Este é livro importante por ter sido escrito de modo espontâneo por uma fã declarada de Nelson Gonçalves, Onélia Setubal Rocha de Queiroga; e não, necessariamente, por especialista nos estudos da história da música popular, cujo resultado, aliás, quase sempre é chato.
Na
verdade, são poucos os textos em que os autores têm a coragem de revelar
histórias de ídolos com firmeza e beleza como tão bem Onélia Setubal o faz, à
parte graça no escrever.
Este
livro é uma contribuição importante e natural à compreensão da força que os
grandes artistas da música popular imprimiam aos fãs nos tempos dos anos 40,
50...
Dito
isto, lembro que o cantor Nelson Gonçalves nasceu em 1941, pois foi nesse ano que a extinta gravadora Victor o contratou. Já o gaúcho Antônio Gonçalves Sobral, nome de batismo do cantor, nasceu no dia 21 de junho de 1919, mesmo ano em que o Rei da Voz, Chico, estreava em disco gravado com
marca do selo Popular do companheiro da maestrina Chiquinha Gonzaga, João,
confundido até hoje como filho dela, a marcha carnavalesca Pé de Anjo, de J. B.
da Silva, o Sinhô.
Dito
isto digo também, e assino em baixo, que Nelson foi um grande cantor, dos
melhores no campo da música popular desde Vicente Celestino, Silvio Caldas,
Chico Alves, Orlando Silva, o argentino naturalizado Carlos Galhardo e outros mais.
Um
grande.
No
palco, Nelson era impecável.
No
palco Nelson arrasava, no melhor dos sentidos.
Fora
do palco, Nelson era um pecador, grosso, bruto, um mal-educado que arrasava, no
pior dos sentidos.
A
história de Nelson é cheia de mentiras e contradições, de desrespeito e
maltrato as mulheres.
Pode?
Não
pode.
Nelson
não estava preparado para a vida em família, entendem seus biógrafos e amigos
mais próximos, como Marco Aurélio Barroso, autor do livro A Revolta do Boêmio;
e Moacir Fontana, um dos seus mais fiéis seguidores, desde sempre.
Nascido
em Santana do Livramento, RS, de pais portugueses, Nelson viveu na capital paulista
por muitos anos; desde os seis, quando deixou a sua cidade natal.
Em
São Paulo, ele viveu vendendo jornais, engraxando sapatos e fazendo bicos etc.
e tal e atendendo a clientela do bar do irmão Joaquim, Quincas, na esquina da
Alameda Nothmann com a Rua São João, ali perto da Ipiranga famosa da canção do
baiano Caetano.
Eu
o conheci bem.
Nelson
frequentou por pouco tempo os bancos escolares, e nesses bancos pouco aprendeu.
A
vida foi o seu professor.
O
pai, seu Manoel, não era chegado a trabalho e se fingia de cego tocando rabeca
para o filho; ele, Antônio, Nico, o futuro Nelson, cantar sobre caixotes nas
feiras-livres e na Praça da Sé de São Paulo.
Essa
rotina durou até ele, crescido agora chamado Metralha, sair de casa por causa
das provocações sacanas da mãe, dona Libânia, que o chamava de vagabundo puxado
ao pai.
Tinha
uns 18, 19 anos de idade Nelson quando casou e teve dois filhos biológicos.
Os
únicos.
Já
na rua, Nelson tentou a carreira de lutador de boxe; mas um colega de academia,
no Brás, lhe capou a vontade e o fez estéril, com um golpe nas partes pudendas.
Depois
disso, o seu sonho passou a ser cantor.
Com
a ajuda dos amigos Oswaldo e Orlando, compositores em início de carreira,
Nelson gravou um acetato para mostrar que poderia ser um grande cantor ao
mandachuva da extinta Victor, Vitorio Lattari, por recomendação do vendedor de
discos por atacado, Cássio Muniz.
Lattari
gostou do que ouviu, mas não acreditou que fosse dele a voz que ouviu do acetato,
e sem conversa o expulsou da sala, chamando-o de gago e charlatão.
Dois
ou três dias depois, Nelson voltou para se explicar.
O
flautista Benedito Lacerda foi a sua salvação.
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