguentar?!


Eu lhe digo meu cumpade

Que é grande humilhação

Um cabra do meu quilate 

Adoecido das parte

Fazer uma operação


Não suportando mais dor

O meu ato derradeiro

Foi procurar um doutor

Do “Bocá do Arenguêro”


Do Bocá do Arenguêro

Fejoêro,  Fiofó

Bufante, Frescó e Lôrto

Apito, Brote e Bozó


De Furico, Fedegoso

Piscante, Pelado e Bóga

Fosquete, Frinfra e Sedém

Zuêro, Ficha e Vintém

De Ás de Copa e de Fóba


De Oití, Ôi de Porco 

Ané de Couro e Caguêro

De Gira-Sol e Goiaba

Roseta, Rosa,  Rabada

Bôto, Zero e Mialhêro


De Nó dos Fundo e Buzéco

De Sonoro e Pregueado

Rabichol, Furo e Argola

Ané de Ouro e de Sola

Boca de Véia e Zangado


Um doutô de Aro Treze

De Peidante e Zé de Bóga

Que não aperte o danado

Nem deixe com muita folga


Um doutô piscialista

Em Bocá da Tarraqueta

Doutô de Quinca e Dentrol

Zebesquete e Carrapeta


Doutô de Rosca, Rosquinha

Tareco, Frasco e Obrom

Ceguinho, Butico e Zero

Tripa Gaitêra e Fon-Fon


Mialhêro e Mucumbuco

Buraco, Brôa e Boguêro

For Ever, Cruaca, Urna

Gritadô, Frande e Fuêro.


Cano-de-Escape e Pretinho

Rodinha, X.P.T.O. 

Zerinho, Subiadô

Tripa Oca e Fiofó.


Um doutô de Helidório

Ou de Boca de Caçapa

Que não seja inimigo

Também não seja meu chapa

Tratador de Canto Escuro

De Boréu ou de Cheiroso

De Formiróide e Alvado

De Parreco e de Manhoso


De Chambica e Cibazol

Apolonio e Fobilário

Bilé, Briôco e Roxim

Fresado, Anílha e Cagário

Vazo Preto, Zé Careta

Olho Cego e Espoleta

Fuzil, Fiôto e Fuário


Não é doutô de ovário

É doutô de Oriol

De Cá-pra-nós e  Bostoque

De Futrico e de Ilhó


De Culiseu e Caneco

Roscofe, Forno e Botão

De disco, de Farinheiro

De Jolí, Fundo e Fundão

De Quo-Vadis e Fichinha

Que não venha com gracinha 

E que que não tenha  dedão


Um doutô de Zé de Quinca

Canal 2 e Cagadô

Buzina, Vesúvio e Cego

Federá e Sim-sinhô

Fagulhêro e Zé Zoada

Rosquete, Fim de Regada...

...Eu só queria um doutor


O doutô se preparou

Parecia Galileu

Aprumou um telescópio

Quem viu estrela fui eu

Ele disse arribe as perna

- Tenha calma, sonho meu!

A partir daquela hora

Perante Nossa Senhora

Não sei o que sucedeu


C`as força da humildade

Já me sinto mais milhó

Me desejo um anus novo 

Cheio de verso e forró 

Pros cumpade, com franqueza

Desejo grande riqueza:

Saúde no fiofó


RELEMBRANDO A CHUPADELA                   

Jessier Quirino

 ( Inspirado no mote de Alan Sales )


Foi na sala oval da Casa Branca

Que Biu Clinton hasteou seu berimbau

Chupistério maior não teve igual

E o mondrongo Lewinsky quase arranca

Presidente saiu botando banca

Pau-babado, machudo e comilão

A bruaca tacou-lhe uma versão

Que foi vítima daquele pau viril

O chupão que a Lewinsky deu em Biu

Custou caro para o Clinton garanhão


Ao desencaralhar seus possuídos

Da garganta daquela estagiária

Carimbou uma nódoa ordinária

E orgasmática no colo do vestido

Uma prova cabal de ter havido

Boceteio, ou qualquer xumbregação

E a bruaca fez a reclamação

Com a impressão genital do seu xibiu

O chupão que a Lewinsky deu em Biu

Custou caro para o Clinton garanhão


Viciado em rolhar uma perseguida

Pela cuja se achava perseguido

Biu-femeeiro, broxado e deprimido

Prometeu nunca mais foder na vida

Toda livre-fodança foi banida

Das alcovas e salas da mansão

E o Pentágono fez uma preleção:

“Putaria que é bom nem mais um piu”

O chupão que a Lewinsky deu em Biu

Custou caro para o Clinton garanhão


Nesta casa tão cheia de brancura

Já se viu muita escolhambatriz

A Lewinsky, fregona e meretriz

Por ali puteou e quis ser pura

Fuxicou pruma amiga de aventura

Que entregou à justiça a gravação

Foi fuxico no cu desta nação

E a nação dando corda ao mulheril

O chupão que a Lewinsky deu em Biu

Custou caro para o Clinton garanhão.


Êta feladaputa de azar

É o coitado do dito presidente

Bolofôtica, rameira e indecente

Foi a tipa que o leso quis champrar

Paula Jones foi outra que a chorar

Quis “pensão de priquito” de um milhão

Se disser que comeu vai pra prisão

Se mentir, toma dentro pois mentiu

O chupão que a Lewinsky deu em Biu

Custou caro para o Clinton garanhão


Ô país invocado é os Isteites

Machear ninguém pode machear

Se o sujeito quiser gavionar

Tem que vir pro Brasil mamãe-de-leite

Puteagem-política tem aceite

Pelas vias-urinárias da razão

Vaginosa ou macheira de plantão

Foi escrota a justiça faz psiu!

O chupão que Lewinsky deu em Biu

Custou caro para o Clinton garanhão.


MANIFESTO DA FUDENE

Fudedeiras Desenvolvendo o Nordeste

Jessier Quirino


Meus amigos fudedores

Gigolôs e cachaceiros

Ilustres raparigueiros

E todos da região!


Se a FUDENE não fudesse

Não fosse mulher bolida

Se não quengasse na vida

Não tava na eleição

Disputou com puta a puta

Mas trouxe no fim da briga

Um coral de rapariga

Pra cima do caminhão


Trouxe Zefa  Pragatão

Trouxe Priquito de Frande

Teinha do Obreiro Baixo

E com licença da palavra

Trouxe Roquete Cuzão


Roquete é feito feijão

Quando esquenta dá o bicho

Mas andará no capricho

No rumo da eleição


Reparem bem o estado

Dessa nossa região:

Do Estreito da Galheira

Do Beco do Pinguelão

Lá do Buraco da Velha

Do Pau Torto e Suvacão


Da Rua do Arrombado

Lá da Taiáda da Jega

Esquina do Lasca e Trinca

Suvaco de Cururú

Atolado da Frieira

Rua da Beira Seca

E do Beco do Tejú

                  

Não queiram ver o estado

Do Apertado da Hora

Da Pinguela do Tauá

Do Beco do Quebra Pote

Da Rua do Quixelau

Rua do Grude e da Merda

Escorrega Lá Vai Um

E Beco do Eita Pau

 

Estão levando na zona

A nossa zona sofrida

Zonaram da nossa zona

Nunca nos deram carona

No trem que sobe na vida


Mas esta bacafuzada

Tá com seus dias contados

Quem ganha a vida fudendo

Levando e sendo enganado

De tanto saber gemer

Quer “tanto assim” pra fuder

Prefeitos e Deputados


Vote em nossa bandeira

De Norte Sul Leste Oeste

Vamos votar na FUDENE

A redenção verdadeira

Que são essas Fudedeiras

Desenvolvendo o Nordeste


Finalizo estas palavras

Clamando de braço aberto

Aos companheiros de luta

Que vamos votar nas putas

Pois nos filhos não deu certo


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