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sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

SÃO PAULO EM PROSA, VERSO E MÚSICA (4)

Também orgulhoso de viver em São Paulo está hoje o cantor e compositor baiano Tom Zé, que há mais 50 anos deixou a cidade em que nasceu, Irará, disposto a vencer através da música. E o campo de batalha para ele, no caso, foi São Paulo. A primeira relação foi de amor e ódio e o primeiro fruto, a canção São São Paulo, que diz: 

... São oito milhões de habitantes
De cada canto e nação
Que se agridem cortesmente
Correndo a todo vapor
E amando com todo ódio
Se odeiam com todo amor...

Tom Zé resume: 

“O Nordeste é um país onde prevalece o verso. Na sua forma falada, como no Gênese. Lá, a palavra falada é o principal valor circulante. É a filosofia, a metafísica, é a história. Portanto, na atual falência do dicionário, considerando que lá não circulam normalmente nem dinheiro nem alimento, o nordestino vê sua principal moeda corroída”. 

E, na falta de moeda, decorrente da escassez do trabalho remunerado, o nordestino termina agarrando-se ao sonho de prosperidade vivendo em São Paulo. O cearense Expedito Jorge Leite, de Jati, divisa com Pernambuco, afirma que “São Paulo só conseguiu ser hoje o que é por causa da mão de obra barata do cidadão nordestino”. Leite é dono da Ibrasa, uma das maiores editoras do País. Ele destaca uma qualidade incomum da cidade: 

“São Paulo assusta e encanta, antes de tudo. Em São Paulo o que admira é a impessoalidade, a incógnita, o que faz com que todos se tornem iguais. Ao mesmo tempo que acolhe, São Paulo liquida, isto é, ao mesmo tempo que afaga, mata. Mas nessa cidade fantástica há vez até para malandro”. 

O paraibano Roberto Luna, de batismo Valdemar Farias, concorda com tudo isso e diz rindo: “São Paulo, pra mim, pessoalmente, sempre foi um desafio maravilhoso. Aqui construí a minha carreira. Aqui virei empresário da noite. Aqui tive muitas alegrias”. 

Luna, nascido em Serraria, deixou a Paraíba ainda garoto. Tinha uns 16 anos quando aportou no Rio de Janeiro. Fez trabalhos gerais, mas o seu sonho era ser artista de fama. Um grande cantor. Estudou teatro com Ziembinsky (1908-1978) e fez amizade com o compositor baiano Assis Valente (1911-1958), que o apresentou ao jornalista e diretor de teatro e cinema português Chianca Garcia (1898-1983). Queria apresentar-se cantando no teatro de revista, dirigido por Garcia. Mas não deu. E lá foi ele atrás do seu sonho, cantando onde era possível cantar, até que conseguiu gravar o primeiro disco de 78 rpm, que trazia de um lado o bolero Por quanto tempo e do outro, o samba-canção Linda. 

Àquela altura o jovem paraibano já ganhara o nome artístico de Roberto Luna, dado por um locutor da Rádio Nacional, chamado Afrânio Rodrigues. Não demorou, conheceu o empresário de rádio e TV Victor Costa (1907-1959), que o despachou para São Paulo. E em São Paulo, já no Quarto Centenário da cidade (1954), fez a festa e a carreira. E onde está até hoje, com seus 93 de idade. 

No aniversário de 450 anos de fundação da cidade paulistana, o compositor, cantor e violeiro mineiro Téo Azevedo produziu um CD reunindo alguns dos grandes intérpretes da música brasileira. E lá estava, na faixa 13 ou 14, Luna cantando Bar da Tradição. Sobre São Paulo, claro. 

Uma curiosidade: um dia seu amigo Nelson Gonçalves o incumbiu de zelar (tomar conta) por uma namorada. Nelson fez isso porque fora fazer shows no Rio. Deu zebra, se desentenderam. E tiros deixaram marcas na parede e na memória de Luna: ”Coisas de jovens”, diz. 

O radialista pernambucano Luiz Wilson, no ar há 15 anos na Rádio Imprensa, também acha graça na graça de Luna, e conta: “Nada aconteceu comigo nesse sentido, mas Luna é um mestre incrível. O que ele diz, com a sua voz leve e de pluma, é sempre maravilhoso”. 

Wilson tem pelo menos quatro músicas que falam da cidade de São Paulo. 

Victor Costa, paulista, foi o cara que criou a Rádio Nacional de São Paulo, em 1953. 

Entre as várias empresas de comunicação dele, estava a Rádio Excelsior, criada em 1934. 

O empresário Roberto Marinho compraria a Excelsior em 1964. Costa já havia morrido. Foi lá que surgiu, anos depois, em 1991, a Rádio CBN. A história é longa... 

Detalhe: Victor Costa foi tão importante para o rádio e a televisão brasileiros como foi o paraibano Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello (1892-1968), o Chatô, que trouxe para o Brasil a TV que conhecemos hoje. Isso, em setembro de 1950. 

São Paulo é uma porteira sempre aberta a quem deseja procurar caminhos e alimentar esperança. Foi isso o que fez o pernambucano Edenaldo Freire. 

Freire está em São Paulo desde o começo dos anos 1950. Aos 73 anos, transformou-se num dos mais talentosos e requisitados diretores de teatro do Brasil. “Eu amo São Paulo”, diz. 

A propósito, em 1954, o gaúcho de Santana do Livramento Nelson Gonçalves compôs e gravou o belo samba Por que amo São Paulo. 

Como Nelson, Teixeirinha não ficou indiferente ao Quarto Centenário de fundação de Sampa. E compôs e gravou a toada São Paulo. 

Eu, da minha parte, aproveito para sugerir que se faça um concurso com o objetivo de escolher o hino que falta à cidade de São Paulo. Aproveito também para sugerir que se crie o Museu da Música Paulistana. E de tabela, que se escreva um dicionário com verbetes das músicas, e autores, referentes à cidade fundada pelos jesuítas Nóbrega e Anchieta. 

Ah, sim, ia me esquecendo: nos anos de 2001 e 2003 criei um concurso para revelar cordelistas novos e reafirmar cordelistas velhos no panorama da poesia popular com o concurso de literatura de cordel. O primeiro foi em 2001 e o segundo, em 2003. Esses dois concursos resultaram em 410 mil folhetos de cordel que distribuí na rede pública de ensino do Estado de São Paulo. 

Quero aproveitar a ocasião para dizer que São Paulo representa para ricos e pobres, brasileiros e estrangeiros, uma espécie de Canaã, entendem? Antes, pela voz do multiinstrumentista Jarbas Mariz, mostro porque São Paulo é São Paulo, inclusive no samba. Ouça!

E pela voz do cantor Costa Senna ouça o xote que fiz com Enok Virgulino: Romance no Metrô

E fiz também um poema que intitulei de Declaração de Amor a São Paulo. O acompanhamento musical é de Osvaldinho da Cuíca.

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