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sábado, 20 de novembro de 2021

IMPRENSA NEGRA, RESISTENTE E HEROICA: PARTE I

A partir de hoje 20 até o próximo sábado 27, publicaremos neste blog uma série de 7 capítulos contando a história do que podemos chamar de Imprensa Negra no Brasil. É uma história interessantíssima, resistente e heroica como disse uma vez o colega jornalista Audálio Dantas. Muitas curiosidades o amigo leitor encontrará no decorrer da leitura dessa série. É isso. 

Aliás, detalhe: A Lei Áurea foi assinada na tarde de domingo 13 de maio, do ano de 1888. Assinou o documento, além da princesa Isabel, uma figura pouco lembrada na história: Rodrigo Augusto da Silva (1833-1889).

E vamos à leitura. Tomara que goste.

***

Imprensa negra, resistente e heroica
À parte: Samba, cordel e repente − uma história para estudo e reflexão

Por Assis Ângelo
(Para Anna Clara da Hora Sena Durães, pela infinita paciência de ouvir e digitar os textos que lhe dito)

Aqui eu dou de mão do leitor e o levo a um passeio na história. O ponto de partida é o achamento de Pindorama pelos portugueses, como o Brasil era chamado nos primórdios por seus habitantes. Após isso e logo depois da fundação da primeira cidade brasileira, São Vicente, os africanos começam a desembarcar na Bahia, Rio e São Paulo pra dar duro na Ilha de Vera Cruz, como denominou nossas terras Pedro Álvares Cabral (1467-1520). O objetivo é pôr luz na história.
O primeiro jornal a tratar da questão negra foi O Homem de Cor, de 1833.
No correr do texto, o leitor vai topar com um personagem de importância fundamental na incipiente Imprensa brasileira: Francisco de Paula Brito (1809-1861). Brito foi o pioneiro da chamada “Imprensa Negra”.
Paula Brito foi o cara que abriu as portas para Machado de Assis. Foi Machado o nosso primeiro grande romancista.
Muita água correu por debaixo da ponte desde o lançamento do jornal O Homem de Cor.
Depois desse jornal, que durou 5 números, muitos outros vieram abrindo caminho que levaria o negro à liberdade.
Não era brincadeira o que o negro vivia no século 19.
Desde então, pouca coisa mudou no campo da exploração humana.
O jornalista alagoano Audálio Dantas (1929-2018), uma vez resumiu a importância dessa Imprensa: “Persistente, heróica”.
A Importância da cultura africana no Brasil é sem tamanho. Melhor: é de um tamanho que a vista humana nem alcança. O maestro paulistano Júlio Medaglia resume essa história numa frase: “A cultura brasileira é negra e devemos aos negros a cultura brasileira”.
Na tarde de 13 de maio de 1888, a princesa Isabel assinou no Paço Imperial, RJ, a Lei que tirou o poder dos escravocratas sobre os negros escravizados.
Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriel Rafael Gonzaga de Bragança e Bourbon nasceu em 1846 e morreu em 1921, na França. Há 100 anos, portanto.

...Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...

Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...

Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
(Trecho do poema O Navio Negreiro, de Castro Alves)

Navio Negreiro, pintura de Johann Moritz Rugendas
O Brasil tem cor: preta.
E outras cores também tem: verde, amarela, azul e branca, como ostenta a bandeira nacional que traz como tema “Ordem e Progresso”, extraído de frase do positivista francês Auguste Comte (1798-1857).
E ainda deveria ter a cor do sangue dos índios e dos negros escravizados.
O Brasil é rico demais, sempre foi.
O Brasil tem água em abundância e rios de ouro e prata.
E mais ainda o Brasil tem: terra fértil onde o que se planta dá incluindo coco, cajú, cajá, siriguela e cana caiana, que virou cana de beber na invenção de pretos em ferros nos engenhos coloniais.
Como se não bastasse, o som do samba faz o vento dançar e balançar o arvoredo.
São mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados…
No ranking, o Brasil ocupa o 5º lugar entre os maiores e mais populosos países do mundo.
O Brasil é um país de dimensões continentais, sem vulcões, furacões, terremotos, tsunamis, mas com muito cabra safado.
Ao tempo de 1500, só indígenas habitavam a terra brasilis, originalmente chamada de Pindorama.
Em Tupi-Guarani, Pindorama significa “Terra das Palmeiras”.
Quando Cabral aportou na costa baiana, o Brasil foi chamado de Ilha de Vera Cruz. Logo depois, em 1501, o rei Dom Manuel reintitulou o Brasil de Terra de Santa Cruz.
Antes disso, em 1498, aportou por estas terras o primeiro navegador de além mar: Duarte Pacheco Pereira.
No dia 20 de novembro de 1530, o Brasil ganhou uma vila: São Vicente, sei lá por que em homenagem ao santo espanhol Saragoça.
Em 1532, São Vicente passaria a ser conhecida como a primeira cidade do nosso País. Nessa cidade o seu fundador, Martim Afonso de Sousa (1500-1564), construiu Câmara, pelourinho, cadeia e uma capela, símbolos do reino de Portugal.
A história, a nossa história, é recheada de violência, tragédias e tristeza. Até hoje.
Nosso sangue é preto.
Nossos indígenas foram os primeiros a serem escravizados pelos invasores.
O pajé Awa Kuaray Wera e Assis Ângelo
“A verdade é clara, muito clara: sofremos até hoje, somos violentados até hoje e o tempo todo, todos querem as nossas terras e dela extrair o ouro e outras coisas”, conta e reconta o Pajé Guarani Awa Kuaray Wera.
Kuaray Wera lembra que em 2020 quase 200 índios foram assassinados pelos brancos no Brasil. “A gente era muita gente, milhões. A gente hoje não chega nem a 1 milhão e o número de línguas, menos de 300. Podemos acabar”, acrescenta o Pajé.
Em 1550, portugueses começaram a traficar humanos de África para torná-los escravos cá, no Brasil.
A partir de então, os horrores passaram a se multiplicar, na cor preta.
Por essa época, uma jovem princesa angolana foi laçada por captores e trazida até nós, à força. Seu nome: Zacimba Gaba.
Essa princesa, da nação de Cabinda, foi desembarcada no porto de São Matheus (província de Espírito Santo). E lá sofreu até fugir das mãos dos seus algozes.
Foi uma guerreira.
Um ano antes de 1550, começaram a chegar em Pindorama os jesuítas. Entre eles, José de Anchieta (1534-1597).
Anchieta chegou em 1553 e um ano depois, fundou com Manuel da Nóbrega (1517-1570), a cidade de São Paulo.
Depois dos jesuítas, chegaram os carmelitas e os beneditinos.
Os jesuítas autoproclamavam-se “soldados de Deus”. Até hoje.
Essa organização religiosa foi criada na França, em 1534 e reconhecida pelo Papa em 1540. Seu fundador foi o santo Ingnacio de Loyola.
Negros e indígenas que vislumbravam a liberdade, fugiam do trabalho escravo.
Zimbu, pintura de Antônio Parreiras
Quilombos começaram a surgir aqui e ali. Depois, multiplicaram-se. O mais famoso deles, Palmares, chegou a acolher milhares e milhares de fugitivos, que eram recebidos por Ganga Zumba (1630 -1678).
Zumba, que morreu em luta, foi substituído pelo sobrinho Zumbi, diz a história.
Zumbi, de batismo Francisco, criado por um padre, lutou ao lado da companheira Dandara até o fim. Foi degolado e sua cabeça exposta em uma rua de Pernambuco, em 1695, por aí. Ano em que foi descoberto ouro em Minas, Mato Grosso e Goiás, para onde foram levados milhares de escravos para explorar a nova riqueza descoberta. Crianças, inclusive.
Zumbi tinha mais ou menos 40 anos quando o mataram.
Dandara preferiu suicidar-se a correr o risco de ser presa e torturada pelos inimigos.
A história não oferece dados suficientes para se traçar o perfil dessa guerreira.
Quem destruiu o Quilombo dos Palmares foram bandeirantes liderados por Domingos Jorge Velho (1641-1705), um assassino.
Não custa lembrar o que a história conta: os jesuítas André João Antonil (1649-1716) e Antônio Vieira (1608-1697).
Antonil era completamente a favor de que se escravizasse indígenas e africanos. “Os escravos são as mãos e os pés do senhor do engenho”, escreveu no livro Cultura e Opulência do Brasil sob o pseudônimo “O Anonymo Toscano”. Nesse mesmo livro, publicado e depois destruído a mando de Dom João V, o mesmo Antonil escreveu: “O Brasil é o inferno dos negros, purgatório dos brancos e o paraíso dos mulatos e mulatas”. E de lambuja, ainda disse: “Pão, castigo e trabalho”.
Vieira, por seu turno, mostrava-se levemente inclinado à não escravidão. Mas também escreveu num de seus sermões, comparando a dor do escravizado com a dor sentida por Cristo pregado à cruz:

Não se pudera nem melhor nem mais altamente descrever que coisa é ser escravo em um engenho do Brasil. Não há trabalho nem gênero de vida no mundo mais parecido à Cruz e Paixão de Cristo que o vosso em um destes engenhos. [...] Bem-aventurados vós, se soubéreis conhecer a fortuna do vosso estado, e, com a conformidade e imitação de tão alta e divina semelhança, aproveitar e santificar o trabalho! Em um engenho sois imitadores de Cristo crucificado: Imitatoribus Christi crucifixi – porque padeceis em um modo muito semelhante o que o mesmo Senhor padeceu na sua cruz e em toda a sua paixão. A sua cruz foi composta de dois madeiros, e a vossa em um engenho é de três. Também ali não faltaram as canas, porque duas vezes entraram na Paixão: uma vez servindo para o cetro de escárnio, e outra vez para a esponja em que lhe deram o fel. A paixão de Cristo parte foi de noite sem dormir, parte foi de dia sem descansar, e tais são as vossas noites e os vossos dias.

O lenga-lenga desse padre que costumava levitar sobre muros, pode ter dado origem à máxima popular segundo a qual: “A Fé salva”.
Três ordens religiosas marcaram a história do Brasil dos portugueses: jesuítas, carmelitas e beneditinos.
Os beneditinos tinham sob seu domínio pelo menos 4 mil pessoas escravizadas.
Desde o achamento de Pindorama, muita água correu debaixo da ponte.

***

Esse texto foi originalmente escrito para o Newsletter Jornalistas & Cia. Já os conhece? Confira: Jornalistas&Cia, especial Perfil Racial da Imprensa Brasileira

Confira também o portal do IMB, Instituto Memória Brasil

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

BRASIL DE SANFONEIROS

O Brasil atual é resultado de uma mistura enorme de gente, coisas e músicas.
São muitas as influências que a música brasileira sofreu no decorrer do tempo. No entanto não custa dizer que a discografia brasileira foi iniciada por dois baianos: o compositor Xisto Bahia e o cantor Manoel Pedro dos Santos, Bahiano.
Os primeiros solos de sanfona registrados em disco traziam a assinatura do italiano naturalizado Giuseppe Rielli.
Rielli, nascido no dia 19 de novembro de 1885, veio da Itália para ganhar a vida no Brasil.
Foi São Paulo que Rielli escolheu para morar e trabalhar. Mas foi no Rio de Janeiro que ele registrou quase todas as gravações que fez. Seus discos foram gravados e lançados pela extinta Casa Edison.
No decorrer da sua vida profissional, o artista, que morreu no dia 22 de março de 1947, não esqueceu de presta homenagens a São Paulo. São dele, por exemplo, as músicas Saudades de S.Paulo e Bella Paulista. Ouça:

LEIA MAIS:

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

MANOEL DORNELES, UM CRAQUE DO JORNALISMO

 
O jornalista paulista de Divinolândia Manoel Dorneles Rodrigues é pai de Vitor e companheiro da jornalista paulistana, Silvana.
Divinolândia é uma cidade que fica a 285km da capital de São Paulo. Faz limite com São José do Rio Pardo, Caconde, São Sebastião da Grama e Poços de Caldas. Sua população, segundo IBGE, é de pouco mais de 11.000 habitantes.
"A minha cidade é linda, é maravilhosa. A minha cidade tem vida, a minha cidade tem alma. A minha cidade é de café, é de batata, é de cebola e tudo mais que faz bem a vida", derrete-se em elogios a seu berço o divinolandense Manoel Dorneles; Dorneles, para os íntimos.
Dorneles é uma figura incrível do universo humano.
Eu trabalhei com Dorneles nos anos 70, na Agência Folha. Meus companheiros, e dele, foram pessoas do naipe de Hely Vanini, Hipólito Oshiro, Celsinho, Leivinha, Ancelmo, Zanfra, Ubirajara, Valmir Salaro e tantos e tantos. 
Quantas lembranças!
Essas e outras lembranças vieram à tona quando Dorneles bateu a porta dizendo que estava com saudade. E eu também. E nos abraçamos. Eu com já 3 doses tomadas no muque e ele, também.
Nascido em Divinolândia, como já dito, Dorneles conquistou diploma de jornalista em Mogi das Cruzes, SP. Fez pós-graduação na Casper Líbero e não demorou muito, viramos amigos.
Dorneles bateu a minha porta, ontem 17. Fiquei feliz. Ficamos.
E conversamos, e conversamos e conversamos sobre tudo e um pouco mais. Até o corno Bolsonaro entrou na nossa conversa, rapidinho, mas entrou. Peste!
Eu e Dorneles, como os nomes acima citados, fizemos reportagens de tudo quanto é coisa, de política à polícia.
Eu levei porradas a dar com o pau, se é que me entendem.
Andei por muitos jornais, revistas, rádios e TVs.
Dorneles preferiu o jornalismo escrito, no papel. Preto no branco.
Dorneles foi editor de jornais e revistas, incluindo Meio & Mensagem e Kalunga.
Da Kalunga, Dorneles foi editor durante duas décadas. A propósito, dele mereci a ocupação de várias páginas na referida revista, à guisa de entrevista. Confira:

VOCÊ JÁ CONHECE O INSTITUTO MEMÓRIA BRASIL? Confira: Instituto Memória Brasil

JORNALISTA & CIA
Você conhece o Jornalista & Cia? Assine: J&CIA Edição 1334

HOJE É DIA DE FAUSTO!


Natural de uma pequena cidade do interior paulista, Reginópolis, Fausto Bergocce tornou-se com o tempo um dos mais respeitados e aplaudidos chargistas do Brasil.
A carreira profissional, Fausto iniciou em 1972, no jornal Diário de Guarulhos.
O primeiro trabalho de próprio punho que publicou tinha o Cosmos como inspiração.
Simples, de uma tranquilidade franciscana, Fausto trabalhou na Folha de S.Paulo, Diário Popular e até na TV Cultura.
No currículo deste artista acham-se 14 livros, reunindo parte pequena e significativa de tudo quanto publicou na imprensa brasileira.
O mais recente livro de Fausto intitula-se Pré-Histórias. Uma obra-prima, diga-se de passagem.
Fausto, talentosíssimo, é um arguto observador da vida cotidiana e da natureza.
Sem exagero, afirmo que Fausto é uma marca importantíssima da nossa imprensa. Crítico, lírico e mais das vezes feroz. Seu traço é um traço marcante, como marcante são os traços de Picasso, Brennand, Millôr e Miguel dos Santos. A propósito, ele diz dos mestres que o influenciaram: “Marcaram a minha vida profissional Jaguar, Ziraldo e Millôr no Brasil. O estrangeiro com quem mais mostro identificação é Saul Steinberg”.
Este texto foi publicado originalmente
no newsletter
Jornalistas&Cia

No correr da vida, Fausto já conheceu centenas de municípios brasileiros e duas dezenas de países mundo afora como França, EUA, Itália, Bélgica, Inglaterra… Depois de estrear no Diário de Guarulhos, Fausto passou a ocupar páginas e páginas de jornais e revistas no Brasil.
Ele ilustrou muitos textos meus no Folhetim, no Pasquim e revistas da Editora 3.
Fausto é mágico.
Filho de seu Antônio e dona Maria, Fausto é o 3º dentre os 6 irmãos. Mas só ele deu para as artes, no caso o cartoon e a charge.
Fausto Bergocce nasceu no dia 18 de novembro de 1952.
Esse cara é uma graça, literalmente falando e escrevendo. Um talento incrível.
Conversar com Fausto é aprender um pouco mais sobre a história do Brasil e sobre boa parte do mundo. É isso, viva Fausto!
Ah! Ia-me esquecendo: ele tem um monte de histórias em quadrinhos animadas...

JOSÉ XAVIER CORTÊZ

Hoje 18 é um dia pra ser lembrado não só pelo aniversário do cartunista fausto, mas também por ser o dia de aniversário do editor potiguar José Xavier Cortêz. Saudade. Leia mais: 

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

VIVA VILLA-LOBOS E A BOA MÚSICA!


O carioca Heitor Villa-Lobos, compositor, instrumentista e maestro, deixou o seu nome definitivamente gravado na história da música erudita, ou clássica, como a música de concerto é mais comumente chamada.
Antes de Villa, o Brasil marcou terreno com os eruditos José Maurício Nunes Garcia (1767-1830) e Antônio Carlos Gomes (1836-1896).
Nunes Garcia teve por berço o Rio de Janeiro e Carlos Gomes, São Paulo. Ambos eram negros. 
O autor das bachianas brasileiras, Villa-Lobos, nasceu em 1897 e aos 6 anos de idade já encantava tocando instrumentos de corda, como violoncelo. 
É vastissíssima a obra de Villa-Lobos, tão vasta quanto a grandeza do seu talento.
Na metade dos anos de 1920, Villa-Lobos já tinha como ideia definitiva descobrir e valorizar a música nascida do conhecimento e sentimento dos autores brasileiros. Pra ele, música é música. E por pensar dessa maneira, facilmente aproximou-se e fez amizade com inspirados compositores e intérpretes da música popular. Entre esses, João da Baiana, Donga, Pixinguinha e João Pernambuco, coautor de Luar do Sertão. À propósito, durante muito tempo, pensou-se que essa música, uma toada, era só de autoria do maranhense Catulo da Paixão Cearense (1863-1946).
Depois que o pai Raul morreu e a mãe também, Villa arrumou dinheiro pra investir no conhecimento. Foi quando começou a viajar pelo Brasil, Nordeste inclusive. O Norte, também. Chegou a estudar e apreciar repentes e emboladas dos cantadores nordestinos. Do Brasil profundo, recolheu cantigas de roda que o inspiraram a compor cirandas.
São incríveis as adaptações de Villa para as cantigas infantis.
Quem não conhece Xô, Xô Passarinho?
A variante desta cantiga é Xô Pavão, assinada pelo pernambucano Zé Dantas e gravada pelo rei do baião, Luiz Gonzaga.
Xô, Xô Passarinho tem origem ibérica. A base desta história, uma lenda é uma criança judiada pela madrasta, na ausência do pai. A menina finda enterrada viva e com o tempo, sobre a cova, nascem gramas que parecem cabelos. Tanto que um jardineiro quando vai cortar a grama, ouve do chão a voz pedindo para que não faça isso. O caso é que a menina gostava de brincar com pássaros, daí a expressão "Xô passarinho!".
Introdutor, assim podemos dizer, do canto orfeônico no Brasil, Villa encontrou no milionário Carlos Guinle (1889-1956) o seu primeiro mercenas. O segundo mercenas, digamos assim, foi o presidente Getúlio Vargas.
Villa participou do Governo Vargas e dele teve todo o apoio pra mexer com a música. E assim foi feito.
A obra de Villa é reconhecida no Brasil e no mundo todo.

terça-feira, 16 de novembro de 2021

OSESP LEVA CEGOS À SALA SÃO PAULO

 

Inaugurada em Julho de 1999, a Sala São Paulo, continua sendo o templo da boa música de Concerto e de Câmara.
Fazia tempo que eu não ia à Sala. Uma das últimas vezes, foi em 2015, quando Rolando Boldrin me convidou para assistir a uma belíssima apresentação musical para marcar os 10 anos do seu programa, Sr. Brasil. Fui com o saudoso amigo José Ramos Tinhorão (1928-2021).
Eu já havia perdido a visão dos olhos, mas mesmo assim apreciei o repertório escolhido pela produção do programa do Boldrin.
Domingo 14 voltei à Sala São Paulo para assistir à apresentação do Coro Acadêmico e da Academia da OSESP- Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo.
A programação foi aberta pontualmente às 11hs, como previsto, com uma peça ligeira do compositor, instrumentista e maestro, Heitor Villa-Lobos (Quarteto de Cordas nº 1, em 6 movimentos), Jacques Ibert (Três Peças Breves), Geraldo Vandré/Théo de Barros (Disparada), Edu Lobo/Chico (Beatriz), Gilberto Gil/Torquato Neto (Geleia Real), Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira (Qui nem Jiló) e Sivuca/Glorinha Gadelha (Feira de Mangaio).
Foi tudo muito bonito, com quase metade das 1498 cadeiras ocupadas por um público atento, alegre e espontâneo que facilmente atendeu ao convite do regente Felipe da Paz para dançar. Isso, já no final.
Tudo que se passava no teatro, a partir do palco, foi transmitido por audiodescrição, pela profissional Lívia Motta, diretora da Ver com Palavras, ao meu lado na foto (ao lado).
Lívia, dona de uma voz macia e carinhosa, encantou a quem teve a oportunidade de ouvi-la.
Integrava a plateia duas dezenas de pessoas cegas ou outras com baixa visão.
Tomara que eventos como esse que tive a graça de assistir se repitam, pelo menos, uma ou duas vezes por mês, na Sala São Paulo e noutros ambientes do gênero.
Villa-Lobos morreu aos 72 anos de idade, no dia 17 de novembro de 1959.

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

O DIA EM QUE O IMPERADOR CAIU

A madrugada do dia 15 de novembro de 1889, foi uma madrugada que entraria, definitivamente, para a história.
Foi nessa madrugada que os inimigos da Monarquia depuseram Pedro II (1825-1891) e no seu lugar, puseram o marechal Deodoro (1827-1892).
Não houve derramamento de sangue, até porque o povo não deu bola à questão. E assim, Deodoro assumiu o poder a que renunciaria no dia 23 de novembro de 1891. Há 130 anos, portanto.
O movimento pró-República intensificou-se uns 10 anos antes da assinatura da Lei Áurea, pela princesa Isabel (1846-1921).
O imperador Pedro II só soube da "libertação" dos escravos 2 semanas depois, quando achava-se em visita à Itália.
Pedro II era um cara leve, livre, solto, chegado às artes. Nos momentos mais difíceis do País, ele dava um jeitinho para pirulitar-se e conhecer outras culturas, como a egípcia.
Esse Pedro virou amigo do grande romancista e poeta francês Victor Hugo (1802-1885). Mas essa é outra história.
Quando os militares golpearam e derrubaram a Monarquia, Pedro II se achava em Petrópolis, RJ.
Foi no começo da madrugada que o imperador tomou conhecimento do que o marechal Deodoro e seus comandados acabavam de fazer na capital do Império. Não quis acreditar, mas a ficha acabou por cair no final da manhã do fatídico 15 de novembro de 1889.
Antes de ser forçado a exilar-se, Pedro II permaneceu em prisão domiciliar por horas e horas até embarcar num navio com destino à França. E lá morreu. E lá morreu também a filha Isabel e filhos dela e tal.
O marechal Deodoro, depois de 2 anos no poder, renunciou à presidência da República por discussões e brigas no Parlamento. No seu lugar, ficou o marechal Floriano Peixoto (1839-1895).
Peixoto, que era vice de Deodoro, assumiu o poder depois de um golpe. 
Floriano deixou o poder sem cumprimentar o sucessor, Prudente de Morais (1841-1902).
E a República é o que temos.
O Jornal do Brasil, edição de 16 de novembro de 1889, começou abriu texto sobre a queda do imperador Pedro II assim:
Surpreendente movimento militar que estourou ontem nesta Corte, espalhando agitação e disseminando boatos que duraram todo o dia tomaram conta da cidade, acabou impondo a deposição, pelas armas, do governo do Visconde de Ouro Preto – e ao mesmo tempo, do regime monárquico instaurado no país desde  Independência, há 67 anos. O Brasil é agora uma república, segundo os oficiais que comandaram a manobra. O imperador D. Pedro II, há 49 anos no trono, encontra-se em prisão domiciliar, com todos os demais membros da família imperial, no Paço da Cidade.

domingo, 14 de novembro de 2021

CRIANÇAS PORTUGUESAS APRENDE O PORTUGUÊS CERTO!

A pandemia endoidou e continua endoidando o mundo. Reflexos dessa doidice acham-se até na língua portuguesa dos portugueses.
Os portugueses estão de orelhas de pé, assustados, pelo simples fato de a criançada estar-se afinando melhor com o português brasileiro. Isso mesmo!
A permanência mais longa diante da telinha do computador tem feito a petizada imbuir-se no idioma por nós, brasileiros, falado.
É grave a situação, ora pois, ressalta uma professora de lá. "A maioria (das crianças) usa expressões soltas, como 'estás a trolar comigo'. Mas aquele menino falava com sotaque e dizia todas as palavras tal e qual como nos vídeos a que assistia na internet, reproduzindo as expressões [...] O que sei, e tenho vindo a conversar com as minhas colegas, é que os meninos estão viciados, tal qual como os adolescentes estão com os jogos, por exemplo".
A fala aspeada acima é da educadora portuguesa Ana Sofia.
O youtuber Luccas Neto tem sido um verdadeiro "terror" para os pais portugueses.
A mãe de uma das crianças seguidoras de Luccas, Alexandra Patriarca, chegou a dizer: "Todo o discurso dele (filho) é como se fosse brasileiro. Chegámos ao ponto de nos perguntarem se algum de nós era brasileiro, eu ou o pai". 
Já há até crianças se submetendo em sessões de fonoaudiologia.
Mas para a professora Catarina Menezes, também portuguesa, a situação pode ser relativizada. E explica: "Quando eu era menina havia o mesmo pânico social com os livros do tio Patinhas, que era traduzido em português do Brasil. Lembro-me bem da minha professora do primeiro ciclo ter esse pânico. A mesma coisa quando apareceram as novelas...que eram completamente massificadas. Ora, eu acho que esta discussão dos youtubers não é muito diferente".
Pois, pois, a situação não é tão grave, creio. De qualquer modo é, digamos, "a volta do cipó no lombo de quem mandou dar", como diria o compositor e cantor brasileiro Geraldo Vandré. 
Enfim, é o português de hoje experimentando um pouco do que o Marquês de Pombal (1699-1782) nos empurrou goela abaixo, ao decidir pela extinção da língua geral que se falava no Brasil. 
Foi Pombal quem, por decreto, trocou a língua geral (Tupy) pela língua portuguesa lá dele. Isso em 1758. 
Camões deve estar morrendo de rir.
 

sábado, 13 de novembro de 2021

SOCORRO LIRA NOS BRINDA COM MARIA FIRMINA DOS REIS

Nestes tempos loucos, de políticos sem noção e desmatamento brabo no Brasil, poucos são os artistas que insistem em preservar a nossa memória.Aliás não é de hoje o hábito de os brasileiros esquecerem seus patrícios e patrícias.
Meu amigo, minha amiga, você já ouviu falar de Maria Firmina dos Reis?
Pois bem, Firmina dos Reis nasceu em março de 1822 e foi registrada em cartório em 1825.
Caso você não saiba quem foi essa mulher, corra depressa e vá procurar o CD Cantos à Beira-mar (abaixo).
Nesse disco, belíssimo, há 10 poemas musicados pela cantora, compositora e instrumentista paraibana Socorro Lira. Após musicados, os textos poéticos de Maria Firmina dos Reis receberam incrível arranjo do compositor, cantor, instrumentista e maestro Jorge Ribbas.
Ribbas é pernambucano e vive em Campina Grande, PB, há vários anos.
Socorro Lira é uma das mais afinadas e sensíveis vozes brasileiras. Já tem 13 álbuns lançados e um DVD (Amazônia, entre Águas e Desertos), os mais recentes são o já citado Cantos à Beira-mar e Chama. Os dois últimos trazem capa assinada pelo craque do traço Elifas Andreato.
Essa artista detentora de prêmios e apreciada por um público que vai do Brasil à Europa, Ásia e por todo o continente africano, tem o bom costume de trazer ao presente figuras do passado como a poeta ora homenageada em disco.
Dentre os resgates poéticos/musicais feitos por Socorro estão Zé do Norte e José Marcolino.
Zé do Norte rendeu à artista o troféu de melhor cantora na 23ª edição do Prêmio da Música Brasileira, em 2012.
No disco Cantos à Beira-mar Socorro Lira aparece declamando uma das 11 faixas, com acompanhamento de Ribbas. “Fiz um merengue e acho que ficou bastante legal o poema O Meu Desejo”, diz o maestro arranjador.
Os ritmos musicais encaixados nos poemas de Firmina dos Reis são claramente identificados como bolero, reggae, maracatu, choro, fado, canção, valsa, samba-canção e até um baião, além do já dito merengue.
“No momento, estou em estúdio pondo voz no novo disco que deverá ser lançado em 2022”, revela Socorro Lira, acrescentando que no próximo dia 23, às 19h, estará a frente de mais uma edição do Prêmio Grão de Música, por ela dirigido há 8 anos. “Avisa o povo para assistir a edição desse prêmio no canal Grão de Música”, pede rindo.Os primeiros textos poéticos de Firmina dos Reis foram publicados no jornal A Verdadeira Marmota (1861), Revista Maranhense (1887) e os últimos no O Federalista (1903). Além dos poemas, deixou de herança um romance abolicionista (Úrsula), uma novela indianista (Gupeva) e um conto (A Escrava).Maria Firmina dos Reis, maranhense de nascimento, morreu esquecida, pobre e cega no dia 11 de novembro de 1917.

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

UM INTELECTUAL DA MPB, NA ABL

O cantor, compositor e instrumentista baiano Gilberto Gil acaba de ser escolhido, por 21 votos, para ocupar a cadeira nº 20 da Academia Brasileira de Letras, a ABL. Essa cadeira tem como patrono o fluminense Joaquim Manuel de Macedo, autor do romance A Moreninha.
Gilberto Gil é autor de pelo menos 5 dezenas de discos e um ou dois livros publicados.
Junto com Caetano, Gil foi um dos líderes do movimento tropicalista.
Além de músico, o artista baiano enveredou pela política no começo dos anos de 1980. Primeiro como vereador em Salvador, BA, depois como ministro da Cultura do governo Lula.
Logo após a decretação do AI-5 na noite de 13 de dezembro de 1968, Gil e Caetano foram presos por agentes da ditadura e depois obrigados a se exilar no Exterior.
Em Londres, Gil gravou um LP em inglês e Caetano um LP no qual incluiu a toada Asa Branca, de Luiz Gonzaga (1912-1989).
O resto é história. E por falar nisso, uma historinha: 
Num dia qualquer dos anos de 1980, fim de tarde, eu, Luiz Gonzaga e Gil saíamos de um estúdio da extinta gravadora RCA Victor, em Sampa.
Nós três. Gonzaga à direita, Gil no meio e eu à esquerda, todos nós de manga curta. Eu fumando.
Gonzaga e Gil não fumavam.
De repente, com o cigarro aceso, toquei sem querer no braço de Gil. Pra que! Gil endoido, berrou, chamando-me de filho da outra.
Ao nota o que se sucedera, rachou o bico com uma risada estrondosa.
Pedi desculpas, mas até hoje desculpas Gil não me deu.
É isso!

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

VIVA MARIA FIRMINA DOS REIS

 
Às vezes tenho a impressão de que involuímos. Mais: que involuímos à galope, galopadamente.
Poetas romancistas, pintores sabiam de tudo e mais um pouco, ali no passado.
Paula Brito, tipógrafo, tradutor e jornalista; José de Alencar, jurista, poeta, romancista e dramaturgo; Machado de Assis, poeta, romancista e tradutor, doido pela obra de Shakespeare.
Em 1859, a maranhense Maria Firmina dos Reis publicava o primeiro romance. Mulher e negra, pobre. Ela escreveu além do romance, Úrsula, uma novela indianista e um conto abolicionista.
Firmina dos Reis era culta. Essa percepção é clara na sua produção literária e poética. 
O poema O Meu Desejo, que dedicou a um admirador, faz citação a Camões, Dante e Milton.
Camões o grande poeta português, é autor da obra prima Os Lusíadas que, modéstia às favas, transformei em uma ópera popular desenvolvida em sextilhas. Ainda inédita, mas essa é outra história.
Dante Alighieri, o grande poeta italiano da Idade Média, legou à posteridade o belíssimo Divina Comédia.
Por fim, Maria Firmina dos Reis cita no seu já referido poema o inquieto e talentosíssimo Milton.
Com relação a Dante e Camões, Milton era o caçula.
O poema clássico deixado por Milton tem conteúdo parecido com o conteúdo de Divina Comédia. É incrível. Trata de um pega-pra-capá entre anjos e o Paraíso. Adão e Eva entram no enredo. O Capeta, também.
Nos dias atuais, existem mais livros do que autores.
Cadê os clássicos de hoje?
Leiam Maria Firmina dos Reis, que morreu 11 de novembro de 1917 abandonada, pobre e cega.
Uma curiosidadezinha: Nos fins dos anos de 1930, o mineiro Ary Barroso compôs Aquarela do Brasil. Um clássico musical. Nesse clássico, o autor insere um verso lindo: "...A merencória luz da Lua".
Firmina dos Reis, no poema O Meu Desejo (abaixo) insere o verso "...A merencória Lua".

O MEU DESEJO

A um jovem poeta guimaraense

Na hora em que vibrou a mais sensível
Corda de tu'alma - a da saudade,
Deus mandou-te, poeta, um alaúde,
E disse:Canta amor na soledade.
Escuta a voz do céu, - eia, cantor,
Desfere um canto de infinito amor.

Canta os extremos duma mãe querida,
Que te idolatra, que te adora tanto!
Canta das meigas, das gentis irmãs,
O ledo riso de celeste encanto;
E ao velho pai, que tanto amor te deu,
Grato oferece-lhe o alaúde teu.

E a liberdade, - oh! poeta, - canta,
Que fora o mundo a continuar nas trevas?
Sem ela as letras não teriam vida,
menos seriam que no chão as relvas:
Toma por timbre liberdade, e glória,
Teu nome um dia viverá na história.

Canta, poeta, no alaúde teu,
Ternos suspiros da chorosa amante;
Canta teu berço de saudade infinda,
Funda lembrança de quem está distante:
Afina as cordas de gentis primores,
Dá-nos teus cantos trescalando odores.

Canta do exílio com melífluo acento,
Como Davi a recordar saudade;
Embora ao riso se misture o pranto;
Embora gemas em cruel soidade...
Canta, poeta, - teu cantar assim,
Há de ser belo enlevador enfim.

Nos teus harpejos juvenil poeta,
Canta as grandezas que se encerram em Deus,
Do sol o disco, - a merencória lua,
Mimosos astros a fulgir nos céus;
Canta o Cordeiro, que gemeu na Cruz,
Raio infinito de esplendente luz.

Canta, poeta, teu cantar singelo,
meigo, sereno com um riso d'anjos;
Canta a natura, a primavera, as flores,
Canta a mulher a semelhar arcanjos.
Que Deus envia à desolada terra,
Bálsamo santo, que em seu seio encerra.

Canta, poeta, a liberdade, - canta.
Que fora o mundo sem fanal tão grato...
Anjo baixado da celeste altura,
Que espanca as trevas deste mundo ingrato.
Oh! sim, poeta, liberdade, e glória
Toma por timbre, e viverás na história.
----------------

Eu não te ordeno, te peço,
Não é querer, é desejo;
São estes meus votos - sim.
Nem outra cousa eu almejo.
E que mais posso eu querer?
Ver-te Camões, Dante ou Milton,
Ver-te poeta - e morrer.

ADEUS

A jornalista Cristiana Lôbo despediu-se hoje do planeta. Tinha 63 anos quando um câncer a levou. 
Cristiana falava de política com naturalidade e por vezes participou de debates do extinto programa Onze e Meia, do Jô Soares. Fica o registro.

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

TODO DIA É DIA DE PENSAR

Digo e repito: todo dia é dia de reflexão.
Ocorreu num mês de novembro uma das grandes revoltas a entrar na história. Não popular, propriamente. Refiro-me à Revolta da Chibata, no Rio. A história é a seguinte:
Marinheiros negros, principalmente negros, eram duramente castigados por uma coisa qualquer que fizessem em discordância à cartilhas dos seus superiores. E apanhavam, apanhavam, apanhavam. Até que no dia 22 de novembro, de 1910, até o marinheiro João Cândido deu um grito de liberdade por seus companheiros aprovado. A situação, pois, inverteu-se.
Muitas coisas aconteceram e continuam acontecendo contra os negros, no nosso País.
Meu amigo, minha amiga, você sabia que o Ceará foi o primeiro Estado a abolir completamente a escravidão 4 anos antes de a princesa Isabel assinar a Lei Áurea?
Quem aboliu a escravidão no Ceará em 1884, mais precisamente no dia 25 de março, foi o baiano — veja só! — Sátiro de Oliveira Dias. Esse Sátiro foi médico e político de grande popularidade.
Antes de presidir a província do Ceará, Sátiro presidiu as províncias do Amazonas e do Rio Grande do Norte.
Não tem sido fácil historicamente, a luta dos negros e descendentes pela liberdade social e democrática.
Digo e repito o que disse vezes anteriores: a luta dos negros, não é uma luta só dos negros. É uma luta de todos nós.
João Cândido, gaúcho que entrou para a história como o Almirante Negro, nasceu no dia 24 de junho de 1880 e morreu no dia 6 de dezembro de 1969.
Sátiro de Oliveira Dias nasceu no dia 12 de janeiro de 1844 e morreu no dia 18 de agosto de 1913. Em sua homenagem, foi criado um município ao norte da Bahia. 
Culturalmente é riquíssima a cultura legada ao Brasil pelos negros.
Em 1980, o tieteense Itamar Assumpção lançou o LP Beleléu e Banda Isca de Polícia. Ouça:

terça-feira, 9 de novembro de 2021

EM PREPARO EDIÇÃO ESPECIAL SOBRE IMPRENSA NEGRA

Todo dia é dia de reflexão. Ou deveria ser. Digo isso por uma razão: o passado guarda muita coisa indesejável. É hora de pormos pra fora os males que o passado esconde. Reavive-los sim, por que não?
Todo dia é dia especial de lembrança de algo ou de alguma coisa. 
Hoje, por exemplo, é dia Internacional Contra o Fascismo e Antissemitismo.
O dia 20 de novembro é dedicado à lembrança da brutalidade feita contra índios e negros, no Brasil.
No próximo dia 19, o newsletter Jornalistas e Cia levará a público um especial sobre a "Imprensa Negra" no nosso País. O texto, assinado por mim, termina com parte do poema Navio Negreiro (Castro Alves) musicado pelo cantor, compositor e maestro pernambucano Jorge Ribbas. Ouça: 


JORNALISTAS E CIA

Você meu amigo, minha amiga, já é assinante do Jornalistas e Cia? 
Eu, se fosse você, entraria em contato agora com Silvio Ribeiro, através de seu email (silvio@jornalistasecia.com.br), ou telefone: (19) 9 7120-6693.

domingo, 7 de novembro de 2021

LEI PRA INGLÊS VER

O Mestiço, por Cândido Portinari
A questão negra não é uma questão que diz respeito só a negros. É uma questão que diz respeito a todos nós, brancos e negros, pardos, mestiços etc.
Preconceito e racismo são crimes inafiançáveis. 
O tráfico de africanos para o Brasil tem início nos fins da 1ª parte do século 16.
A Dinamarca foi o 1º país a criar Lei abolindo a escravidão no seu território, em 1792.
Pressionado pela Inglaterra, o Brasil também aprovou Lei proibindo o tráfico de negros para escravização. Essa Lei, chamada de Lei Feijó, foi aprovada no dia 7 de novembro de 1831. Deu em nada. Ou melhor, deu: serviu para entrar no Folclore como "Lei pra Inglês Ver". 
Pra valer, mesmo, foi a Lei até hoje chamada Lei Eusébio de Queiroz. Essa Lei entrou em vigor em 1850. 
O resto a história conta.

sábado, 6 de novembro de 2021

ROSTO NEGRO DO BRASIL

O escrito Oswaldo de Camargo
Paulista de Bragança, Oswaldo de Camargo é um dos mais ativos militantes dos movimentos negros do Brasil.
Jornalista, poeta e historiador, Camargo é um bom papo. Fala simples, natural. São muitos os livros que já publicou, entre os quais Um homem tenta ser anjo (1959), 15 poemas negros (1961), O carro do êxito (1972), A Descoberta do frio (1979).
Ciente da sua importância e da importância do negro na sociedade, Oswaldo de Camargo aos 85 anos deu-me uma verdadeira aula sobre o que chama com naturalidade da contribuição do negro entre nós.
É indiscutível a herança africana no Brasil. Pedi-lhe que escrevesse algo a respeito. E sem delongas, mandou-me o que podemos classificar de crônica. Leiam:

ROSTO NEGRO DO BRASIL
por Oswaldo de Camargo

Nesta altura de minha vida, 85 anos, arranhados por ímpetos de juventude e avisos bem audíveis de decrepitude, ponho me a inventariar qual a importância do negro, ou melhor, dos negros na história do nosso país.
Falo, diante do fato concreto e verificável de que sou um negro brasileiro.
Afirmam que nossa história aqui vem desde 1530, como escravizados. E nesse caminho que os compêndios de história registram apareceu um número razoável de nomes que provam como a aventura humana, mesmo de negros — diria o branco Ocidente — pode ser magnífica.
Henrique Dias, Padre José Maurício, Chiquinha Gonzaga, Luiz Gama, Cruz e Sousa... (Recorra-se aos compêndios, frios e burocráticos, geralmente; lá se aprende).
Fato é que, no meu ver, um dos dramas do País, desde muito, é a humanidade negada ou mal percebida do negro brasileiro. Não se notou, ou se fez o máximo para impedir o fulgor da alma do negro sobre o seu corpo, como se lê em verso de um poeta nosso.
As marcas que o africano deixou, visíveis na dança, na culinária, na religiosidade, nos gestos, na fala, no afago, estão aí.
Em nosso livro O Negro Escrito — Apontamentos sobre a Presença do Negro na Literatura Brasileira, acentuamos, sobre o passado:
“Negros para mourejar em canaviais, no eito, em conventos, em engenhos, ‘escravos de ganho’, moleques em seus misteres de utilidade prática e já rendosa, treinando para ‘bons escravos’, isso foi o povão negro que se ia espalhando pelo mapa do incipiente Brasil.”
Certo é que o País, a par de sua feição herdada sobretudo do Ocidente, marcou-se e continua se marcando com a existência cada vez mais crescendo de negros, na concretude do corpo.
Cinquenta e cinco por cento da população...
Mas, quando se vai reconhecer, em todos os negros, a sua plena humanidade?
Repete-se a história: em séculos passados, sobretudo no XIX, negros , poucos, despontaram e são testemunhados em compêndios e livros de História.
Hoje, negros ainda continuam despontando, em número incrivelmente irrisório.
Quando se poderá ver em todos os negros, pardos e mulatos a sua plena humanidade, dando aval à nossa verdadeira democracia?
No entanto o negro continua marcando o rosto do País...
Que rosto?

Obras de Oswaldo de Camargo

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

O CRÍTICO MACHADO DE ASSIS

Caricatura de Machado de Assis,
autor desconhecido

Pouca gente sabe, porisso não custa lembrar: Machado de Assis, nosso grande escritor, foi censor profissional no começo da carreira. E foi, também, crítico literário e teatral nos jornais do seu tempo.
Suas críticas teatrais tiveram espaço de publicação, à princípio, no jornal O Espelho.
Machado de Assis detonava o Romantismo e tecia loas ao Realismo.
Ao ator João Caetano, Machado metia o pau.
À namorada de Castro Alves, Eugênia Câmara, Machado também não poupava críticas. 
Dentre os autores teatrais, nas críticas de Machado havia elogios a José de Alencar.
No dia 5 de novembro de 1857, Alencar liberou ao palco do Ginásio Dramático, RJ, a peça em 4 atos O Demônio Familiar. 
O Demônio do título é um moleque de nome Pedro, que faz o diabo pra desunir os apaixonados Eduardo e Henriqueta.
Pedro, ali com seus 13 ou 14 anos, é escravo de Eduardo.
Há 9 personagens no desenvolver dessa história de José de Alencar. 
Machado de Assis viu em Pedro o personagem Fígaro, que aparece em óperas de autores como Rossini.
Não disse, mas poderia ter dito que o Pedro de Alencar é uma espécie de João Grilo das histórias populares oriundas de Portugal.
E mais não vou dizer, a não ser que desconheço qualquer peça censurada pelo Bruxo do Cosme Velho, como era Machado pelos amigos chamado.

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

HÁ 130 ANOS, MORRIA SILVA JARDIM

Charge com Silva Jardim e o conde D'eu, de 1888
 
O Brasil já foi berço de grandes oradores, como o jornalista e advogado abolicionista Silva Jardim.
Jardim era fluminense, nascido na vila de Nossa Senhora da Lapa de Capivari.
De família pobre, o futuro jornalista e advogado formado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, SP, fez história defendendo africanos escravizados no Rio de Janeiro e em São Paulo, onde conheceu o poeta e também jornalista Luís Gama (1830-1882).
Era integrante do partido Conservador e, como tal, defensor radical da República antes de o sistema político ser República.
Seus discursos juntavam multidões.
Retrato de Silva Jardim
Foi ele que no dia 28 de janeiro de 1888, com 27 anos de idade, reuniu mais de 2.000 pessoas no Teatro Guarany em Santos, SP. Foi um belíssimo discurso que fez. Vários jornais publicaram na íntegra.
Esse discurso, segundo a imprensa da época, anteciparia o golpe militar que provocou o exílio da família real à França e a mudança do sistema político no País.
No discurso em Santos, Silva Jardim disse que temia que o francês conde D'eu, marido da princesa Isabel, substituísse o sogro dom Pedro II. 
 Sobre ele caiu uma chuva de palmas. Foi, como se diz hoje, ovacionado.
Após a proclamação da República, no dia 15 de novembro de 1889, Silva Jardim tentou eleger-se deputado Constituinte. Não conseguiu. Frustrado, pegou o boné e foi tirar uns dias na Itália. Lá quis conhecer o Monte Vesúvio. 
O vulcão do Monte Vesúvio soterrou várias cidades entre as quais Pompeia, no ano 79 a.C. 
No dia 1º de julho de 1891, enquanto apreciava a paisagem do vulcão digamos assim, uma fenda abriu-se a seus pés e o engoliu para sempre.
A vila de Nossa Senhora da Lapa de Capivari traz, desde 1943, o nome de município Silva Jardim.

quarta-feira, 3 de novembro de 2021

AOS 77, VIVA MIGUEL DOS SANTOS!

Assis e Miguel dos Santos
Hoje, 3 de novembro, o artista plástico Miguel Domingos dos Santos completa 77 anos de idade. Viva!
Miguel dos Santos é uma pessoa incrível. Aprendi e aprendo com ele até hoje.
Eu e Miguel estudamos juntos na divisão de extensão artística da Universidade da Paraíba. Fim dos anos 60. 
Nossos professores, meus e de Miguel, eram João Câmara Filho, Raul Córdola e Celene Sintônio. 
Não sei por onde andam João e Celene. Com Raul estive há algum tempo, em Sampa, na casa do amigo Sinval de Itacarambi Leão, jornalista dos bons, brasileiro íntegro e fundador da revista Imprensa.
Miguel dos Santos é pernambucano de Caruaru.
Trabalhei em Caruaru, cuidando do jornal Diário do Agreste. Faz tempo.
É sempre bom falar das pessoas queridas, das pessoas que têm histórias pra contar.
Miguel é dessas pessoas incríveis que têm histórias pra contar, como tinham o maestro Eleazar de Carvalho e o pianista Nelson Freire.
Não sei por quê, mas cada vez mais noto que o jornalismo de hoje enaltece mais os mortos do que os vivos. Pena. Flores em vida, como dizia o cantor e compositor Nelson Cavaquinho (1911-1986).
Pois é, 77 anos não se faz todos os dias. Sobre Miguel dos Santos leia mais:
 

CÉLIA E CELMA

Em plena primavera, as mineirinhas Célia e Celma completaram 80 primaveras. Foi ontem 2. Viva! Muita saúde e música e alegria é o que lhes desejamos. Leia mais:

segunda-feira, 1 de novembro de 2021

NELSON FREIRE NÃO MORREU...

Estou chorando. 
Nelson Freire morreu.
Nelson Freire foi de todos os pianistas, o maior. 
Eu conheci Nelson Freire através de Eleazar de Carvalho (1912-1996).
O que mais posso eu dizer?
O jornalismo brasileiro, a partir da TV Globo, está se destruindo. Pena.
O jornalismo brasileiro está cada vez mais ficando uma berda. Que pena.
Estou chorando, sim. 
Cada vez que morre um grande artista, um pedaço do meu coração vai pra tumba.
Eu morro cada vez que uma nota em ré menor...
Meu Deus! 
O Brasil está morrendo...
O jornalismo que eu fiz, ali vão 50 anos, não é o mesmo que hoje é feito.
Eu penso isso e pensando assim eu fico triste, de novo.
Os grandes brasileiros só são grandes, quando morrem. Poxa!
Ninguém falou do Nelson Freire com tanta grandeza como hoje. Depois de morto. E em vida, por que não foi tão falado o Nelson Freire?
Não posso proibir nada, até porque estou vivo.
Eu sei de mim.
Não falem de mim quando eu morrer...

domingo, 31 de outubro de 2021

O HOMEM NÃO TEM JEITO. O PRECONCEITO MATA.



O tempo nos leva à reflexão. Sempre.

O gênero humano não tem jeito, não terá. Penso...

Faz muito tempo, muito mesmo, que o homem ganhou a forma bípede.

Entre os homens, nós, há pretos e brancos; pobres e ricos.

O problema se acha exatamente aí: pobres e ricos e pretos e brancos.

Esse gênero não toma jeito, com ou sem pandemia.

O preconceito nos matará.

Os brancos continuam tentando se desfazer dos pretos o tempo todo. Em todas as línguas, em todos os cantos.

Na terra do Tio Sam, EUA, a polícia vive doida pra matar negros. No Brasil, também.

Dia desse o amigo e parceiro pernambucano Jorge Ribbas achou de compôr uma pérola musical sem letra. Belíssima.

Emocionado perguntei a jorge como fizera essa obra. E ele, respondeu: "Fiz essa música em homenagem aos negros do mundo inteiro; impactado pela tragédia da morte de George Floyd, que por 11 vezes gemeu a frase: "I Can't breathe". Daí, peguei esse fragmento, falado por Floyd, como motivo e inspiração para desenvolver as melodias que utilizei na música, no sentido de sensibilizar para as situações que, a despeito de estarmos no século XXI, ainda acontecem frequentemente e em inúmeros lugares do nosso planeta".

Pois é, o tempo nos leva à reflexão.

Essa nova música do Jorge Ribbas, I.C.B. (I can't breathe), nos faz pensar sobre as grandes  mazelas do mundo.

Perfeito. Ouçam e opinem.

https://www.youtube.com/watch?v=oU3PUjgm-GU&list=OLAK5uy_lDxeQwFNlnt3W8BQsQKe2CA008S05Sugo&index=7&ab_channel=JorgeRibbas-Topic

Jorge Ribbas, maestro e compositor, é o arranjador de muitos artistas Brasil Afora, entre esses, Socorro Lira.

Os últimos discos de Socorro têm capa assinada pelo craque do traço Elifas Andreato. É de Elifas, também, a capa do novo álbum de Jorge Ribbas, It's Time... Esse álbum trás onze faixas autorais.

A obra de Jorge Ribbas nas principais plataformas de streaming.


sábado, 30 de outubro de 2021

COSTA SENNA, UM BRINCANTE EM CENA

Costa Senna, de batismo Francisco Helio da Costa, é um dos artistas populares mais importantes do Brasil. Nascido em Fortaleza, CE, Senna passou boa parte da infância num lugarejo chamado Choró Limão, localizado no interior de Quixadá, CE.
Foi em Quixadá, terra dos cordelistas Alberto Porfírio da Silva (1926-2009) e Rouxinol do Rinaré, que o menino Francisco tomou gosto pela arte popular e dela tornou-se um aplaudido nome.
“Um dia, chegou lá em casa o meu avô Vicente. Quando ele se preparava pra voltar pro seu lugar, em Quixadá, eu chorei, esperneei, atirando-me as suas pernas. Certamente tocado pela cena, levou-me consigo com a aquiescência da minha mãe”, revela Costa Senna.
Depois de voltar a Fortaleza, ali com seus 13, 14 anos, Costa Senna foi levado por uma namorada à casa de Juvenal Galeno. “Ali conheci muitas pessoas e fiz amizades. Essas amizades abriram caminho para que eu pudesse desenvolver e mostrar meu talento pela arte popular”, conta o artista que começou atuando como ator no palco.
Não demorou e ele trocaria Fortaleza por São Paulo. E aí tudo aconteceu com maior rapidez na vida desse talentoso artífice da cultura brasileira.
Até agora, Costa Senna já gravou 6 CDs e 2 DVDs. Fora isso escreveu e publicou 13 livros e pelo
menos 50 folhetos de cordel. Como ator, atuou nas peças A Noite Seca de Geraldo Markan, Barrela de Plínio Marcos, Deus Lhe Pague de Juracy Camargo, O Caldeirão de Oswald Barroso. E nos filmes: Paulo Freire, Educar Para Transformar; Nísia, Paulo e Josué – Oficina de Memória e As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thoth.
Em novembro de 2001, sobre o artista escrevi para o disco Costa Senna em Cena:

Este é um disco diferente em tudo, por isso bonito.
Diz de gente, povo e puta; de natureza, corrupção, racismo e violência. Diz mais. Diz de fome, de seca e de guerra; de mazelas dos tempos modernos, como a AIDS. Diz até da língua portuguesa, pobre e abandonada, e de político safado, ladrão. Revoltado, o poeta mete a ripa no bicho homem, que mata e destrói sem pena, sem dó. Triste diante do quadro que lhe surge, o poeta não se cala: abre o bico e solta o verbo em defesa da ecologia, do planeta e de tudo que se bole sobre o velho bucho do mundo. Perfeito.
Ouçam-no com atenção. Peguem carona no tempo e sigam o poeta na rima e na métrica. É boa a viagem, e quem gosta do que é bom vai aqui se esbaldar ao som do rap no ritmo autêntico do repente nordestino.
Senna - você ainda não sabe? - é doutor em sensibilidade, que faz e declama poesia com naturalidade e maestria, coisa difícil nestes tempos bicudos.

Filho de Joaquim Raimundo da Costa e Raimunda Sena da Costa, Costa Senna é o mais velho dos 6 irmãos do casal, que também teve 7 filhas. “No total, somos 13 irmãos. E vivos até hoje, graças a Deus!”, firma Senna.
Francisco Helio da Costa, Costa Senna, nasceu no dia 30 de novembro de 1955.
O depoimento que o artista nos concedeu é tocante. Ouça: 

OUÇA TAMBÉM: CANTE ESSE REFRÃO POR AÍFÁBRICA DE UNI VERSOSMOÇO DAS ESTRELAS

Cordéis de Costa Senna

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

OBRA DE BONOMI REVERENCIA VÍTIMAS DA COVID

Assis Angelo com Maria Bonomi e Oswaldo Faustino
 
Com chuva e um público atento e participativo foi inaugurado ontem 27 à tarde, no Memorial da América Latina, SP, a belíssima obra intitulada "Réquiem aos Tombados pela Covid-19 na América Latina" (ao lado).
De autoria da mais expressiva artista plástica brasileira em atividade, Maria Bonomi, a obra mede 4,80 metros de altura e pesa cerca de 9 toneladas. 
Bonomi destacou no ato da inauguração as dificuldades que os brasileiros tem sofrido e o descaso do governo Federal. "O Brasil está no chão", ressaltou.
Líderes religiosos e até o Pajé da nação Guarani Awa Kuaray Wera, expressaram a importância da obra e o motivo que a gerou: o descaso às vítimas da pandemia provocada pelo novo Coronavírus.
Awa Kuaray Wera (abaixo) denunciou as dificuldades que os indígenas sofrem atualmente: "Estamos abandonados e sofrendo muito. Hoje vivemos como os brancos, com muitas dificuldades".
Pedi a artista que descrevesse a obra inaugurada no Memorial. Disse: "São 2 placas 'cós ar cor 350' de espessura de 1 polegada, com pátina de Corten (aceleração  de corrosão que garante película corrosiva protetiva) sendo a maior de 6x2,40m e a menos de 4,80x2,40m formando um triângulo de base de 4,75 m. Com corte a plasma com os 23 países que compõem a América Latina e Caribe. Os países na obra representados são: Antilhas Holandesas, Argentina, Aruba, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa
Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, Haiti, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Suriname, Uruguai e Venezuela".
Ao correr dos curtos discursos, de 3 a 4 minutos, o presidente da República foi nominalmente citado pela irresponsabilidade e a frieza com que tem agido na pandemia da Covid-19.
A respeito dessa questão e da pessoa citada, escrevi e gravei: VIVA A IMPRENSA LIVRE!
As fotos que ilustram este texto foram feitas por Márcia Gonçalves.

AMIGOS

Entre os amigos e amigas que reencontrei ontem 27 no Memorial da América Latina, prestigiando o ato inaugural da escultura da artista plástica Maria Bornomi, estavam Andrea e Oswaldo Faustino. 
Andrea dirigiu o Centro Cultural Santo Amor e Oswaldo, jornalista e escritor, trabalhou comigo na Folha e no Diário Popular. Fica o registro.

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

ÍNDIOS E NEGROS EM TEMPOS DE GUERRA, NO BRASIL

O Brasil nunca foi um país pacato, no rigor do termo, como no primeiro momento entendeu o historiador Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), que chegou a detalhar o seu pensamento no livro Raízes do Brasil (1936).
Muitos livros falam das muitas revoltas populares e guerras envolvendo índios e negros escravizados. Não vou entrar nos detalhes, mas recomendo a leitura do Dicionário das Batalhas Brasileiras (1996), de Hernâni Donato (1922-2012).
Firme nas palavras como geralmente o são os historiadores, mais de uma vez Donato me afirmou que desde o achamento do nosso País pelos estrangeiros "todos os dias houve revoltas, revoluções e guerras por essas plagas".
Muitos índios e negros escravizados tombaram à frente das batalhas. Daí, inclusive o surgimento da expressão "buchas de canhão". Dizia-se e até hoje diz-se que "fulano é bucha de canhão" ou "fulano foi bucha de canhão".
"Bucha de canhão" é o equivalente a "boi de piranha", que é o boi posto pela vaqueirama para atravessar rios e, assim, identificar se há nas águas piranhas assassinas.
A chamada Batalha dos Guararapes (1649) deixou muitos mortos em Jaboatão, PE.
A Guerra dos Palmares (1695) assim chamada foi a última que resultou no assassinato de milhares e milhares de negros. O fim desse quilombo, em Palmares,  AL, coube ao bandeirante Domingos Jorge Velho (1641-1705).
A Paraíba serviu de túmulo a esse bandeirante.
A Conjuração Baiana durou um ano só, 1798, mas deixou um rio de sangue.
Em 1817, religiosos tomaram a frente de um movimento que pretendia a separação das demais províncias brasileiras. Durou 75 dias e, detalhe, chegou a de fato separar-se do Império.
Esse movimento entrou para a história como Revolução Pernambucana, que tinha à frente Frei Caneca (1779-1825) e a proprietária de terras Bárbara de Alencar (1760-1832).
Frei Caneca foi enforcado e Bárbara de Alencar depois de presa, solta.
Solta, Bárbara de Alencar juntou simpatizantes para por de pé a ideia de liberdade do Nordeste do resto do País. Esse ideal teve por nome Confederação do Equador.
A forças imperiais destruíram os ideais contidos na referida Confederação. Bárbara fugiu e um dos seus escravos, preso, foi obrigado a denunciar sua localização. Sob ameaça de morte, o servo cuspiu nos algozes, abriu a boca e decepou a língua com os próprios dentes.
Bárbara vem a ser a avó do escritor cearense José de Alencar (1829-1877).
Foi nas terras de Bárbara que nasceu o rei do baião, Luiz Gonzaga (1912-1989).
Em 1823, portugueses insatisfeitos com a independência proclamada por Pedro I, tombaram sob armas do capitão Luís Alves de Lima e Silva.
Esse Silva viria a ser o patrono do Exército brasileiro, por todos conhecido como Duque de Caxias (1803-1880).
Luís Alves de Lima e Silva também participaria de outras revoltas e guerras: Cisplatina (1825-1828), Balaiada (1838), Farroupilha (1835-1845) e a Guerra do Paraguai (1864-1870).
Esse Silva que viraria senador do Império e consultor do rei, matou gente a dar com o pau e transformou-se o patrono do Exército em 1962.
O nosso brioso Exército tem também como patrona Maria Quitéria (1792-1853).
Quitéria morreu pobre, abandonada e cega.
Depois dessas revoltas e guerras, revoltas e guerras continuaram a acontecer no solo brasileiro: a Cabanada (1832-1835), em Pernambuco; Malês (1835), Sabinada (1837-1838), na Bahia; a Revolta da Chibata (1910), no Rio e Guerra do Contestado (1912), no Paraná.
A Revolta dos Malês teve entre seus líderes uma mulher: Luísa Mahin, que viria a ser a mãe do poeta e abolicionista histórico Luís Gonzaga Pinto da Gama.
Em terras brasileiras o conflito que resultou, historicamente, num maior número de mortes foi a chamada Guerra de Canudos (1896-1897).
Que a paz reine sempre, entre nós. 

segunda-feira, 25 de outubro de 2021

FOI BELA A FESTA PÁ, NA PRAÇA!

Fotos de Jorge Araújo
 
Três meses, 3 semanas e 4 dias antes de completar 38 anos de idade, o jornalista e professor de
Encontro entre Assis,
Ana Maria, Mariana e Vanira
jornalismo Vladimir Herzog foi preso, torturado e morto numa das dependências do famigerado DOI-Codi em São Paulo, SP.
O fato foi consumado no dia 25 de outubro de 1975.
O anuncio da morte de Vlado, como chamavam os amigos, chocou o Brasil.
As autoridades, policiais e militares da época disseram que o jornalista havia se suicidado. Mentira.
Após o sepultamento do corpo de Vlado, religiosos de várias tendências e o jornalista Audálio Dantas (1932-2018) realizaram um
Assis Ângelo e
Elifas Andreato


ato ecumênico na Catedral da Sé, em São Paulo.
Milhares de pessoas compareceram ao evento.
A ditadura militar, iniciada em 1964, começou a cair naquele momento.
O resto é história.
No último sábado 23, jornalistas e artistas reuniram-se na praça Memorial Vladimir Herzog para lembrar os tristes acontecimentos de 1975.
O fotógrafo Jorge Araújo é o autor das belas fotos que ilustram este espaço. Nessas fotos aparecem a viúva de Vlado, Clarisse, o filho Ivo e Sérgio Gomes, o Sérgião, que um dia antes fora submetido a uma delicada cirurgia (no mosaico, acima).
Fotos de Jorge Araújo

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